Capítulo Trinta e Um

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Antes de dormir acabei assistindo ao vídeo que Raquel e outras garotas da escola fizeram para falar sobre o patriarcado. Não me distraiu tanto quanto eu quis, mas foi bom ouvir palavras como "homens" e "idiotas" numa mesma frase. Acabei pensando que, hoje, foi um dos piores dias da minha vida e, consequentemente, estará na minha memória para sempre, talvez.

Também coloquei no Spotify e selecionei uma playlist que nomeei como "Poço com a Samara", onde há setenta músicas diferentes: Taylor Swift, Sam Smith, Anavitória, Cazuza, Adele, One Direction.

Foi assim que consegui pegar no sono.

Quando acordei ainda me sentia terrível. Mais terrível ainda quando descobri que hoje é domingo: último final dia de final de semana, minha mãe no trabalho e Robson em casa. Fiquei na cama e fucei as redes sociais.

Não quis entrar no Instagram para ver as fotos perfeitas de casais, isso me daria raiva. No Twitter havia apenas o de sempre: xingamentos ao presidente, fotos de animais, pornografia e mais xingamentos. Eu não encontrava uma forma de me distrair e sair da cama está fora de cogitação. Vovô apareceu e perguntou se eu queria jogar Xadrez.

—Pode ser damas? Não gosto de Xadrez, o senhor sabe.

—Tanto faz. —Ele foi pegar o jogo. Quando voltou, também trouxe suco de maracujá.

—Ainda não escovei os dentes.

Meu avô pareceu não ligar. Ele está mais sério hoje do que nunca. Pensei que estava sabendo do que aconteceu e ficou com raiva porque não lhe contei. Uma desculpa já começava a se formar na minha garganta quando ele falou o porquê de estar tão sério.

—Robson acha que você é gay.

Meu estômago contraiu. Senti como se meus dedos estivessem de volta à garganta como ontem naquele beco. Eu só sentia que deveria vomitar, mas não comi nada para que pudesse fazer isso. Nem mesmo sei que horas são agora, ou se Robson está em casa. Ou se ele está ouvindo eu e meu avô como fiz com ele e minha mãe.

—Quando ele disse isso?

—Depois que você saiu.

—Como ele... O senhor disse alguma coisa?

Por um segundo ele não me respondeu então achei que a resposta fosse sim.

—Claro que não. —ele cuspiu —não vou contar seu segredo para ele.

—Obrigado. —Parecia certo agradecer enquanto posicionávamos as peças.

—Por mais que —continua ele com aquela voz que o faz parecer mais sábio —eu ache que você deva contar. Não agora, não amanhã se você quiser, mas quem sabe quando você decidi respirar e decidi que está um dia bom? Um momento perfeito, quem sabe? Não precisa ter medo de falar, eu vou estar com você quando você falar e se sua mãe se atrever a te dizer palavras duras, eu entro em sua defesa.

Antes de responder, pensei: Como é estranho saber que meu avô, que já passou e aprendeu tanta coisa em uma época diferente, vendo coisas crescerem e morrerem, saiba que gostar alguém do mesmo sexo não é errado. Mas que, um homem como Robson ache isso um absurdo. O mundo realmente não tinha um padrão para tudo.

—Eu tenho medo. —Admito.

Olho apenas para as peças do tabuleiro. Movo à primeira enquanto falo, assim parece ser mais fácil porque não o encaro.

—Tenho medo. —Repito e por um momento as palavras sumiram da minha cabeça, tive que esperar um momento para saber se elas voltariam e voltaram. —Estão acontecendo coisas muito rápidas: primeiro nos mudamos, mudamos de escola, conheci pessoas diferentes e agora descobri isso sobre mim. Não posso fazer com que minha mãe saiba agora porque quero ter certeza; eu não quero decepcioná-la. Já não é suficiente ela ter que aturar Robson e Ian?

Nos Vemos à Meia-noite (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora