III

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Bernardo não soube de imediato o que havia acontecido. Ele não estava entendendo como sua vó não poderia vê-lo. Aos poucos, ainda tentando chamar sua atenção, ele foi se afastando dela. Retornou para o quarto de qual havia saído, e ao ver seu corpo ali deitado, com tubos e fios ligados aos aparelhos, que entendeu o que estava acontecendo.

Ele começou a observar ao seu redor, e ao fazê-lo me flagrou olhando para ele. Ali, foi a hora de eu sair de cena. Tarde demais, mas não podia ficar ali mais, como um intruso, observando o sofrimento e compreensão dele.

Ao sair, involuntariamente, olhei mais uma vez para Bernardo e ele estava me olhando. Abaixei a cabeça e fui para "meu quarto". Permaneci do lado do meu corpo por algumas horas, até que resolvi sair novamente. Não aguentava ficar ali, me olhando imóvel, sem poder fazer nada.

Às vezes, eu tentava deitar em cima de mim, para ver se meu espirito assentava no meu corpo e tomasse o controle novamente, mas era em vão. Tentava também segurar um dedo, na intenção de conseguir levantar ele, mas sem sucesso.

Fui para a recepção. Depois da correria que houve, com a chegada do rapaz, a noite no hospital foi relativamente calma. Na recepção, estavam poucas pessoas esperando pela triagem, mas com questões comuns, gripes, febres, vômitos, mas aparentemente, nenhuma urgência.

Quis evitar a sala de espera, pois sabia que Bernardo poderia estar lá. Eu queria muito alguém com quem conversar e agora tinha, mas sabia também que ele teria perguntas. Inúmeras perguntas, das quais eu não tenho resposta.

Andando pelos corredores, ao passar pela escadaria que leva até o segundo andar, não reparei que havia uma pessoa na escada, passei reto, quando ouço uma voz.

- Hey você!

Olhei em direção para onde a voz vinha. Lá estava ele. Sentado no meio da escada.

- Por que você pode me ver e ouvir? É algum médium? – perguntou ele

Eu sabia que, quando ele me visse novamente, começaria as perguntas. E não o culpo. Eu ainda tinha perguntas sem respostas.

- Não sou nenhum médium – digo com um pequeno sorriso e abaixando a cabeça – consigo te ver e te ouvir, porque sou igual a você.

- Você está em coma? Ou...morto? – me perguntou com um pouco de receio da minha resposta

- Estou em coma...igual...você.

- Que foda cara, você parece ser tão novo. O que aconteceu?

- Um acidente... – respondi

Ele era a primeira pessoa com quem eu podia conversar em meses, mas não estava disposto, nem pronto para falar sobre isso. Me virei e ao seguir meu caminho novamente, escuto ele me pedindo para esperar e quando percebo, ele já está ao meu lado.

- Me chamo Bernardo – diz ele

- Prazer – respondo e continuo andando, de cabeça baixa, com ele ao meu lado

- É nessas horas que você me diz o seu nome

- Desculpe – paro por um instante e olho para ele – Me chamo Nicholas

- Agora sim...prazer Nicholas – diz ele, com um sorriso no rosto

Ele me encara, parece observar cada detalhe do meu rosto, com uma bastante atenção, e isso me deixa um muito desconfortável. Abaixo meu olhar para o chão e volto a andar pelos corredores. De momento, continuo andando sozinho, mas logo, ele está ao lado novamente.

- Hey – diz ele ao me alcançar – posso perguntar mais...

Mas ele não consegue terminar a frase edesaparece...

Um amor do outro lado (Romance gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora