Sobre besouro rola bosta e bolinho de saliva

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Seulgi

Não sei dizer a primeira vez que peguei em uma câmera, ou se foi nesse momento que eu decidi que esse seria o trabalho da minha vida. Com sete anos uma criança não se importa muito com formações ou o que precisa fazer para se sustentar. Mas naquela idade eu me lembro de olhar as paisagens e ter o sentimento de querer guarda-las, e bom, uma fotografia foi o único meio para fazer isso. Então com meus oito anos eu era um pequeno serzinho de óculos coloridos e uma câmera grande demais para meu corpinho, que apesar de gorducho, ainda era pequeno para o equipamento. Mamãe achava engraçado aquela criança estranha que soltava clique por todos os lados da casa.

Como disse eu gostava de guardar momentos importantes, e o que poderia ser mais importante para uma criança descobrindo o mundo do que o besouro rola bosta em seu quintal? Céus, gastei todo um rolo de filme com aquela estranha criaturinha, não tão estranha quanto a criança que se deitou no chão terroso e observou por dias aquele animalzinho fazer todo seu trajeto, foi bom acompanha-lo por um tempo, até o dia que ele desapareceu do meu vasto, hoje pequeno, quintal.

Olhando agora essa variedade de fotos de um mesmo animal espalhadas por minha cama, algumas eram tremidas e outras estranhamente bem fotografadas, eu penso que não haveria outros objetos que me descrevessem melhor do que aqueles velhos óculos de hastes vermelhas e a câmera cinza herdada de mamãe.

Em várias fotos eu posava com grandes sorrisos, os mesmos sorrisos que eu escondia das outras pessoas por ser muito tímida. Eu agradecia mamãe por ter tido tanto bom gosto quanto as minhas roupas, eu era uma pequena hipster com all star, chapeis e macacões e os óculos sempre postos, nas poucas fotos que eles não estavam, parecia que não era eu. Mas acho que não era mesmo, eu sem eles não sou eu. Por culpa deles ganhei alguns apelidos na infância, mas convenhamos, eu preferia ter alguns apelidos do que deixar meus preciosos óculos de lado. Acontece que sou aquariana, e isso me faz gostar de ser um pouco diferente dos demais. Talvez mais que “um pouco”. Eu apenas me sentia feliz quando mamãe dizia que aqueles óculos faziam de mim alguém especial e única.

A graça de mamãe quanto as fotografias, passou a ser uma moderada preocupação quando todos meus presentes eram câmeras e filmes, e então todos meus passa tempos eram voltados de uma forma ou de outra para isso. Após um tempo eu mal podia fotografá-la, porque ela não queria incentivar esse meu lado quase obsessivo. Isso explica por que tem tantas fotos escondidas dela, e como fui me tornando boa nelas. É como o velho ditado “a ocasião faz o ladrão”.

Me lembro de papai esbravejando pela casa ao descobrir sobre meus sonhos de ser uma fotógrafa profissional, foram momentos de perturbação. Não que eu ficasse totalmente uma fera com ele, sei que o velho homem nunca teve muito jeito ou sensibilidade para compreender meu universo. Eu não o culpo, não totalmente, ele se preocupava e apenas queria uma estabilidade para nós e não nos queria morrendo de trabalhar assim como ele fazia todos os dias. E nesse aspecto minha irmã mais nova Sooyoung pode corresponder melhor as expectativas, já que ela é extremamente talentosa com os cálculos e planeja seguir a carreira dos mistérios da engenharia.

Mas para o azar deles, eu não era assim, eu sempre fui um pouquinho diferente, preferia minha câmera do que um grupo de amizades, eu me dava bem sozinha podendo observar o que poderia guardar para mim. Crianças quase sempre eram barulhentas e não conseguiam apenas observar. Eu disse que era uma criança estranha. A medida que fui crescendo essa estranheza cresceu comigo, eu ainda preferia as fotografias e também meu fone, onde eu poderia me desligar do mundo e sua agitação, e me concentrar em mim e no que era importante para mim. Claro que aos poucos fui sendo mais maleável e receptiva, mas meu quarto ainda estampava fotografias diversificadas de fora a fora e eu ainda ouvia algumas bandas que eu poderia jurar que só eu em toda Coreia ouvia aquilo.

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