CAPÍTULO XXXVIII

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Calisto suspirou de alívio quando Chloe informou que seus pais haviam viajado para fora de Anamar, convenientemente, na noite anterior à chegada deles. Bem; à chegada dele. Mesmo que os dois já não morassem com a filha. Mesmo que não precisassem se encontrar com ele. Mesmo assim, preferiram não arriscar ter de cruzar o caminho do príncipe. 

Não poderia culpá-los. Na verdade, ficava feliz com a atitude deles. Sabia que eles não o abominavam, mas, novamente, mesmo assim, evitar desconforto era o melhor caminho. Só lamentava o fato de que as agradáveis noites em família haviam se transformado naquilo.

Fez questão de ignorar sua própria lamúria pelo resto da tarde. Particularmente, gostava de estar em Seliniakós. Ártemis era uma das poucas deusas que ainda respeitava. Não era nenhum sacrifício prestar culto à ela, na verdade, estava acostumado. Lucca sempre fora um fiel devoto da filha Zeus. Calisto sempre achou engraçado, desde criança, ver um rapaz adorando a deusa protetora das donzelas. Agora, destruiria meio mundo se fosse necessário, faria qualquer coisa para vê-lo exercendo sua vã religião outra vez. 

Conseguiu limpar um pouco a perturbação de sua mente quando chegaram em casa e Chloe o convidou para nadar. Como ele, era uma amante do silêncio das profundezas. Gostava de sair das barreiras e nadar em mar aberto. Dizia que era assim que as coisas deveriam ser. Julgava bela toda forma de vida selvagem, incluindo todas as estranhas criaturas abissais. 

Se Calisto tivesse que descrever Chloe com um único adjetivo, seria: confortável.

Sua presença era muito leve. Nunca incômoda. Até mesmo seu andar era suave. Sabia como cuidar das pessoas na medida certa, sem jamais ser invasiva. Sob circunstância nenhuma se mostrava irritante. Estava sempre presente, não como uma sombra perseguidora, e sim, como o ar que, de vez em quando, passa por você como uma brisa leve, apenas para lembrá-lo de que está ali.  

Estava deitado junto dela, sobre o chão frio, após voltarem do oceano, assistindo a lua e todas as estrelas que a cercavam, quando percebeu a presença de sua sobrinha se aproximando. Ela, ao ver que estavam só os dois ali, até tentou sair de fininho, mas já era tarde demais. 

— Posso ajudar? — perguntou Calisto, levantando as costas do piso, apoiando-se sobre os cotovelos. 

— Desculpa interromper. 

— Não interrompe — confortou-a Chloe. 

— Ah! — Ficou frustrada, julgando pela maneira inconsciente como deixou cair os ombros. — Eu só tava procurando minha mãe.

— Joseph foi treinar com a Agatha — ele respondeu. — Sua mãe deve estar com eles.

— Tenho uma sala de treinamento no segundo andar — indicou a dona da casa. — Assim que subir as escadas verá uma porta de correr à sua esquerda. 

— Entendi. Obrigada, gente! — sorriu, nervosa, e se retirou. 

— Como Cibele está lidando com o pequeno furacão ali? — apontou com o queixo para a porta por onde Melina saiu.

— Não está lidando. 

— Ela é uma boa mãe, vão se entender com o tempo. — Levantou do chão e sentou-se. — Apesar de parecer que ela dá mais ouvidos à você do que à Cibele.

— Jovens e adolescentes gostam de mim. — Balançou negativamente a cabeça. — Nunca entendi o porquê. 

— Não é como se você gostasse de socializar... — zombou. — Sempre achei que um dia você entraria em crise por morar naquele palácio cercado de tanta gente. 

— Talvez um dia... — riu. — Mas você deveria tentar adotar esse estilo de vida. Não precisa ficar tão solitária nessa casa enorme, sabia?

O Legado do Sol • Livro IOnde histórias criam vida. Descubra agora