Eu odeio não te odiar

Capítulo 2 (nova versão)

1 ano, 5 meses e 15 dias atrás. Fim do verão.

Faz uma semana que as aulas voltaram e eu posso dizer com toda a certeza do mundo que não senti falta nenhuma desse cheiro. É uma mistura horripilante de vários desodorantes, suor e torta de sardinha. Quem gosta de torta de sardinha?

Esse tipo de coisa me faz questionar se a escola é um lugar que te prepara pro futuro ou algo parecido com um teste de sobrevivência. Prefiro acreditar na segunda opção.

Abro meu armário, que tive a sorte de trocar com uma das meninas do coral, as fotos que colei do lado de dentro sorrindo pra mim. Achei que seria motivador um lugar como esse ser "abençoado" por coisas legais. Desde então resolvi enfeitá-lo e deixar algumas coisas nele, como chicletes, elásticos de cabelo e um fone de ouvido extra. Eu sempre acabo perdendo o meu depois de algumas semanas.

Antes de ir pra próxima aula, dou uma olhada na minha foto com Nate colada com um adesivo de estrela brilhante. Tiramos essa nessas férias, em uma das infinitas vezes em que ficamos o dia inteiro na nossa "casa da árvore", que não é bem uma casa da árvore. Lembro do quão complicado foi ativar o temporizador da câmera e do quanto eu ri enquanto Nate corria em minha direção pra sair na foto, mas o flash sempre acendia antes dele chegar. Isso sem falar de quanto ele tropeçava no meio do caminho. Quase esqueci da mensagem que sua mãe me enviou no segundo tempo de aula. Preciso falar com ele. Ele sai cedo do treino às terças também?

Desperdiço um tempo que não tenho encarando o Jacob Elordi, todo charmoso ao lado da outra foto. É... definitivamente foi uma ótima ideia fazer isso com o meu armário.

- Megan - Ouço uma voz feminina e doce atrás de mim. Antes mesmo de me virar já sei quem é. Sofia.
- A gente precisa reunir as pessoas do grupo pra discutir um tema pro trabalho de sociologia. Você tá livre amanhã? - Ela pergunta com um olhar esperançoso, segurando as alças da mochila azul índigo em seu ombro. Seus cabelos escuros presos em dois coques no topo da cabeça e a franja cobrindo parte da testa. Sabe, apesar de ser chamada de nerd por metade da escola, ela continua sendo gentil com todo mundo. Adoro ela.

- Claro, só me fala o horário depois. - É a última coisa que digo antes dela abrir um sorriso tímido, acenar com a cabeça e ir embora.

Faltam cinco minutos pro sinal tocar e ainda não achei Nate. Meus passos apressados se embolam por um momento e acabo esbarrando em Rebeca.

- Ah, desculpa - Me abaixo para pegar seu brilho labial cor de rosa que está rolando perto de meus sapatos pretos.

- Megan! - Ela dá um gritinho e me puxa pra um abraço, que eu retribuo.

- Qual o motivo de toda essa felicidade? - Pergunto sorrindo enquanto ela me acompanha andando pelo corredor. Desviamos de uma plaquinha amarela com o aviso de "Cuidado, piso molhado" no meio do chão, enquanto recebemos um "Bom dia, meninas" cantarolado por senhorita Garcia, que passa por nós deixando seu típico perfume floral pelo ar.

- O motivo. Ah, você já deve ter visto esse motivo andando por esses corredores. - Ela suspira com a mão sobre o peito, dando um ar dramático a toda sua frase.

- Tá falando do senhor Chang? Eu soube que ele deu 10 pra todo mundo no trabalho de ontem. - Arrumo algumas mechas do meu cabelo. Está bem comprido. Será que eu deveria cortar? Acho que seria bom dar uma cortada.

- Não! Isso também foi legal, mas não é ele. - O piercing em seu nariz brilha com a luz forte do corredor. Lembro que todos acharam ela super avançada por ter furado o nariz, ainda por cima, escondida dos pais.

Cumprimento algumas pessoas de longe enquanto tento me situar sobre o que ela está falando. Fechando seu armário, Russo olha pra mim e acena com a cabeça. Nós nunca conversamos de fato, mas sorrio pra ele nesses nossos "encontros de corredor". Ele é fofo, mas não faz meu tipo. Não que eu tenha um tipo, é só que... Espera, do que a Rebeca tava falando mesmo?

- E ele é um pedaço de mal caminho. - Pela sua expressão, sei que está se segurando pra não sair correndo e pulando por esse corredor.

- Ele quem?

- O aluno novo! - Ela exclama, gesticulando. As pulseiras coloridas em seus pulsos tilintando. - Mas todas as garotas já estão caidinhas por ele. A concorrência tá pesada, sabia?! - Ela puxa o brilho labial do bolso espalha pela boca, se guiando pela tela do celular. O cheiro de cereja se fazendo presente. Depois pergunto aonde ela comprou.

- É? - Pergunto, me segurando para não rir de sua cara de desânimo.

- Você sabe...

- Na verdade, não. Eu deveria?

- Ai, Megan, às vezes eu te adoro, mas você me dá um trabalho... - Ela balança a cabeça em negação, sua postura preguiçosa.

- Desculpa? - Nós paramos em frente a uma das salas de aula.

- Soube que a Kylie já tem até o número dele. Com ela não dá pra competir. - Seguro os livros de Rebeca por um instante pra que ela possa fixar seu rabo de cavalo quase no topo da cabeça.

- Ai meu deus. Você viu que a Jade postou uma foto com ele? - Isabela, melhor amiga de Rebeca, entra em nossa frente, informando as últimas notícias para nós. - E eles se conheceram ontem - Ela termina, indignada.

- Vocês não acham que tão superestimando muito esse cara? - Devolvo os livros de Rebeca para seus braços, recebendo um olhar cômico da mesma e de sua amiga.

- Você já viu ele? - Isa me pergunta, como se essa fosse a resposta mais óbvia.

- Algumas vezes por aí - Mesmo que eu não tenha conseguido ver muito de seu rosto. Ele sempre parece estar rodeado de pessoas. Mas também, sendo o único aluno novo da Belmort em quatro anos, eu entendo que estão lidando com isso quase como se fosse um evento da cidade.

- Não importa. Acabou a sororidade. Agora é guerra - Ela diz, determinada, ganhando um tapinha no ombro encorajador de Isa.

- Boa sorte pra vocês. - Eu grito, sorrindo, vendo as duas entrarem na sala.

A sala. O sinal já vai tocar. Tenho que achar Nate.
Correndo pelos corredores faltando alguns minutos para que a próxima aula comece, encontro ele perto do bebedouro. Um grupo de estudantes vêm em minha direção e antes que possam bloquear o caminho, apresso meus passos, quase acertando meu melhor amigo em cheio.

- Que bom que eu te achei, você vive com esse celular desligado. - Dou um tapinha em seu braço, fazendo ele rir. - Isso é pouco, sua mãe pediu pra eu te matar. Ah e você almoça na minha casa, hoje. - Termino de dizer, recuperando o fôlego e Nate afirma com a cabeça.

- É a sua namorada? - Só agora percebo o garoto encostado nos armários ao nosso lado. Ele... não é de se jogar fora. Ele desliza seus dedos pelos fios loiros, não muito claros, olhando pra mim.

- Eles passam tanto tempo juntos que até eu suspeito. - A voz de Bianca surge entre nós, respondendo a pergunta do gatinh... garoto.

Seu comentário completamente desnecessário poderia até passar batido e soar como uma piada inocente se eu não soubesse que ela fala sério. Bem sério.

Às vezes me sinto meio culpada por passar tanto tempo com Nate ou por ser tão próxima dele, mas ele sempre diz que eu não tenho que ficar assim por culpa de um relacionamento que nem é meu. "Eu me viro com ela depois" É o que ele sempre diz.
Agora nós olhamos para ela com a mesma expressão de cansaço.

- Brincadeira gente, perderam o senso de humor? - Ela chega mais perto, dando um selinho nele. Por sorte não têm nenhum inspetor no corredor, eles são bem chatos em relação a isso. Mas eu acho que ela não liga muito pra isso, constato quando vejo que o beijo de "olá" se tornou um "nossaeuestavamorrendodesaudadedevocê".

Eu e o novato que não conheço ficamos ali, apenas existindo, enquanto meu vizinho é devorado pela namorada.

- Oi

Ai meu deus, ele tá falando comigo?

- Oi - Eu digo, finalmente olhando pra ele.

- Acho que ele tá meio ocupado agora, mas eu posso me apresentar sozinho. Alex - Ele estende sua mão, com um meio sorriso no rosto.

- Megan. - É tudo o que consigo dizer. O mais temido contato visual acontece quando aperto sua mão.

Seus olhos são azuis. Bem azuis. E lindos. Assim como o resto do seu rosto. Tá, essa é a hora em que eu paro de encarar as pessoas pra não parecer uma doida.