Bella
De frente para mim, está a carreta mais bonita que já vi na minha vida. Nem mesmo o breve apagão e o estrondo foram capazes de ocultar tamanha beleza. A sensação que tenho é de que a cerca que me separa do Caio foi arrancada e colocada ali. Cobrindo os pés de Santa Rita, milhares e milhares de jasmins-dos-poetas exalam o manto perfumado, hipnotizando seus fiéis.
Assim como eu, as pessoas estão paradas em volta da carreta, admirando a decoração que o Ruy fez. Simplicidade, paz e delicadeza. A representação plena da fé e do amor, as duas coisas que nunca perdi na vida.
A redoma repleta de pequenas microlâmpadas amarelas deixa a padroeira de Monte Belo ainda mais esplendorosa.
Procuro a Fabi, que devia estar do meu lado, mas a esta altura ela já sumiu na multidão.
Olho para o lado e vejo Caio, ele está sorrindo. Pra mim? Desvio o olhar, confusa, e percebo que na verdade Ruy não fez aquela carreta sozinho. Por um instante me ocorre que o Caio pode tê-lo ajudado. Como?
Nunca tinha contado a história da flor a ninguém. Ruy não sabe. A Clara foi a única para quem contei e, mesmo assim, porque eu estava em um momento de fragilidade extrema. Não é algo de que eu goste de falar. Parece uma ilusão cega, uma esperança vazia. É ridículo pensar que na minha idade, prestes a completar vinte e sete, eu ainda acredite em contos de fadas.
— Linda... — a voz de Caio me faz paralisar.
Ele olha para mim, mas sei que está vendo o corpo da Clara. Deduzo que tenha se referido à carreta. Não que minha sobrinha não seja linda, mas acredito que ele não falaria assim com ela. Principalmente depois daquele mal-entendido.
— O Ruy fez um excelente trabalho — limito-me a dizer, tentando não dar bandeira.
Abaixo os olhos desconcertada, tentando controlar a vontade de chorar ali, na frente de todo mundo. Clara me mataria.
Ele me encara e não consigo desviar os olhos. Vejo um brilho diferente, uma espécie de conexão. A mesma que sempre tivemos.
Sinto seus dedos nos meus braços. Segurando-me com delicadeza, acariciando-me com o polegar. Estamos no meio da multidão, todos estão nos olhando. Dou um passo atrás.
— Vem comigo? — convida pegando minha mão, deixando-me sem alternativa.
Sei que não deveria ir. Ele está estranho, será que realmente achou que a Clara está interessada nele? Deixo meus dedos escorregarem. Caio vai na frente, desaparecendo na multidão.
Enquanto caminho devagar entre as pessoas, fito meus pés ... Uai! Eu não estava com esse sapato. Será que a Clara tem um igual e eu calcei sem querer na hora que me arrumei? Paro perto do meio-fio e tento verificar se está apertado, mas a sapatilha está megaconfortável.
— Vem, Bella... — Sinto uma mão me puxando e em poucos instantes estou nos braços de Caio de novo.
Longe do tumulto, perto da prefeitura, Caio para. Olho para minha mão. A marca da aliança ainda está lá.
— Do que me chamou? — busco confirmar, com medo de olhar para os meus seios.
— Bella, meu amor. — Caio me fita com tanta intensidade que fico atônita.
Pisco alguns instantes tentando me situar. Onde eu estava? O que aconteceu? Quando eu voltei? Eu nem senti. O estouro? O Apagão? Pela Carreta de Santa Rita... Procuro o celular na bolsinha e vejo que estou com o aparelho da Clara. Sou eu mesma, estou de volta.
— Quem você está vendo, Caio? — minha voz fraqueja.
— A mulher da minha vida.
Receoso, ele aproxima os lábios dos meus.
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Deu Ruim
RomanceNo auge de seus dezesseis anos, Clara sonha em ser como sua tia, a subcelebridade, diva insuperável, Isabella Sampaio. Com os olhos no futuro, ela planeja a própria e estratosférica ascensão para o tapete vermelho da fama e do glamour. Já a famosa...