Os longos fios castanhos de Olivia estavam espalhados pelo chão do quarto. A mulher passava a mão pela cabeça tocando com a ponta dos dedos as saliências e depressões agora perceptíveis pela ausência de cabelos.
— Acho que ganhei essa cicatriz aos dez anos! — Olivia esboçou um pequeno sorriso ao traçar uma profunda marca em sua careca.
Lena e Ben se entreolharam, sem saber bem o que dizer.
Cerca de uma hora antes, ao despertar, Olivia encontrou um tufo de cabelo sobre o travesseiro e decidiu que estava na hora de "puxar o band-aid de sua ferida." Ela já vinha se preparando emocionalmente para esse efeito colateral da quimioterapia, e preferiu não adiar ainda mais o inevitável. Então, chamou seus dois filhos e os convenceu a rasparem sua cabeça.
Ben ainda segurava o barbeador elétrico em uma das mãos, mas Lena já havia colocado a tesoura sobre a penteadeira e, há alguns minutos, estavam calados, preocupados com a reação da mãe ao se ver pela primeira vez sem cabelo diante do espelho.
Para muitos pacientes em tratamento contra o câncer, aquele, talvez, fosse o passo definitivo de aceitação da doença, porque afetava diretamente a identidade, a imagem corporal do indivíduo e, para algumas mulheres, sua própria feminilidade.
Lena e Ben esperaram que, a qualquer instante, enquanto raspavam a cabeça de "O", ela fosse desmoronar e chorar ao ver o longo e bonito cabelo que exibiu desde a infância ceder espaço para uma careca de pele pálida e fina. Mas isso não aconteceu, ao contrário, Olivia parecia envolta por uma forte onda de serenidade por mais doloroso que fosse ter que aceitar a nova aparência imposta por sua doença.
— Mãe, o que você acha de comprarmos umas perucas e lenços de seda? — Lena tocou no ombro da mais velha, cruzando seu olhar com o de "O" no espelho da penteadeira.
Ben sorriu, aproximando-se das mulheres. Ele deixou o barbeador em cima da penteadeira e imitou o gesto da irmã.
— Sim, você vai ficar linda de turbante! — os olhos do rapaz brilharam com a ideia.
Olivia sorriu novamente e girou a cabeça de um lado para o outro, fixando seu olhar por alguns segundos, e alternadamente, nos filhos.
— Obrigada, meus queridos! — afagou ligeiramente a mão de Lena e Ben que repousavam em seus ombros e, pela primeira vez, permitiu que pequenas gotas caíssem de seus olhos. Mas não chorava pela perda dos cabelos... Chorava pela gratidão que sentia por ter seus filhos ali do lado, ajudando-a a enfrentar o processo sofrido e apavorante da terrível doença.
O momento emotivo também abalou os irmãos, e eles se curvaram para deixar afetuosos beijos na cabeça raspada da mãe. Olivia fechou os olhos brevemente ao receber o carinho e, quando tornou a abri-los, simplesmente disse: — Quero que o turbante seja azul para realçar a cor dos meus olhos! — os três sorriram juntos, emocionados.
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Lena trancou a porta e olhou para cima, recebendo os raios de sol no rosto, permitindo que eles a aquecessem. Tinha tomado café da manhã há pouco, na companhia da mãe e do irmão e, agora, iria em busca dos lenços de seda para que Ben pudesse fazer os turbantes.
— Bom dia, moça da casa ao lado — foi saudada por aquela voz suave e familiar.
Girou devagar a cabeça para a esquerda, encontrando a mulher de olhos intensos e azuis. Helen Reed lhe sorria abertamente. Estava encostada numa Harley-Davidson limpando as mãos num pano meio sujo de graxa.
Lena puxou o ar para os pulmões com força, sentindo-se repentinamente tensa. Ainda não conseguia reagir de forma descontraída perto de Helen Reed.
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Amonet [KarLena]
Science FictionPor possuir uma particularidade que a diferencia dos outros humanos, Kara Grant tenta se manter o mais reservada possível, evitando de todas as maneiras estabelecer vínculos duradouros com outras pessoas. Porém, numa manhã de segunda-feira, o destin...