Capítulo 21 - Eu sinto muito, Bonnie...

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(Londres, duas semanas depois...)


O ar na sala era melancólico. As coroas de flores, em tons de branco, rosa e lilás, colocadas sobre o ataúde, contrastavam com o ambiente de paredes monocromáticas. As feições das pessoas que ocupavam espaçadamente as fileiras de bancos de madeira, distribuídas em quatro pares de cada lado da sala, refletiam fielmente o clima triste e desolador do velório da mulher deitada no caixão. Ao lado do altar, havia um photo frame em um cavalete da moça de cabelos castanhos e bonitos traços que, no retrato, ostentava um sorriso feliz.

Ao ver a imagem, Dominique Renard sentiu um arrepio e engoliu em seco.

"Poderia ser eu!" — ela constatou, experimentando sentimentos antagônicos de alívio e remorso ao não controlar aquele pensamento.

Bonnie Davies, a moça que sorria feliz na foto ao lado do caixão, agora estava morta. Segundo a polícia londrina, ela havia se suicidado, embora nenhum bilhete de despedida tivesse sido encontrado no apartamento onde a médica morava com a noiva, Alicia Smith, na área de Parkside.

Dra. Alicia Smith, a noiva da falecida, permanecia inconsolável, sentada no primeiro banco, perto do ataúde. Ao lado da jovem loira, estava um senhor grisalho, e uma mulher de cabelos platinados, que tentavam reconfortar a devastada moça. Provavelmente eram seus pais.

Segundo os rumores do casal sentado na terceira fileira, à frente de Dominique, a Dra. Smith não concordou com a conclusão do inquérito policial sobre a morte de sua noiva. Ela não aceitava o suicídio como causa da morte de Bonnie. Dominique também ficara em dúvida sobre aquele desfecho. Principalmente depois de ter lido que Marcella Rizzi fora morta em "circunstâncias ainda não esclarecidas" no Brasil, e de descobrir, dias atrás, que Isabel Gutierrez permanecia em coma, após ter sido baleada por um atirador anônimo na Catalunha. Era coincidência demais que três mulheres, fisicamente idênticas a ela, estivessem morrendo e sendo baleadas aleatoriamente nas últimas semanas em lugares diferentes. Afinal, a própria Dominique escapara, há pouco mais de um mês, da perseguição indevida de um estranho, quando ainda estava em Paris:

Na ocasião, um homem de cabelos castanhos, olhos azuis, barba espessa e bem apessoado havia se aproximado de Dominique quando esta saía da empresa onde trabalhava. No primeiro momento, ele se apresentou como um turista canadense querendo saber sobre os horários de passeios de barco pelo Sena. Como a empresa onde Dominique trabalhava ficava perto do famoso rio parisiense, era uma situação banal pessoas a abordarem procurando aquele tipo de informação.

Por isso mesmo, ela foi atenciosa com o homem e o ajudou, explicando onde ele podia conseguir os ingressos para o passeio. Durante a conversação, o rapaz se mostrou realmente atento às instruções que ela dava. Ao fim da explicação, Dominique desejou boa sorte ao homem e se despediu, estava exausta e queria ir logo para casa, alimentar sua gata, que já devia estar com fome, afinal Petit ficara muito tempo sozinha. Naquele dia, Dominique tinha passado do horário de seu expediente tentando finalizar o projeto de um novo aplicativo para um dos clientes mais importantes da empresa.

Então, quando já tinha dado alguns passos, sentiu uma mão em seu ombro e ao virar-se, assustada, deparou-se novamente com o turista canadense. O instinto de preservação da menina que cresceu em um lugar hostil, onde precisava se esconder e evitar as atenções impróprias de alguns adultos, ou a perseguição cruel das crianças mais velhas, assumiu o controle e Dominique entrou em alerta, dirigindo ao homem, que havia lhe tocado sem sua permissão, um olhar rude.

— Você foi tão prestativa... — Ele começou, sorrindo de maneira gentil, falando um francês fluente e parecendo indiferente a postura tensa que a mulher adotara — Meu nome é Mike... Será que não poderíamos tomar um café juntos? Sabe, eu acabei de chegar do Canadá e ainda não tive a oportunidade de conhecer pessoas interessantes aqui! — seu tom era suave e os belos traços de seu rosto, aliados a maneira impecável como se vestia, significavam, para muitas pessoas que esbarrassem com ele na rua, que tratava-se de um homem bonito, charmoso e, via de regra, inofensivo.

Amonet [KarLena]Onde histórias criam vida. Descubra agora