Capítulo 04

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Todas as manhãs Anahi tinha obrigações regulares: reuniões, visitas, negociações, assinaturas. Entre tantos papéis e pessoas desconhecidas, agora havia encontrado mais uma: se trancafiar no quarto com Dulce para consolá-la. Por vezes, para aconselhá-la também. Dulce confiava na forma que a amiga levava a vida e por isso, ao final de cada tarde, se sentia novamente encorajada e esperançosa de que conseguiria lidar com a situação da melhor maneira. Contou para a família e, depois da experiência de quase morte de seus pais, a convivência voltou a ser como antes.

No meio de tantas demandas, a oficialização do divórcio foi sendo adiada. Anahi sempre tinha alguém com quem se reunir, uma proposta ou um investimento a analisar, novas vinhas para plantar, novas sementes para receber. Passava horas conversando com Arthur, absorvendo conhecimento. Isso era bem mais urgente. Então novamente dentro de uma gaveta, toda aquela papelada que Ian organizara fora sendo esquecida.

Completaram-se 3 meses e ela ainda se sentia ansiosa e nauseada ao ter que assinar diversos documentos usando o sobrenome Herrera. Torcia a boca cada vez que o fazia mas, tendo tanto no que pensar, a medida que isso se tornava mais corriqueiro foi também se tornando menos relevante. Além disso, seu pai era um Herrera e isso podia ser ressignificado. As pessoas também costumavam respeitar seu desejo de ser chamada pelo nome, mostrando que lhe davam o devido crédito e sobretudo o prestígio por tudo que vinha acontecendo com a vinícola. Aos poucos, embora ainda existisse, o incômodo foi se dissipando.

As pessoas ainda especulavam sobre o paradeiro de Alfonso, mas Anahi não demonstrava interesse na conversa. Encaravam-lhe como uma mulher saudosa e magoada, e isso sustentava bem o fato de ela nunca falar sobre ele. Sinceramente: era bem fácil dissimular o papel de esposa abandonada que perder tempo dando explicações a desconhecidos.

Não devia deixar que nada atrapalhasse sua obstinação em ter a vinícola mais produtiva e em ser a mulher mais poderosa de Londres, em todos os sentidos que essa palavra pudesse ter. Ela queria ser tão rica quanto generosa, tão forte quanto flexível, tão obstinada quanto resiliente, tão amorosa quanto razoável, tão admirável quanto sua mãe e tão imponente quanto seu pai. Isso e estar cercada por todas as pessoas que amava era seu maior objetivo. Uma dessas pessoas, Ian, estava agora a seu lado em uma caminhada pela plantação. Anahi adquiriu o costume de reservar pelo menos uma hora do dia para observar o trabalho dos funcionários e, naquela tarde, Somerhalder estava disponível para lhe fazer companhia. Já fazia alguns dias que não passavam mais que dois minutos juntos, sempre em torno de alguma burocracia a resolver. Finalmente ter um momento ameno para respirar ar puro e engatar uma boa conversa informal era muito agradável.

- Está quente hoje, sim? - ela suspirou, abanando o rosto. Mesmo com o chapéu que usava e projetava uma colossal sombra no chão o calor corava e aquecia seu rosto. Estavam voltando para casa vagarosamente, lado a lado. Não podiam tardar muito pois ambos tinham compromissos a cumprir.

- Pela cor das suas bochechas, bastante.

Anahi riu, tocando a face com as duas mãos graciosamente.

- Além da minha aparência, fico preocupada com a temperatura pela manutenção das vinhas.

- Você tem empregados muito dedicados, Annie - Ian pontuou, oferecendo-lhe o braço que ela aceitou com um sorriso - Tem tido bons resultados. Melhores que o esperado, diga-se de passagem. Em poucos meses virão uvas saudáveis e tão logo vinhos deliciosos.

- Estive pensando - ela salientou, batendo um dedo contra os lábios - Acha que poderei beber pelo menos uma garrafa de vinho tinto, a partir do ano que vem, em todos os jantares de toda minha vida?

Surpreso pelo teor ousado da pergunta, Ian desatou a rir.

- Sem que venha a morrer pelo excesso dentro de poucos meses? Honestamente? - ele indagou, erguendo as sobrancelhas. Anahi lhe dirigiu um olhar desconfiado e Ian finalizou: - É completamente possível.

Depois do InvernoOnde histórias criam vida. Descubra agora