Bella
Enquanto Caio continuava reclamando e pagando o maior sermão pela chegada triunfal das meninas na festa, na porta do clube eu observava os meninos entrarem.
— IR-RES-PON-SA-BI-LI-DA-DE. — Olhei para o Caio e o encarei. — E se acontecesse alguma coisa com os meninos?
— Não aconteceu, Caio. E, por favor, você fazia o mesmo quando tinha a idade deles. Ainda pior, dirigia sem carteira.
— Outros tempos, Isabella.
— E o que mudou? Ontem você era filho e hoje é pai. Me poupe! Mais um que entra para lista dos hipócritas. "Faça o que digo, mas não faça o que faço." — Eu o encarei determinada. — Ah, não! Esqueci. Eles não precisam saber que você foi jovem um dia e aprontou um monte.
— Você não sabe o que está dizendo.
— Não, eu não sei! Não sou mãe, não é mesmo? Mas eu sou tia. Aquela legal, que conversa sobre tudo, que dá bronca sem pagar lição de moral. Claro que isso não chega aos pés da sua responsabilidade, não é? Mas eu pelo menos sei que a Katharina tem vergonha do próprio corpo sem precisar, porque a Clarinha estabeleceu padrões "photoshopescos" impossíveis.
— Você criou esses padrões, Bella. — Sério? Desculpa, mas não sou obrigada.
Avancei na maçaneta para abrir a porta da Jabiraca, que continuava parada na porta do clube. Uma pequena plateia sub-16 continuava nos olhando, e aquele pedaço de lata-velha saiu da minha mão.
Abri o vidro no toco, catei a minha bolsa e comecei a sair pela janela. Caio tentou segurar meu pé, mas eu me desvencilhei rápido e saltei. Anos de prática, baby.
Caminhei em direção à praça, com a Jabiraca me acompanhando lado a lado. Ele não disse nenhuma palavra. Só me seguia feito um cão-guia, como se eu não soubesse o caminho.
No Kid Lanches, sentei-me a uma mesa na calçada, enquanto Caio estacionava a Jabiraca. Fiz questão de retirar a cadeira vaga ao meu lado, a da frente também. Talvez assim ele desconfiasse que não era bem-vindo, mas não foi bem isso o que aconteceu.
Era final de tarde de domingo, só essa descrição deixava subentendido o costumeiro movimento de Monte Belo.
Padre Renato saía do casamento das cinco pela porta lateral e, como sempre, era interpelado por todos que passavam. Pobre homem, devia fazer voto de silêncio quando entrava em casa.
Do outro lado, Tio Nilson empurrava o carrinho de pipoca, atrasado, para estacionar em frente à igreja.
O vestido da noiva, que recebia os cumprimentos sorridente, reluzia com os últimos raios de sol; discretos, os feixes quase se escondiam nas palmeiras, mas forneciam luz suficiente para destacar a má escolha. Será que não colocam, em letras garrafais nas revistas, os pecados mortais no dia de um casamento?
Seu Jair esperava, sem muita paciência, os convidados desocuparem a entrada da igreja, para varrer as escadas. Uma daminha toda descomposta distribuía os bombons. Comia mais do que distribuía, e Seu Jair observava cada forminha que ela deixava cair no chão.
Do outro lado (não que eu estivesse olhando, foi só de relance, eu juro), Caio cumprimentava todos e era parado, mostrando ter a mesma popularidade do Pe. Renato.
Eu não podia cair em tentação de novo. Não quando minha vida estava uma bagunça. A paixão nada mais é do que um produto de um encantamento. Basta uma simples palpitação para brotarem as ilusões. Depois disso, a imaginação toma conta e nada mais é real. Uma explicação simplista, mas bastante sensata.
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Deu Ruim
RomanceNo auge de seus dezesseis anos, Clara sonha em ser como sua tia, a subcelebridade, diva insuperável, Isabella Sampaio. Com os olhos no futuro, ela planeja a própria e estratosférica ascensão para o tapete vermelho da fama e do glamour. Já a famosa...