Capítulo 27 - Camila (Parte II)

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O homem guardou a seringa no bolso e furtivamente, mas depressa, retirou-se do aposento. Quase paralisada, Camila deu pequenos passos em direção ao irmão cujas feições encontravam-se amorfas. A caçula tentou alcançar o botão de emergência, mas foi parada pela mão de Castel, em seu último sopro de vida, entregando-lhe o próprio aparelho celular.

- Escon... – Tentando inspirar minimamente o ar, Castel emitiu um ruído nefasto. – Esconda-se... fuja, Camila! Fuja!

A menina permaneceu atônita, paralisada. Desejava poder cessar a agonia do irmão, mas não podia; não conseguira, inclusive, deter o assassino que ceifara a vida de Castel.

Incapaz de sustar o sofrimento do irmão, Camila deixou o local, trépida.

"Abra espaço para a vítima

Porque estou chegando

Com o que eu quero dizer, mas

Isso vai doer

E eu amo a dor

Um solo fértil para o ódio"

Camila chegou à calçada do hospital amparando-se nas paredes atrás de si, sentindo um pavor imenso invadi-la. Segundo as últimas ordens do irmão, ela precisava escapar dali urgentemente. Correu até a um táxi disponível e o motorista deste preocupou-se, perguntando sobre o estado de saúde dela.

- Moça, está tudo bem com você?

- O senhor tem um aparelho celular?

- Tenho, claro. Pegue.

Apressadamente, Camila digitou o número de telefone da vizinha e foi atendida instantaneamente:

- Oi, é a Camila. Eu preciso que você me faça um favor. Mande seu marido até à minha casa e desemperre a única gaveta da mesa de costura da minha avó. Acolha ela em sua casa e guarde a pasta que vai encontrar na gaveta até que eu chegue, por favor. É uma situação urgente, eu preciso de sua ajuda.

Ao longo do caminho, Camila acalmou-se. Era perfeitamente perspicaz para entender o que ocorrera, agora precisava ser prática. Castel envolvera-se com alguém do meio político que não estava disposto a continuar, seja por amor ou ameaça, nas mãos de um jovem miserável e metido à alpinista social de Chiapas. Seu irmão fora vítima, provavelmente, de uma queima de arquivo.

Avisos não faltaram e isso fazia com que Camila sentisse raiva, rejeição pelo irmão. Perdera a única pessoa com quem podia contar no mundo e por puras ilusões da parte dele. Ela chegou a odiá-lo por anos antes de sentir tanta falta a ponto de deixar-se corroer.

"Lembre-se hoje

Eu não tenho nenhum respeito por você

E eu sinto sua falta, amor"

Provavelmente, a pessoa com quem Castel estava envolvido não sabia quem era Camila e a avó, mas certamente teriam conhecimento da casa em que eles moravam.

Em poucos meses, Camila tornou-se adulta e tomou as rédeas da própria vida. Órfã e com a responsável legal incapaz de responder por si própria e pela neta, Camila conseguiu emancipar-se e tratou de retirar imediatamente o sobrenome da mãe de seu registro civil, pois este era o único dado, além da existência da avó, a ligá-la a Castel, o irmão assassinado. Livrou-se do apartamento em seu nome o mais rápido que pôde, acumulou uma quantia vultosa e comprou à vista uma casa pequena em um bairro mais afastado de Tuxtla Gutiérrez.

Uma curva no destino (FINALIZADA)Onde histórias criam vida. Descubra agora