•Laura•
A parte mais difícil de morar em outro estado é passar as datas comemorativas longe da minha mãe. No primeiro ano de faculdade ela veio passar o réveillon comigo, mas depois as coisas apertaram e eu só consegui vê-la por ligação de vídeo. Eu precisei comprar alguns livros complementares que não haviam na biblioteca, livros esses que eram um absurdo de caro comparado com meu auxílio. Guardamos um dinheiro e a minha mãe conseguiu vir aqui no natal do meu terceiro ano de faculdade. Eu tento negar que a saudade dele não me afeta, mas tem dias que são mais difíceis. Minha mãe evita falar dele sempre que eu pergunto, mas um dia desses eu vi uma foto em uma rede social da Elize, onde o Vicente e a Isabela estavam abraçados, com os pais dele ao lado. Talvez ele tenha seguido o que eu disse.
A melhor parte da faculdade é quando você começa a fazer o estágio, a cada dia que eu saia do hospital, eu sentia que meu diploma estava perto e eu poderia ser considerada uma psicóloga. Guardei minha caneta no estojo e entreguei a minha prova para o professor.
- Laura, você pode esperar um minutinho? - ele falou olhando um outro aluno terminando a prova.
- Algum problema professor? - perguntei.
- Não não, é coisa boa. - assenti e sentei na minha cadeira, quando o aluno entregou a prova eu fiquei em pé novamente. - Eu fiquei sabendo que você quer fazer a pós no método ABA, é verdade? - eu assenti rapidamente. O ABA é um dos métodos usados na terapia do autismo. - Não sei se você sabe, mas a minha esposa é a coordenadora de psicologia de uma faculdade particular daqui de Minas e mês que vem terá prova para bolsas de desconto dessa pós. Você é a melhor aluna da sala, acho que você consegue bolsa completa.
Eu fiquei surpreendida, mas não hesitei em fazer a minha inscrição pouco antes de me formar. A cada dia que passava eu via meu sonho se concretizar.
- Eu passei. - sorri e mostrei o celular para os dois a minha frente.
- Eu sabia. - Giovana pulou e me abraçou. Com a cabeça no ombro da Gi pude ver o sorriso do Lucas antes dele nos abraçar. - Teremos a Laura por mais dois anos conosco. - comemorou.
- Quem sabe assim ela não fica aqui de vez. - ele piscou.
- Vocês sabem que eu não posso. - me sentei na cadeira da escrivaninha do meu quarto.
- Por causa do Vicente e bla bla bla. - Gi revirou os olhos e sentou-se na minha cama.
- Não, por causa da minha mãe. - respondi.
- Você sempre fala isso, mas sei que é por causa dele.
- Vou ligar para minha mãe e avisar. - mudei de assunto, disquei o número dela e coloquei no meu ouvido.
- Nós vamos ao mercado comprar as coisas. - puxou o Lucas pelo braço em direção à porta. Marcamos de fazer cachorro quente para o almoço.
- Me espera. - falei, mesmo sabendo que eles me esperariam do lado de fora.
- Oi filha. - escutei minha mãe falar.
- Oi mãe. Tenho notícias. - cantarolei.
- Eai. - falou empolgada. Eu havia dito que o resultado sairia hoje.
- Consegui. - sorri. - Eu passei com bolsa de 100%.
- Você não sabe o orgulho que eu tenho de você.
- E o melhor é que vou conseguir trabalhar no hospital e conciliar com a pós. - Vou conseguir te mandar um dinheiro, não vai ser um pouquinho, mas já ajuda.
- Não precisa se preocupar com isso. Estou conseguindo sobreviver com a aposentadoria, de vez em quando faço alguma coisa na Elize e ela me ajuda.
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Azul é a nossa cor
RomanceCostumo dizer que o autismo me prendeu em um corpo que eu não posso controlar, mas tudo bem, já tenho 18 anos e acho que posso conviver com isso por mais uns 70. Eu gosto do jeito que eu sou, afinal não sei como eu seria se não fosse eu, então prefi...