Capítulo 64

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Atravessando o corredor, consigo ouvir alguém ligando a caixa de som e trocando as músicas sem permitir que durem ao menos dois segundos. Não consigo enxergar quem é, pois a porta aberta tem a vista bloqueada por uma cascata de fitas roxas brilhantes, que reluzem ainda mais quando a luz bate contra elas.

- Você não tava com uma tal de Suzie? - A voz da minha mãe vêm da cozinha e já sei com quem ela fala.

- Eu estava, do verbo passado - Ouço meu pai dizer enquanto me aproximo - Ela até que era legal, mas...

- Não. Aquela mulher era qualquer coisa, menos legal - Eu entro na cozinha e os dois olham pra mim. Minha mãe fica me observando com uma forma cheia de salgados na mão, e meu pai aproveita seu momento de distração para roubar um deles, fazendo ela bufar enquanto os leva para o outro lado da cozinha.

- Que isso, Megan? Ela fez um bolo quando vocês se conheceram - Ele tenta defender ela, mesmo sabendo que ela não era nada legal.

- Aquele bolo de milho que ela "acidentalmente" fez, mesmo que eu tenha listado todos os sabores que eu não suportava quando ela perguntou? - Cruzo os braços com as sobrancelhar arqueadas enquanto espero sua resposta.

- Até eu que amo bolo de milho sei que aquilo tava horrível, porque ela literalmente fez a Megan trazer um pedaço pra casa - Minha mãe apoia a mão na cintura, observando o ex marido com certa indignação no olhar.

- Ela só queria ser gentil - Ele rebate gesticulando.

- Ela enfiou o pote com o bolo na mochila da sua filha enquanto ela dormia, Henry. - Ela também arqueia uma sobrancelha, confrontando ele.

- Tudo bem, vocês venceram. Agora, será que posso dar um abraço na minha filha? - Ele abre um sorriso e os cantos dos olhos se fecham, por conta das rugas da idade. - Estava morrendo de saudade, joaninha - Meu pai me abraça com força e eu retribuo na mesma intensidade. Eu realmente precisava disso.

- Joaninha, pai? - Pergunto quando ele se afasta - Eu tô fazendo dezoito anos e você continua me chamando assim - Digo com um meio sorriso e ele segura minha cabeça com suas mãos.

- É porque você vai ser minha joaninha pra sempre - Ele beija minha testa e me afasta para me analisar - Falando em dezoito anos, já tá sentindo a coluna atrofiar? - Ele ri da própria piada e eu acabo fazendo o mesmo por conta do som que sai dele, fazendo parecer que ele fuma há quinhentos anos. - Vê se aproveita a idade porque depois é só ladeira a baixo. - Contornando o balcão, ele consegue roubar um docinho de uma das bandejas.

- Obrigada por me incentivar tanto a querer viver - Digo num tom irônico vendo ele passar pela porta da cozinha.

- Nada filha, tô aqui pra isso - Sua voz some no corredor quando ele vai para a área externa.

- Você tá tão linda - Minha mãe fala com a voz um pouco aguda por conta da animação, saindo de trás do balcão e vindo até mim, exibindo seus olhos castanhos que agora estão marejados.

- Já? - Pergunto vendo uma lágrima solitária rolar por sua bochecha.

- Ah, me deixa em paz, vai - Nós duas rimos. - É só que... - Ela prende as duas mechas de cabelo, que ficam perto do meu olho, atrás das minhas orelhas. - Eu tenho muito orgulho de você e de ser sua mãe - Ela diz, olhando bem no fundo dos meus olhos, e uma repentina vontade de chorar me invade também.

- Obrigada, mãe - Eu a abraço, mas logo somos interrompidas por um barulho estrondoso na sala.

- Merda - Ouço a voz xingar e quando nos viramos, damos de cara com Nate e alguns dos quadros da estante caídos no chão. - Desculpa... - Ele coça a cabeça, sem graça, enquanto nós rimos. - A porta tava encostada e eu não queria atrapalhar o momento - Ele pega um porta retrato do chão e tenta arrumar novamente na estante. - Droga - Ele resmunga quando o mesmo não fica em pé.

Eu odeio não te odiar Onde histórias criam vida. Descubra agora