Eu confio em você

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Ao sentir uma brisa quente tocar o meu rosto, abri os olhos, demoradamente. Com sono, e com as pálpebras pesadas, ergui minha cabeça para contemplar o meu redor.

Era o mesmo parque que eu e Alex tínhamos escolhido para fazer o trabalho. Ele continuava calmo e vazio, assim como o vimos quando chegamos.

- Alex? - chamei-o, ao notar que ainda estava dormindo, encostado na mesa.

Preguiçosamente, levantei-me por cima da bancada de pedra e sacudi seus ombros. Reparei que um suave cheiro de perfume emanava de seu moletom.

- Está ouvindo? Acorde!

Em um pulo, o moreno ergueu-se ligeiramente. Em seguida ficou mirando seus olhos para todos os lados, como se estivesse à procura de algo.

- Onde ela está? O que foi aquilo? - questionou, com ansiedade.
- Eu não sei direito também... - ele não era o único confuso no momento.
- Foi um sonho?
- Talvez sim...ou não... - falei, recordando o que ocorreu.

Posteriormente o silêncio se instaurou no ambiente.

- Desde quando você vê essas coisas? - Alex foi quem deu início ao assunto.
- Que eu me lembro, desde criança.
- Por isso as pessoas te chamam daqueles nomes?

Ao voltar a sentar no banco, acenei com a cabeça.

- Sim. - respondi.
- Você nunca reagiu contra isso?
- Nunca. Eu sempre tive medo de fazer isso.
- Por que? - indagou, enquanto se acomodava no assento da frente.
- Achava que podiam bater em mim ou fazer algo pior. - contei, desviando o olhar. - Jamais fui do tipo que tem confiança em si nessas horas...pra reagir.
- Mesmo que isso significasse ser pisoteada pelos outros?
- É...já virou um costume. Aprendi a ignorar.

Evidentemente alterado com minha resposta, Alex fez uma expressão de raiva (por mais que tentasse não deixar isso claro), ficando de pé posteriormente.

- Bando de...não me importaria de espancar um por um! - a irritação deixava sua voz ainda mais grossa. - Eles não fazem ideia de como é tudo isso!

Imprevistamente, seu corpo começou a ficar rodeado de uma fumaça negra, que aos poucos foi adquirindo o formato de um grande lobo. Após alguns segundos, essa forma tornou-se um lobisomem esfumaçado, com orelhas e patas com garras afiadas.

- Com o maior prazer, mandaria eles para a morte! - declarou, com um tom vocal mais grave, tal como o de um monstro.

Sem hesitar, fui até onde estava e agarrei seu braço.

- Alex, está tudo bem! Não precisa ficar assim... - falei, ficando na ponta dos pés, até minha mão repousar sobre o seu rosto. - Veja, apesar de tudo ainda estamos aqui, firmes e fortes. Você não pode deixar que isso te controle.

Pela primeira vez, eu não senti medo de chegar tão perto de algo que sempre me deu calafrios.

Como em um passe de mágica, meu toque deixou-o mais calmo, fazendo-o voltar à sua forma normal e humana.

- Ah! Me desculpe! - disse, ao tirar minha mão e me afastar um pouco, com as bochechas queimando de vergonha. - Eu invadi seu espaço pessoal, não vou fazer outra vez!

Depois de permanecer imóvel (como se estivesse tentando entender o que aconteceu) por uns segundos, ele apresentou um sorriso de compreensão.

- Fica tranquila, sei que não fez por mal. - proferiu, voltando a sentar no banco. - E eu que tenho que pedir desculpas, acabei ficando alterado...
- Você sempre teve esses...momentos de raiva? - perguntei, com curiosidade.
- Sim, desde as primeiras brigas. Eu era bem novo...acho que tinha uns 5 ou 6 anos.
- O que diziam pra você ficar tão zangado?
- Falavam que eu era um louco, um monstro... - seu semblante contorceu-se de ira, misturada com mágoa. - Um menino que tinha um demônio no corpo.

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