CAPÍTULO XIII

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Saíram da área reservada para festas e seguiram pelo espaço aberto em meio à uma multidão que se deslocava rumo à escadaria para encerrar a noite. Conversavam sobre os acontecimentos da festa e Anastasia estava especialmente elétrica e falante, atualizando os dois sobre tudo e todos. Aparentemente uma tal de Chloe havia rejeitado um pedido de casamento de um tal de Athenion e as más línguas diziam que era porque ela ainda nutria esperanças de que um dia o príncipe Calisto olharia para ela, mas Joe argumentou que poderia ser simplesmente uma decisão política, afinal, o homem rejeitado havia proposto que ela deixasse o senhorio de sua ilha e se unisse a ele em Eidon. Desse modo, o seu pai retornaria ao cargo e suas ilhas seriam unidas por uma forte aliança. Era uma ideia interessante, mas, o garoto não achava recompensante abandonar uma alta posição para se casar com um homem chato, mesmo que isso fosse uma inteligente estratégia de governo. A criada ponderou que talvez ela simplesmente fosse uma fiel devota de sua deusa patrona, Ártemis, e quisesse levar uma vida celibatária.

Melina questionou o porquê ela simplesmente não poderia casar e manter seu posto. Explicaram-lhe que cada ilha possuía uma certa independência e autonomia, então era proibido que dois senhores se casassem e mantivessem seu cargo. Um deles teria de abdicar para evitar que seus governos se unissem, formando uma potência possivelmente perigosa. Mas eles acabaram dando um jeito de contornar a lei, casando as famílias e se unindo não oficialmente. Como, por exemplo, Augustus, membro da antiga família soberana de Ilíakos, havia se casado com Agnes, senhora de Zoe. Assim ambas as ilhas se apoiavam mutuamente quando necessário, sem ser uma só.

Subiram algumas pequenas escadas e o chão estava repleto de pétalas de todo o tipo de flores e folhas. Sentia-se um tanto zonza, principalmente em meio a tantos degraus e Anastasia não parecia estar muito melhor do que ela. Felizmente, Joe estava ali evitando alguns tombos das duas e, estranhamente, aparentava uma certa sobriedade apesar de ser, de longe, o membro do trio que mais bebeu.

Para a tristeza dos pés cansados da princesa, os dormitórios ficavam no extremo oposto de onde estavam. Passaram ao lado do teatro e subiram mais lances de escadas até chegar à uma clássica construção, no formato de um templo, mas que descobriu que era usado como sala do trono. Duas grandes estátuas enfeitavam a porta do lugar e se viu obrigada a para e olhá-las, focando em uma em específico.

— Poseidon e Apolo, os dois deuses mais cultuados aqui — o rapaz disse e logo em seguida torceu o nariz. — Dionísio também, mas ele já tem uma escultura lá embaixo no teatro, não precisa de outra.

— Esses dois foram colocados em destaque pois são a perfeita representação do nosso povo — Anastasia explicou. — Poseidon é a nossa natureza. Selvagem, forte, misteriosa e indomável como o oceano. Apolo é tudo o que admiramos na terra. A arte, a música, a beleza, a racionalidade e a luz do sol. — Havia um profundo respeito sob as camadas da sua voz. — Nós viemos do mar, mas amamos o sol.

— Olha — Melina disse, sem tirar os olhos da imagem de seu pai —, eu realmente não acho que o mundo dos humanos seja tão admirável assim.

Não queria desiludi-la, mas era a verdade e pôde ver pelo canto do olho esquerdo que o rapaz ao seu lado acenou a cabeça em concordância.

— Eu sei que existem sérios problemas. Não sou tão ingênua assim — exprimiu, virando o rosto para a sua senhora, que a olhou de volta, e sorriu dizendo — Apenas gosto de focar nas coisas boas.

Deu um pulinho alegre e foi até a base de cada uma das estátuas, deu um beijo rápido em seus pés e se colocou em frente às duas, fez uma reverência puxando a saia de seu vestido para os lados com ambas as mãos e disse:

— Muito obrigada por me permitirem usufruir dessas pernas pelo tempo que eu quiser, sem superaquecer e desidratar como um golfinho encalhado.

Foi até Melina e tomou a ânfora de suas mãos, removeu a tampa, derramou um pouco de seu conteúdo sobre o chão de pedras brancas e o devolveu. O líquido vermelho alaranjado caiu evaporando ao tocar o solo e logo foi todo consumido.

O Legado do Sol • Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora