Capítulo 9

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Os preparativos para a execução de Dartho estão sendo finalizados e a rainha Joana, contrariando seus hábitos comuns, havia acordado bem cedo. Estava empolgada com a morte de Dartho, afinal, ele havia se revelado um forte inimigo. Ela se recorda de que o coração dele é de pedra e por isso não poderia degustar um outro apetitoso almoço. Com certeza, se fosse ao contrário, já teria combinado com o carrasco para tirar o órgão do ex-general ainda pulsando, bem fresquinho.

Ela mesma dá ordem aos guardas para buscar o prisioneiro e manda afiar bem a guilhotina, mas é surpreendida com a notícia que vem a seguir, quando os guardas anunciam a fuga de Dartho. A esta hora ele já estaria bem longe, escondendo-se por entre as montanhas.

Furiosíssima, ela acorda o esposo, que parece ter se esquecido da importante missão. O rei Saul ordena que toda a cavalaria siga atrás do ex-general.

Joana também toma suas providências e manda a centobra seguir junto com eles. Dartho deveria morrer logo que encontrado, pois poderia revelar sobre a morte da menina ao rei e as consequências seriam drásticas.

Ele havia viajado a noite toda. Tentava alcançar a comitiva do Imperador Marco, decidido a contar tudo o que sabia sobre a Rainha Joana. Com isso, a intenção era que o Rei Saul, ao descobrir a verdade, destruísse Joana. Assim poderia se vingar e redimir-se pelos erros que havia cometido contra sua família. Quem sabe, poderia até conseguir o perdão de Madelin ou ao menos, perdoar a si próprio. Seu ser estava consumido pela ira.

Como a comitiva havia parado para dormir, por volta do meio dia do dia seguinte, Dartho conseguiu alcançá-los, porém logo atrás dele estava os soldados do Rei Saul, que utilizaram um atalho e estavam prontos para capturá-lo.

O príncipe Eduardo é o primeiro a ver Dartho se aproximando e avisa ao pai, que se posiciona para defender-se do estranho cavaleiro. Como estavam próximo ao vilarejo, Madelin, que aguardava ansiosamente por notícias, bem como se aproxima. Ela também fazia rondas para encontrar Carmen Lúcia e de longe reconhece o pai de seus filhos dizendo em alta voz:

- O que faz aqui?

Logo estão todos próximos: Rei Saul e sua comitiva preparada para a defesa; os soldados de Tenebra prontos para atacar; Madelin e Dartho frente a frente e, por último, a centobra que havia pegado carona com os soldados e que rastejava aos pés do ex-general.

Dartho, que a muitos anos não via Madelin e antes mesmo de continuar com seu plano de aliar-se ao outro reino, decide conversar, primeiramente, com a antiga esposa visivelmente abatida.

Os guardas que o seguia por ordem da rainha Joana estavam logo atrás do ex-general, mas ficaram confusos, pois a comitiva do outro reino em defesa estava preparada para atacá-los. Uma verdadeira batalha estava se instalando ali. A centobra, adiantada e sem pestanejar, começa a subir em Dartho. O Imperador Marco reconhece Madelin e se aproxima para protegê-la, ficando entre o casal.

- Eu vim em paz – disse Dartho e completa – Eu sei sobre a menina.

- Quem é você meu jovem? – pergunta o Imperador Marco.

Madelin responde:

- É o pai dos meus filhos, Alteza. Há anos não o vejo. Como sabe sobre nossa filha se você nunca a viu? Ela nem sabe que tem um pai, muito menos que você nos abandonou as vésperas do nascimento da menina.

Dartho não consegue controlar a emoção e inconformado, ajoelha-se aos pés de Madelin:

- Por favor me perdoe... me perdoe, Madelin... Eu, eu me arrependo tanto! Perdão!

A centobra está novamente com o ferrão sobre a jugular do ex-general e Madelin se aproxima para levantá-lo daquela posição. O animal que consegue matar duas pessoas ao mesmo tempo, prepara o bote para atacar também Madelin. Instintivamente, por impulso, o valente rei defende a mulher do ataque do terrível animal.

De longe, nesse momento o príncipe grita tentando avisar o pai:

- Papai, cuidado!

Tarde demais, o bote foi certeiro no pescoço do imperador, mesmo não sendo ele o alvo a princípio.

Os soldados da comitiva logo percebem o ocorrido e entendem tudo como uma emboscada, iniciando uma batalha contra os guardas de Tenebra que estavam ali para recapturar Dartho, mas tudo ficou confuso e eles começam a lutar entre si.

O príncipe salta de seu cavalo e corre em direção ao pai, caído, agonizando com os efeitos da poderosa peçonha. Madelin protege Eduardo que, desesperadamente, grita pelo pai. Tarde demais, o veneno da serpente é fatal. Era só questão de tempo para que o bondoso imperador desse seu último suspiro.

Dartho foge em meio ao caos da batalha que ali se instalou. Assim ficava estabelecido que os reinos vizinhos seriam agora rivais, inimigos declarados. O pequeno herdeiro é retirado do local por Madelin, sendo carregado por ela que nem percebe o colo queimando em contato com a nuca do menino em prantos. Eduardo se recuperaria da lesão atrás do pescoço, mas Madelin ficaria para sempre com a cicatriz no braço. Porém, pior que o machucado da pele será aquele que jamais cicatrizará, ficando guardado na memória. A tristeza profunda daquele lamentável dia, com suas irreparáveis perdas, nunca seriam esquecidas. A mãe que perdeu a filha e o menino tornando-se órfão, numa dor profunda como se milhares de estilhaços de vidro estivessem rasgando o interior de cada um e alcançando com os fluidos cada centímetro do corpo e da alma.

Mãe e filho postiços pelo momento, de longe avistam Dartho, vultuosamente, pela última vez, embaçado pelas lágrimas que caíam sem cessar de seus olhos. É possível ouvir os lamuries da batalha ali instalada, com ossos sendo quebrados, corpos perfurados com as lanças e espadas que penetravam os seres. O vermelho úmido se mistura com o marrom da terra seca. Os detalhes da terrível cena ficariam no inconsciente de cada um, agonia demais para serem lembradas, jamais esquecidas como uma imensa dor.

Além do Imperador Marco, vários soldados também morreram no confronto.

Na cerimônia fúnebre, Amélia consola o sobrinho e lhe entrega o cordão do pai com a Cadente da Luz, que a partir daquele triste acontecimento o pertenceria. O mausoléu onde jaz o rei fica próximo ao castelo e tornar-se-ia um lugar bastante visitado pelo príncipe. Após alguns anos, com a maioridade, ele será coroado rei, mas por enquanto Amélia seria a tutora dele. Ciente da responsabilidade de governar, Eduardo, ainda menino já prioriza seu primeiro objetivo de vida: vingar a morte do amado pai.

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