Sobrevivente

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Buscou na mesa de cabeceira o controle das cortinas antes que a forte luz que entrava pela janela derretesse seus olhos sensíveis.

Aproveitou para aumentar a potência do ar-condicionado e voltar a dormir. Já era quase meio-dia de um domingo quando se sentiu pronto para levantar, assustado com o horário por falta de costume em acordar tão tarde. Até pensou em correr para o banheiro, mas sua cabeça explodia e seus reflexos lentos lhe permitiram apenas olhar para o móvel ao lado e perceber pílulas para enxaqueca junto de colírio para suas pupilas dilatadas. Na dúvida entre a gratidão pelo cuidado dos funcionários ou achar esquisito o livre acesso deles a sua privacidade, usufruiu do primeiro reclamando do segundo.

Se espreguiçou devagar até ter firmeza nas pernas. Torceu para que a diversidade de cores presentes em sua urina fosse mais uma alucinação tardia e que todas as recordações da noite de loucuras passassem logo, não tendo coragem de ligar o celular. Em seu estado psicológico, melhor evitar fotos e relatos debochados sobre suas atitudes. Durante o banho, o péssimo arrepio pela presença de uma minúscula marca da unha de Saara em seu peito, esfregando mais forte para diminuir o nojo. Mesmo que fosse quase imperceptível ao olhar dos outros, bastava que ele soubesse de sua existência para decidir esconder e dali para frente, não importa o calor que fizesse, colocaria camisa até no mínimo o machucado desaparecer. Fez um baita esforço pra lembrar que não foi por estar seminu que isso aconteceu. 

Com a enxaqueca, até os pingos de água faziam peso mas se arriscou a usar shampoo pra tirar a catinga de cachaça e o assunto da cabeça, pois foi traumático o bastante pra ficar remoendo e ele só queria comer e depois se fechar ou no máximo brincar com sua irmã com algo pouco barulhento. Fechou o registro pós enxague. Cabelos molhados por falta de coragem em esfregá-los na toalha. Qualquer roupa servia contanto que pudesse ir vestido à mesa de almoço, tendo um obstáculo inusitado. 

Uma rosa esquisita surgiu do nada virada na horizontal na altura de seu peito. Olhou para ela e pela mão fofa com unhas decoradas com glitter que a segurava, descobriu ser mais uma peripécia de Nabinha, erguendo suas sobrancelhas contrariado. 

— O que caralho é isso? 

Hanabi ensaiou um sorriso simpático sem perder a postura irônica de sempre, amassando as pétalas da flor contra seu peito pra brincar. 

— Uma flor! - isso era tão óbvio quanto ele não estar se referindo a ela e sim a seu significado. 

Tirou os olhos da planta e os direcionou para a cara lisa de quem não tinha nem vergonha de bater em sua porta como se esse presente singelo apagasse a merda que fez. 

— Você tá tentando comprar as minhas desculpas com uma flor? - cortou suas gracinhas fazendo um paralelo como encontro dos dois na floricultura boas semanas antes, mas ela negou e manteve a postura diplomática. 

— Eu tô tentando te dar uma flor! - insisti.

Ela só esqueceu de dizer que a flor era tão falsa quanto suas desculpas, ele pensou.

— Uma flor de plástico? Você tá tentando comprar as minhas desculpas com uma flor de plástico?

— Nunca viu aquilo sobre "te amo até a última pétala cair" sobre rosas falsas?

— O que eu tô vendo é que você é uma manipuladora barata e bem hipócrita, isso sim. - só percebeu que seu pensamento saiu sem querer por seus lábios quando as sobrancelhas dela demostraram espanto.

Não se arrependeu, entretanto. 

Essa nova vibe de "ninguém me enrola mais" pegou Hanabi de surpresa mesmo que ela fosse sincera em seu requerimento e ela abaixou seus óculos amarelados para vê-lo em cores normais. Adorou a novidade! 

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⏰ Última atualização: Nov 16, 2021 ⏰

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