Piscina de Bolinhas

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Kylie acordou com fome. Então preparei a mamadeira que ela acabou de tomar. A coloco no tapete felpudo do quarto e espalho os brinquedos coloridos em volta dela, que escolhe um para começar. Mantenho também uma caneca com café ao meu lado, dando algumas bebericadas vez ou outra, tinha me esquecido que alface dá sono enquanto estava devorando aquela tigela cheia e acompanha com mel e chocolate. Agora preciso do café pra não acabar dormindo em cima desse pacotinho de fofura.

Todavia, mais que o próprio café, me desperta esse homem que acaba de entrar no quarto.

- Parece que você precisa aprender boas maneiras - escuto o senhor Azikiwe alfinetar.

- Adoraria - digo enquanto me levanto -. Depois do senhor.

Paro na sua frente e cruzo os braços, encarando ele de cabeça erguida não porque eu queria, mas pela diferença de altura. Ele libera uma risada nasal e um meio sorriso enquanto me encara de perto, posso ver suas íris dos olhos passeando sobre a minha face, analisando cada traço do meu rosto.

- Por que confiou em mim ao ponto de compartilhar seu segredo apenas comigo, um estranho?

- Não confiei. Só pensei que não se importaria ao ponto de fazer algo a respeito.

Derick faz um sinal de concordância com a cabeça, o que eu disse fez sentido pra ele também.

- Não dê as costas daquele jeito para mim de novo, posso não te demitir, mas faço você implorar para Dorotéia te mandar embora - ameaça, tudo com uma voz tão aveludada que se ele tivesse gritato comigo me causaria menos medo.

- Então vamos fazer o seguinte, senhor Azikiwe - me mantenho firme -. O senhor nunca mais se envolva nos meus assuntos. Assim não precisarei ter que lidar com seus demônios e nem o senhor com os meus.

Ele sabe que foi o próprio a se meter na minha vida, eu só ainda não sei porquê, pois nunca me meti nos assuntos dele. Talvez Derick seja um obcecado por controle e viu alguma possibilidade de me domar também.

Ele uni os lábios em uma raiva contida. Nada fala. Apenas vira as costas e começa a se retirar enquanto fala:

- Cafeína não é recomendo para as grávidas.

- Ter um chefe cretino também não é.

Dessa vez não contenho o sorrisinho de vitória, o fato de ele ser parcialmente impotente sobre mim, graças a Dorothy, o está tirando do sério, e o fato de eu saber disso está me enchendo de audácia.

• •


O senhor Kenner retorna da viagem hoje, mas não sei em qual momento. Após dar o banho da tarde na Kylie a colocar para dormir, fui ligar um pouco para Jodi do quarto dos funcionários, mas ao retornar ao quarto da pequena, o que vejo por pouco não me faz cair para trás, vendo uma das cenas mais estranhas da minha vida.

Kylie está deitada de barriga pra baixo, o senhor Kenner está com a cara enfiada sobre a frauda dela e falando:

- Quem é a peidorreira do papai? Quem é? - ele fala com a uma voz engraçada. E pelo sons baixos vindo da pequena, ela realmente está fazendo as necessidades enquanto o senhor Attah brinca de cheirar.

Fico um pouco desconcertada com a situação, então para chamar a atenção dele discretamente, eu pigarreio e digo:

- Boa tarde, senhor Kenner.

Em um pulo de susto, ele rapidamente se põe de pé. Assume sua postura de durão e se recompõe, ajeitando o paletó no corpo.

- Eu... Eu só tava... Você sabe! - tenta se explicar - Checando a frauda dela pra ver se tava limpa - ele tosse -. Não está não - diz envergonhado -. Você troca? - aceno positivo com a cabeça enquanto sorrio complacente, por fim ele deixa o quarto rapidamente.

- Meu amor, seu pai é doido - falo para ela que está me olhando e solta uma gargalhada de bebê.

• •


Recebo uma mensagem do senhor Kenner dizendo que precisa sair, mas que em uma hora retornará e me perguntou se eu preciso de algo. Respondo o lembrando de pegar a piscina de bolinhas da Kylie que foi encomendada no shopping, um empregado iria buscar amanhã, mas ele se ofereceu.

• •

Derick

- Tudo pronto? - pergunto entrando na Senzala.

- Sim. Kenner já chegou também, está descendo - Dominique responde desamarrando o homem, depois fala com ele -. Sua briga não é com a gente, fica de boa.

O prisioneiro me encara desconfiado, eu levanto ligeiramente minha camisa, mostrando a arma como incentivo para não atacar a gente.

- Onde estou? - pergunta ao Dom.

- Infelizmente, meu mano, você apalpou a bunda de Dorotéia Azikiwe no tapete vermelho da exposição de moda em Nova Ioque. Agora o marido dela quer ter uma conversinha com você agora.

Assim que Dom termina sua fala, a porta se abre. Ele observa o rapaz se colocar de pé e erguer as mãos em sinal de paz.

- Olha, desculpa, eu não queria...

- Cala a boca!

Kenner dobra ligeiramente as mangas da camisa social azul escuro, começa a caminhar na direção do homem, inclina um pouco a cabeça para o lado estalando o pescoço.

Ele acerta um soco no meio da cara em cheio. E não para por aí. Kenner o segura pelo colarinho da camisa e acerta o mesmo punho repetidas vezes no rosto do rapaz que desmaiou no terceiro murro. Eu nem conseguia mensurar a pressão desses socos. Nunca vi alguém bater com tanta força. O sangue saia em gotículas do ar e chego a pensar que o rapaz morreu.

- Já deu, irmão! - Dominique intervém e segura seu braço, quase que não consegue bloquear.

- Viu o que ele fez?

- Ele nunca mais vai ver de novo. Você estourou os globos oculares dele.

- Pegou pesado demais, Kenner - me intrometo, olhando a situação do rapaz.

- Só espero que você conheça a si mesmo o suficiente para saber o tamanho da hipocrisia das suas palavras, Derick - ele rebate em voz baixa enquanto limpa o punho com um lenço que tirou do bolso. A diferença entre Kenner e eu é que ele gostava realizar a sua justiça pessoal com classe. Eu já faço questão de mostrar a sujeira.

- Se me dão licença, tenho que ir buscar a picina de bolinhas da minha filha - enfia as mãos no bolso e caminha até a saída.

Kenner nunca se interessou nos negócios obscuros da família, apesar de já ter se envolvido algumas vezes, tanto que houve um tempo em que foi meu tesoureiro e este foi o tempo que mais enriqueci ilegalmente. O homem é uma máquina de fazer dinheiro, consegue tirar valores até das pedras.

- E como vamos concluir isso? - Dominique olha para mim.

- Consegue acetato de medroxiprogesterona?

Ele ri sarcástico, essa é sua resposta. Não tem nada que Dominique não consiga.

- Você vai fazer uma castração química nele só por que deu um tapinha da sua irmã?

- Não... Você vai fazer uma castração química. Ele nem vale meu tempo.

- Demorô! - tira o celular da jaqueta e sai para fazer uma ligação.

• •

Júlia

- Tá brincando? O senhor Kenner é um ursão! - falo com Dorothy pelo telefone - Não faria mal a ninguém.

- Você nunca precisou ver o lado ruim do Kenner, Júlia - Dorotéia discorda -. Como ele já chegou, tira a noite de folga. Vou mandar mensagem para ele e assim que ele retornar pra casa você pode ir.

- Obrigada - já sei até o que vou fazer essa noite.

Chefe Cretino Onde histórias criam vida. Descubra agora