A Culpa é do Matheus Henrique

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Clara

Dois dias depois de a notícia sobre minha festa viralizar, o rastro da popularidade ainda me seguia e ofuscava todos a minha volta. Eu flutuava de felicidade, nem imaginava que o sonho que parecia impossível se transformaria literalmente em realidade e que o número do meu sutiã pularia de 36 para 42. Mas esse detalhe eu explico depois, primeiro preciso relatar o drama do dia e, claro, se figura aí a palavra "drama", só podia haver um dedinho do meu irmão gêmeo no meio.

Nem tudo que é persistente é bom, aprendi logo. Não era apenas a fama quem revoava a minha volta; o zumbido do Matheus Henrique também me perseguia aonde quer que eu fosse, como uma abelha impertinente tentando mergulhar no copo de refrigerante — não que eu pudesse ser comparada a um copo desse líquido altamente nocivo, praticamente radioativo, claro.

E, agora mais que nunca, por causa da minha popularidade crescente, ele queria meu apoio.

Meu irmão se negava categoricamente a eliminar os Dedos Horripilantes da minha festa, mas ainda me importunava para que o ajudasse na campanha para a presidência do tal Grêmio Estudantil, motivo pelo qual se tornou uma verdadeira pedra no meu sapato.

— Matheus Henrique, para começo de conversa, por acaso você sabe para que serve um grêmio estudantil? — mandei a pergunta enquanto ele me seguia pelos corredores da escola; eu não sabia a resposta e apostava que ele também não, o que me livraria dessa perseguição, ao menos temporariamente.

— Claro que sei. — Xiii, por essa eu não esperava. — Ele organiza várias atividades, eventos e, com isso, ajuda a melhorar a participação dos alunos na escola e na comunidade.

Gemi apressando o passo, na esperança de cansá-lo e fazê-lo desistir da caçada a minha pessoa, mas logo tive que admitir que meu gêmeo estava mais em forma do que eu, seguindo incansavelmente em meus calcanhares, sem sequer ofegar. Eu já estava começando a ficar nervosa, muito, mas muito nervosa mesmo. Não é que eu não quisesse apoiar o meu irmão, não me entendam mal; no fim das contas, eu acabaria fazendo isso, claro! O problema era que esse era o único trunfo que eu possuía para barganhar com ele e conseguir, finalmente, eliminar a única mácula da minha festa, aqueles petiscos em formato de dedos, com sangue nos cantinhos das unhas — mil vezes argh!

— E quais são as suas propostas para o grêmio? — Agora, sim, eu o colocaria na berlinda.

— Minhas propostas? Estão aqui — respondeu folheando um calhamaço, que logo enfiou no meu nariz, obrigando-me a pegá-lo e a parar para ler.

Droga, pelo visto ele tinha feito o "para casa" direitinho. Confesso que fiquei surpreendida com a eficiência dele.

Porém, na leitura dinâmica realizada em poucos segundos, vi várias vezes a palavra "rugby" e me agarrei a isso como última esperança de me ver livre dele, pelo menos até que tivesse melhores argumentos para voltar a negociar.

— Está pensando em transformar a escola em um clube de rugby? Francamente, Matheus, acho que você precisa ampliar sua visão, antes de se candidatar. Por que não bate um papinho com Pet... com o Pedro? Ele pode melhorar essa proposta — propus para ganhar tempo.

Voltando ao lamentável problema com os biscoitos medonhos do meu irmão, em casa eu e Ruy éramos voto vencido. Mamãe dizia que era injusto não aceitar as sugestões do Matheus, já que o aniversário também era dele; Tia Bella ia atrás como qualquer tia indulgente e, talvez, querendo fazer uma média com a cunhada. Já papai adorou os Dedos Horripilantes e perdeu o foco da discussão numa "sessão nostalgia" com meu irmão e o Tio Caio, relembrando a última vez que tinham assistido ao filme Uma Noite alucinante. Com a Katharina, o caso era ainda mais grave, já que, na degustação da coisa sanguinária, ela foi ao delírio ao comprovar que o sangue (geleia de morango) vinha diretamente de uma das panelas da Dona Anna. Ela era totalmente a favor dos biscoitos e gostava deles quase tanto quanto do Juan Roberto de la Vega.

Deu RuimOnde histórias criam vida. Descubra agora