17. NOITE DAS GAROTAS

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Em pouco tempo, a vida de Jacqueline mudou completamente. Costumava estar sozinha lutando contra o próprio mundo, fechada e parada no tempo. Uma grande porta havia sido aberta e as possibilidades da passagem não tinham mais volta, ainda que dormindo e "sem consciência", imaginava o que poderia se tornar... As mesmas possibilidades criando vida. Ali, naquela cama que sempre adormecia sem expectativas, voltava a sonhar.

Ah, a cama... Sim, a mesma larga e amadeirada de sempre, mas onde já não se deitava mais sozinha. O lado esquerdo estava ocupado e tinha fortes braços em torno de seu corpo, aninhando em um sono perfeito. E tudo realmente parecia perfeito... Essa conclusão era assustadora. Quando acordada, já tendo se despedido de Henry e novamente sozinha - sem Kal dessa vez, pois passaria dia junto do dono -, tornava a se perguntar se daria conta de tanta coisa. Questionava-se se deveria aceitar essa nova vida, que não somente se tratava de um novo lar e atividade, mas de uma companhia tão pública. Era loucura ter que ponderar isso, não fazia sentido. Não parecia real.

Muita coisa não parecia real, mas tinha certeza de duas: 1. seu compromisso na clínica e 2. sua amizade com Mei. Iria trabalhar, aproveitar o tempo sozinha para clarear a mente e depois conversar com ela mais a fundo. Tinha que ser racional e planejar o que quer que fosse acontecer, porque até para abrir mão de um sonho é preciso mais do que coragem... Precisa de foco.

Sem ter que ficar de olho em Kal durante a tarde, aproveitou dos longos minutos de folga e paz para ponderar. Após conferir todas as baias e verificar as medicações, fechou os olhos e buscou meditar no meio dos latidos para buscar uma resposta interior. Envolvia muita determinação no meio do que parecia uma sinfonia de pinschers e chihuahuas, mas ela tinha... E como tinha! Feito seus minutos de silêncio, pegou um papel e uma caneta e, como sugerido por Dominik ao passar o plantão, dividiu a folha em duas colunas e listou seus prós e contras. Parecia bobo, mas o método à moda antiga era a forma mais visual de ver o que prevalecia.

~ ♡ ~

Por mais que parte de si quisesse a companhia de Henry, havia uma outra que agradeceu ao fato do ator aparecer apenas rapidamente antes do anoitecer. Ele havia passado a tarde livre com o cão pela cidade brincando e mantendo-o ocupado, então, ao crepúsculo, levou o animal novamente para Jacqueline para descansar. Conversaram brevemente, trocaram carícias, um longo abraço e logo despediram-se, pois Cavill tinha de vestir sua armadura, colocar a famosa peruca branca e lutar contra um tipo novo de monstro.

Recebeu Kal de bom grado, como sempre, mas apressou-se em guardar um cantinho protegido para a visita que viria mais tarde junto de Mei: o gato compartilhado. Essa seria uma logística difícil, ainda mais considerando que lembrava-se do ator comentar que o akita gostava de persegui-los, porém, tinha um propósito maior e nada poderia estragar aquela noite de garotas.

A mesa de jantar não foi posta formalmente, muito pelo contrario, haviam vários potinhos para doces e aperitivos, copos e um panfleto da pizzaria na qual fariam os pedidos. A tradição das meninas era comer no sofá, usando a mesinha de centro como apoio enquanto riam e assistiam filmes. Ou, naquele caso, conversavam sobre o futuro.

━ Psiu, vem cá, garotão! ━ Chamou Kal enquanto entendia a mão para o mesmo e estalava os dedos para chamar sua atenção. Logo ele parou em sua frente, cheirando e lambendo sua mão. ━ Isso, muito bem. Pode me prometer uma coisa?! ━ Arqueou as sobrancelhas como se falasse com uma criança em fase de aprendizagem, o que achou graça por dois motivos: 1. Kal não era mais filhote, e 2. será que realmente entendia?! Sempre falava com animais como se fossem pessoas, mas teve de rir de si mesma ao implorar para o cão. ━ Vamos ter uma visitinha hoje, duas, na verdade, uma delas é uma grande amiga minha. Ela tem um pouco de medo de cachorro, então nada de pular ou lamber, combinado?! Você é bem grandinho e ela não está acostumada. ━ Afagou a cabeça peluda com ambas as mãos, já se inclinando para ficar da mesma altura. ━ E ela vai trazer um gatinho também... E é aí que você se comporta perfeitamente, certo? Posso contar com você, Kal?! ━ Esperou uma resposta mesmo sabendo que nada conseguiria além dele desenrolar de língua contra os próprios lábios e olhar curioso para ela. ━ Certo, vou tomar isso como um sim!

Kal & ElaOnde histórias criam vida. Descubra agora