11. O gramado

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Pedro parou em frente ao gramado, lembrando-se dos momentos que teve com o seu primeiro. Lembrava-se daquele gramado cheio de rapazes fazendo alongamentos, jogando conversa fora, disputando quem tinha o membro maior... Agora já não era mais o mesmo. Estava fechado há alguns anos. A grama estava alta demais. A arquibancada estava podre e caindo, inclusive, estava quebrada em vários pedaços.

O dono dissera-lhe que limparia tudo e colocaria tábuas novas na arquibancada. Ao que parece, a verba destinada à reforma foi utilizada para outras finalidades que, segundo o dono, eram mais urgentes.

A primeira — e talvez única — coisa que trocou ali foram as lâmpadas, pois precisaria delas para caso realizasse um trabalho noturno de limpeza, o que acabou não acontecendo. As lâmpadas novas já estavam velhas agora. A máquina de cortar grama estava com defeito e, de tanto o conserto dela ser adiado, continuou quebrada. O cheiro de mofo, terra e cupim era sentido quando o vento batia na madeira da arquibancada apodrecida.

Poderia ter tido um fim melhor. O campo dava um lucrinho a seu dono, mas ninguém entendia direito a razão de continuar fechado. Talvez o dono tivesse outra fonte de renda que fosse superior ao que conseguia alugando o campinho.

A casa em que o primeiro morava estava perto, mas outras pessoas moravam nela. Foi lá que teve que cuidar dele quando aconteceu o acidente. Não precisava, mas sentia que era necessário. Não sentiu pena, mas apenas uma obrigação, que terminou com algumas palavras ditas pelo felídeo de dentes grandes.

— O que lhe traz aqui? — questionou Lucas Lontra. A lontra de pelo castanho, tal como os olhos, passeava por ali e avistou a caminhonete de Pedro. Parou ao lado do veículo e abordou a hiena.

— Advinha?!

— Dinheiro? — uma das poucas razões para que Pedro se locomovesse com a caminhonete.

— Como quase sempre.

— Quem é que lhe deve agora? — quis saber Lucas, curioso. — O George?

— Paulo — informou Pedro. — Falou para que eu esperasse no boteco que ele já ia aparecer.

A hiena listrada saiu da caminhonete e foram os dois animais para o boteco de esquina. Enquanto um sentava à mesa de plástico — com as cadeiras também de plástico — o outro se encaminhava ao balcão, onde pediu uma garrafa de cerveja e um copo, e voltou, sentado à mesa junto a seu amigo.

— Você está dirigindo, não pode — falou a lontra, que havia ido até o balcão buscar sua cerveja. — Então, quanto ele lhe deve? — quis saber, curioso. Removeu a tampa de alumínio com a mão, fazendo o característico som de quando uma garrafa de vidro é aberta. Colocou um pouco do líquido amarelo e gelado no copo. Bebeu um gole.

— Uns cem contos — revelou a hiena.

— Virou agiota? — brincou a lontra. — Sempre vejo você indo buscar dinheiro. — Deu uma risada antes de beber o próximo gole e encher o copo de volta. — Está trabalhando na fábrica ainda?

— Faz seis anos!

— Você fez faculdade e ainda está trabalhando na fábrica? — estranhou a lontra.

— O salário teve que aumentar por causa do diploma — explicou a hiena. — Eu não tenho dinheiro pra abrir um consultório — adicionou.

— É, meu amigo — acenou Lucas. — Para tudo precisamos de dinheiro. E o seu namorado? Como está?

— Ele está bem — falou. — Estamos morando junto faz uns quatro anos.

Lucas não era homossexual, mas mesmo assim era amigo de Pedro. Conheceu-o no campo onde jogavam futebol. Havia mais amigos como Lucas, que gostavam de fêmeas e que tinham respeito por ele ser homossexual.

O que fazer com essa tal LiberdadeOnde histórias criam vida. Descubra agora