6. Uma conversa

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Voltando para casa, Pedro pediu para que Caio sentasse à mesa para poder conversar. Havia um leve cansaço no lobinho, mas Pedro não queria esperar para conversar, pois o momento poderia não estar mais tão favorável.

— Está se sentindo melhor? — questionou.

— Sim — respondeu.

— Ótimo — exclamou. — Vamos conversar um pouco.

— Estou um pouco cansado — falou o lobinho.

— Mas preciso falar com você agora — havia urgência na voz de Pedro. — Está extremamente cedo para você dormir e amanhã será um dia diferente.

Caio foi até o cozinha e se sentou à mesa de madeira, ficando em frente a Pedro. O lobinho passou sua mão sobre o pano que cobria a mesa como es estivesse fazendo carinho na tentativa de acalmar sua ansiedade do medo de levar uma bronca. As pessoas, quando iam dar uma bronca nele, falam isso antes.

— Quero que me conte um pouco mais — pediu Pedro.

Jojo adentrou a cozinha e seguiu para o fogão, pegando materiais no armário ao lado. Pegou uma leiteira de ferro aqui, encheu-a de água ali, pegou ervas de chá acolá... depois inseriu açúcar na mistura.

— Bem... — Caio não soube por onde começar. Haviam tantos começos possíveis que era impossível começar por algum.

— Acho que preciso fazer as perguntas certas para ter uma resposta — murmurou Pedro. A hiena listrada se ajeitou em seu lugar, ao passar sua mão sobre a cabeça, Caio notou que ela tinha uma pequena crina escura. Pedro acariciou sua própria cabeça em busca das palavras certas para formarem a pergunta. — Vamos começar pela sua tristeza daquele dia — não demorou a encontrar as palavras. — Quem fez aquilo com você?

Caio sentiu seu peito doer ao lembrar daquele momento. Mas Pedro estava disposto a escutar. A hiena listrava estava diante de si querendo ouvi-lo. — Minha... minha família — respondeu.

— O que eles fizeram? — questionou.

— Eu... eu já... já te contei antes de sairmos — lembrou Caio, não querendo falar mais a fim de evitar sentir mais dor em seu peito.

Pedro sentia isso, mas precisava ir mais a fundo. Iria doer um pouquinho, mas seria melhor do que a ferida abrisse aleatoriamente e machucasse alguém. Seria melhor abri-la agora para tirar o veneno.

— Quero saber... há quanto tempo fazem isso? — questionou. — O que fazem, quem faz, como você se sente...

Caio foi falando em pausas, tropeçando nas palavras em alguns momentos, com lágrimas nos olhos e o peito doendo. Pedro havia feito isso algumas vezes com alguns poucos pacientes que teve em sua curtíssima carreira de psicólogo e em estágios. Era difícil para o paciente ter que se abrir, pois ele estava abrindo a própria ferida. Mas abrir a ferida não é para fazer a pessoa sangrar, mas para tirar o veneno que há por baixo da casca. Contudo, como saber se há veneno por baixo dessa ferida? Não há! Então é preciso cutucar um pouco. A possibilidade de haver veneno lá dentro é grande e, havendo veneno, é preciso tirá-lo para que ele não corrompa a pessoa novamente.

Mas que veneno é esse? A angústia, o ódio, a dor, a tristeza e tudo o aquilo que precisou ser escondido por medo do julgamento. Aqueles pensamentos negativos que fazem o veneno se espalhar a cada pulsação do coração, fazendo-o bater diferente, com amargura. Fazendo a mente ter pensamentos sujos e a boca se encher de palavras ruins.

Pedro via, em cada palavra dia, em cada lágrima escorrendo, o veneno sendo expelido. Havia tanta raiva da família, tanta mágoa... Contudo, quando Caio falava família, eram sempre membros específicos a quem se referia, o que representava uma pequena parte da sua família.

O que fazer com essa tal LiberdadeOnde histórias criam vida. Descubra agora