1. Um lobinho perdido

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Caio andava pela rodovia, entristecido por ter saído de casa. Poderia estar chovendo, mas a chuva teria dado um motivo para ficar em casa. O calor da tarde o incomodava. Poderia estar chovendo agora, pensou.

Ele era um lobo pequeno, apesar de maior de idade, com seus dezenove anos, deveria ter crescido mais — bem mais. Mas não havia comido o suficiente, era o que seus parentes falavam. Ele nunca tinha tamanho para nada e ele se sentia ridículo por isso. Porque tinha que ter nascido na parte mais ignorante da família? Era apenas uma pequena fatia da sua família que tinha a cabeça fechada, que pensava e agia de forma mais ignorante, em que a força bruta e o sofrimento são os únicos valores verdadeiros, todo o resto é frescura e falta de ter o que fazer.

Andou pela rodovia sem saber onde iria parar. Contudo, em algum momento, ele sabia, teria que parar de andar e voltar para trás. Não trouxe consigo nem mesmo uma garrafa d'água. Deixou o celular em casa para não ser incomodado enquanto andava pela rodovia.

Seu tio, que sempre estava puto da vida, poderia sair com o carro para ir busca-lo. Mas Caio sabia muito bem, tanto quanto os outros familiares, que ele não faria isso. Ele o esperaria voltar para casa para poder falar asneira ou, quem sabe, fazer o que tanto queria: bater nele. Seu tio parecia sempre querer arrumar alguma desculpa para querer bater nele de alguma forma, mas nunca tinha motivo suficiente. Agredir com palavras, por outro lado, era o que sempre fazia. Ele não fazia uso de palavrões, contudo, articulava as palavras de forma a dizer o que queria a fim de rebaixa-lo.

Ele se sentia sempre pra baixo. Sua mãe concordava com o seu tio em vários momentos. Apesar de amar o filho, também não deixaria de amar o irmão. Ela o apoiava no que queria fazer, mas apenas em parte, diferente do seu tio que não o apoiava em nada.

— Por que ele vem aqui? — questionou uma vez.

— Qual o problema? — questionava sua mãe.

— Ele não gosta de mim.

— E daí? É só ignorar o que ele fala.

— Quem me dera fosse fácil.

— É só deixar de ser cabeça fraca. Ele é seu tio e meu irmão. E eu não vou deixar de recebê-lo. Nós somos família e só temos uns aos outros.

Mas ele me odeia, queria dizer, mas deixou só no pensamento mesmo. Sua mãe não entenderia.

Queria ir embora, mas iria para onde? Se houvesse alguém com quem eu pudesse morar e me ajudar... Isso era um sonho de princesa. Ele não era uma princesa. Não tinha dinheiro para nada. O pouco que tinha só o tinha porque guardou e escondeu de sua mãe e tio.

— Por que ele tem tanto ódio de mim?

— Ele não te odeia — falou sua mãe. — É você que é fresco. Não pode falar nada que já fica triste. Quer chorar? Vira macho e vai fazer alguma coisa da vida.

Ele havia conseguido um emprego, o que fez as ofensas ficarem mais suaves. Talvez porque não havia tempo para ficar ouvindo as asneiras que ele dizia.

Seu tio também tinha um trabalho. Ele trabalhava com descarregando mercadorias pesadas e usava de sua força bruta para fazer isso. Isso gerava um estresse grande e fazia com que, quando seu tio lhe visitava, Caio ficasse acuado num canto para que não precisasse ser visto.

Não queria ficar em casa e talvez sua mãe nem ligasse, afinal, em algum momento ele teria que voltar para casa. Começou a fazer isso todos os dias e sentia-se mais calmo com o vento batendo em seu pelo.

Vez ou outra, um caminhoneiro passava pela rodovia buzinando e isso lhe dava um susto.

Por agora, ele parou na calçada para refletir sobre sua vida. Ficou meia hora pensando nisso e decidiu que era hora de voltar. Levantando-se, uma caminhonete parou em frente a ele.

O que fazer com essa tal LiberdadeOnde histórias criam vida. Descubra agora