Capítulo Sete

168 26 2
                                    

— Licença. — Murmuro.

Passo por dois garotos altos que estavam conversando em frente ao portão da escola enquanto vários alunos tentam passar de algum jeito espremido ao lado deles. Quando passo por eles sinto o cheiro de perfume em excesso e, caramba, cigarro.

Esbarro em outro aluno enquanto caminhava. Hoje realmente não era um dia em que eu estava disposto, fiquei grande parte da noite pensando nas folhas que estavam sob meu colchão, remoí o assunto até ter dor de cabeça. Para completar ainda sonhei com as malditas folhas; mas não vale nenhum pouco a pena me lembrar desse sonho de novo. Não vou me lembrar.

— Me desculpe. — Digo.

— Ei — Ao olhar para cima percebo quem é — Como vai?

— Bem. Com sono. — Murmuro.

Pedro dá uma risada alta.

Nunca imaginei que ele fosse tão... social. Em específico comigo.

— Felipe disse o que aconteceu lá na sua casa. Doideira!

Que humilhante.

— Foi mal. — Digo e começo a andar em direção à sala.

Supus que Pedro fosse entender isso como um tchau-não-quero-conversar. Mas ele veio atrás de mim e começou a falar. Passávamos pelas pessoas nos corredores quase lotados e olhávamos para nós. De modo que não gostei que olhassem. Pedro devia estar no último ano, devia ter feito histórias nessa escola. Ele era considerado popular? Isso existia?

— Você está no primeiro ano?

— Segundo.

— Sério? — Ele estava chocado?

Assinto.

— É que você é... Baixinho e então eu pensei... — Ele coça a nuca. Troca um cumprimento de cabeça com outros alunos e depois diz: — Esquece.

Cheguei até a sala. Pedro se foi como fumaça.

Prefiro acreditar que não conversamos, era mais fácil apesar de lembrar que o simples fato da risada dele ter sido cômica.

Fui para o meu lugar.

Mas já tinha alguém nele.

— Bom dia. — Otávio sorri e levanta-se do meu lugar. Ele faz um floreio constrangedor para que eu me sente.

Mesmo havendo poucas pessoas — ninguém do seu grupo chegou, deve ser por isso que fiquei como última opção — eu ainda me senti constrangido de vê-lo tão de perto e de modo tão... Amigável? De perto consigo notar coisas que não notei quando levamos Felipe e Ian para casa; ele tem um pequeno sinal na bochecha esquerda, os olhos que achei serem escuros eram na verdade, claros e brilhantes. Ele também tem vestígios de uma barba, mas que ficou mal feita quando a tirou.

— Bom dia? — A entonação foi tão perceptível que fiquei, novamente, com vergonha. Mais se possível.

— Falei com Olivia.

— Você o quê?

Otávio crispa os lábios e dá uma risada nasal.

Sempre pensei que coisas assim fossem só feitas em filme, mas ele consegue muito bem.

— O que você disse?

— Nada de mais — Ele olha para a porta, a procura dela tenho certeza. Quando não a vê olha para mim e fala depressa — Eu não sei o que você quer falar com ela, mas disse que podia falar com ela se você a esperasse.

Eu realmente tinha que aprender a manter a boca fechada.

Joguei minha bolsa na cadeira e a abri. Mostrei o livro para ele: — Só quero conversar com ela porque quero saber se foi quem escreveu no livro. Tem iniciais O.M. só.

Ele puxa o livro da minha mão e examina a capa, balança a cabeça como se concordando com a vozinha da própria cabeça. As pessoas começam a entrar aos montes, vejo os amigos dele vindo à nossa direção... Não. Eles só veem aqui para chamá-lo, o lugar deles é no fundo da sala e não aqui.

Otávio me devolve o livro.

— Vejo você depois.

O grupo o levou como uma onda. Uma das garotas deu um oi para mim, a minha resposta foi o mexer inaudível dos lábios, não sei se ela achou que eu a ignorei. Sentei-me. Não tive coragem de abrir o livro e inicia-lo quando percebi que Olivia me encarava; nem mesmo quando a notei fazendo isso ela parou. Não consigo encarar as pessoas, nem mesmo quando elas não percebem. Abaixo o olhar para minha carteira rabiscada por outros alunos até que sinto — e ouço —uma agitação na carteira de trás. A voz de Otávio veio rouca, sussurrada e — odeio pensar que também veio —atraente demais.

— Em que página você está?

Confiro a página, demora mais do que esperei devido aos meus dedos trêmulos e pelo frio no estômago pelo susto. Pelo susto.

— Setenta.

Ele sorriu. Eu soube disso mesmo estando de costas para ele, encarando a parede branca à frente, eu só... sabia que ele tinha sorrido e que os pelos da minha nuca tinham se arrepiado quando pensei a respeito.

Se eu quiser sentir dor — sua voz estava mais baixa, mais rouca, mais tudo — acabaria lendo poesia, ou fazendo, para tornar tudo dolorosamente melhor.

Olho para baixo de novo, ainda assimilando as palavras. As mesmas palavras se encontravam na página setenta e um, um parágrafo em itálico.

— Como você...

— O.M., Otávio Mercúrio.

Merda! 

Nos Vemos à Meia-noite (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora