Treze

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Mantive minhas expectativas baixas. Apesar do sorriso radiante de Edwin, e do olhar fervente de Eliah, me obriguei a agir como se meu coração não palpitasse mais forte todas as vezes em que eu me aproximava deles. Tentei agir como se eu fosse uma princesa preocupada com o próprio reino, com o noivo que havia deixado para trás e com os irmãos ao lado de um pai misericordioso. Ainda na primeira reunião que tive com os oficiais do exercito de Edwin, ele me perguntou por que eu servia meu pai. Não precisei pensar duas vezes para responder que era por Kibtaysh. Isso rendeu algumas risadas do príncipe e dos soldados quando ele respondeu algo que tirou meu chão "então entenda desde cedo Kalishta, você não serve ao rei, serve ao reino". Fazia sentido, tudo o que Edwin dizia fazia sentido, e parte de mim o odiava por isso. Outra parte de mim queria agarra-lo e agradece-lo por ter me sequestrado. Agora eu dormia em uma cama dura e comia coisas cruas dia após dia, mas podia correr descalça por entre as arvores ao nosso redor, me jogar em um rio para lavar minhas próprias roupas, e andar o quanto eu quisesse sem quinze criadas se oferecendo para ajeitar meu cabelo. Eu me sentia a selvagem que Vladmir sempre me acusou de ser, mas estava feliz com isso. Tirando a parte que Alexander não podia mais reclamar dos meus erros gramaticais, Zander não me rondava para me proteger de algum ataque e Vlad não podia me mostrar seus tecidos exóticos novos. Eu não podia mais treinar com Arlo , nem contar meus sentimentos pelo príncipe para Owen. Mas o que mais doía era não conseguir mais olhar nos olhos de Kai, ver os meus olhos refletidos ali. Ravi, Barduc e Isla estavam em minha saudade também, mas não era a mesma dor.

-- Ganhou um noivo?

Eliah me esperava sentado em um galho alto da arvore que costumávamos encontrar. Era meu primeiro dia usando o anel dado por Edwin, apesar de fazer quase duas semanas que o príncipe havia me dado.

-- Ele disse que ainda não.

-- Principes parecem gostar de voce.

Ri com a insinuação de um ciúmes no rosto de Eliah. Ele sabia o quanto eu havia mudado, o quanto passei de uma sequestra desprotegida para uma compactuante da causa. agora eu acreditava nos planos de Edwin, agora eu via as florestas mortas que meu pai deixou que se instalassem em nossas terras. E agora eu servia a meu reino, não ao meu rei. E Eliah sabia que se um casamento com o rei de Rithan fosse necessário, eu concordaria.

-- É uma pena eu preferir os soldados...

Eliah riu como se fosse realmente uma piada. O acompanhei porque não estava pronta para admitir o que sentia, muito menos com possíveis mudanças por vir. No dia seguinte eu sairia pela primeira vez depois de muito tempo, para fora da clareira. Edwin, Asher e Eliah iriam comigo, todos para o reino de Elliwe, um aliado de Rithan. Se conseguíssemos fazer com que a viagem desse certo, seguiríamos para Orn, em busca de mais ajuda. Quando enfim tudo estivesse certo, eu subiria ao trono de Kibtaysh e Edwin assumiria o controle de Rihan, obrigando Bulhart a recuar. Com a paz instalada, nada mais poderia fazer a natureza recuar com a vida, como estava fazendo a um tempo. As pequenas guerras entre Bulhart e Orn causaram danos muito maiores do que podíamos imaginar. Vivíamos em terras sagradas, terras que nos concediam dons e poderes, e com o dano que sofriam aos poucos, tudo podia acabar. Terras inférteis, e incapazes de gerar vida já cresciam ao norte. Isso fez com que os saqueadores começassem a agir, fez as pessoas se desesperarem ao ver seus familiares morrendo de fome. Mas os reinos não se uniam, não completamente, porque na cabeça de cada um deles, a ganância reinava mais do que o amor pelo povo.

-- O que está lendo hoje?

Perguntei enquanto Eliah me ajudava a subir ao seu lado. Ele nunca me permitia ver o que lia, Sempre escondendo os títulos das capas como se fossem super secretas e perigosas. Quando me inclinei sob seu corpo, ele facilmente levantou seu braço longo que segurava o livro, afastando-o de minha vista. Desisti dos movimentos quando um desequilíbrio quase me lançou arvore a baixo. Foi o aperto da mão de Eliah em meu braço que impediu o acidente.

-- Obrigada

Eliah fitava os próprios pés, aparentemente esquecendo do livro. Naquele dia em especifico, seu cabelo estava mais bagunçado do que o normal, o que o tornava ainda mais bonito. Tao bonito quanto um homem que esconde metade do rosto pode ser. O tecido de sua mascara marcava as linhas de sua mandíbula quadrada, a parte de seu nariz ficava um pouco folgada. Contive o ímpeto de abaixar o tecido enquanto ele estava distraído, mesmo que a curiosidade me corroesse. Eliah me olhou de volta, com certa diversão ao perceber que eu o encarava a um tempo.

-- A mascara dificulta os beijos que quero roubar.

Pensei alto demais. Elias soltou uma gargalhada enquanto u cobria as duas mãos com a boca. Como eu havia dito aquilo? Repreendi a mim mesma, e aquele papo de ir devagar? Tentei respirar fundo, mas era tarde, vermelho havia invadido meu rosto. Cobri-o com as duas mãos tentando disfarçar a vergonha que ele estampava, mas logo que as gargalhadas de Eliah pararam, senti suas mãos se fecharem nos meus punhos. Ele tirou minhas mãos gentilmente, e passou o polegar pelo meu lábio inferior. Me arrepiei pelo toque.

-- Feche os olhos.

Ele mandou com a voz calma e terna. Eu obedeci. Fechei meus olhos com forca, tentando conter a ansiedade que percorria minhas veias. Então uma de suas mãos agarrou minha nuca enquanto a outra ainda segurava meu pulso. Deixei minha mão livre pousar sob seu peito quando senti seu corpo se aproximar. Então de alguma forma, eu sabia que ele estava abaixando a mascara, e apesar da curiosidade ampliada consegui manter os olhos fechados. na escuridão me permiti imaginá-lo. Ate sentir seus lábios nos meus. Ate ali, pois depois daquilo eu não consegui pensar em mais nada alem da sensação que ele me trazia, do calor que se apossou de mim. Barduc sem duvidas não era assim... Bardo era calmaria, Eliah era fogo. Fogo que queimava de dentro para fora, consumia-me inteira. Eu podia passar dias beijando aqueles lábios, eu queria isso. Mas acabou quando ele se afastou, e consegui abrir os olhos depois que ele recolocou a mascara.

-- Suas mãos.

Ainda tonta por todas as sensações que aquele beijo me fez sentir, abaixei os olhos para as palmas de minhas mãos. Depois para o uniforme de Eliah queimado na altura do peitoral... meus poderes haviam voltado.

Filha de KibtayshOnde histórias criam vida. Descubra agora