Um homem bateu em minha porta e eu abri.
A vida era mais fácil quando eu contava essa música nas ruas do condomínio e brigava pela letra da minha futura namorada. Nunca entendi o porquê a gente nunca contava uma mulher bateu em minha porta.
– Isso nem ao menos cheira bem. - murmurei depois de por o projeto culinário que eu me arrisquei, mais uma vez, a fazer no prato.
Encarei aquilo por um bom tempo antes de criar coragem para por na boca.
– Eu, definitivamente, preciso contratar alguém pra cozinhar pra mim. - resmunguei me direcionando à pia com meu prato.
Cogitei, por um momento, voltar para a casa da minha mãe. Lá eu teria alguma coisa decente para comer todos os dias.
Mas eu nunca faria isso.Demiti a minha última funcionária há pouco menos de uma semana. Achar alguém competente não é fácil, as pessoas são folgadas e eu não gosto de fazer entrevistas... elas são tediosas.
Revirei os olhos assim que a campainha tocou. Quem é que visita alguém em plena hora de almoço?
Atravessei a cozinha pra chegar até a porta de entrada e atender quem quer que fosse enquanto tentava maquiar minha expressão antipática.
– O que deseja? - encarei a mulher que havia tocado minha campainha em horário impróprio. Seu rosto enrubesceu.
– Oi, senhor. Desculpe te incomodar eu só precisava de um pouco de comida. -
O frio parecia cortar suas bochechas e ela usava um casaco velho enorme mas não descruzava os braços. Fiz o mesmo quando uma brisa mais forte atingiu meu corpo.Os olhos dela não se levantaram para me encarar mas ela não parecia estar envergonhada. Talvez estivesse acostumada a pedir comida por aí. Encarei-a por alguns segundos.
Droga.
Quando a gente quer fazer caridade a caridade fica de mal da gente.
Eu até queria dar a ela o que comer, não sou do tipo que nega comida aos necessitados, eu ainda quero um lugar no céu ou seja lá onde, mas não poderia dar a ela o que eu tinha. Aquilo estava ruim demais até para um mendigo.
– Eu adoraria te dar o que comer mas não sou bom em cozinhar, melhor seria se eu pagasse a você para me fazer algo descente para comer. - sorri de lado.
Sua cabeça se levantou de modo receoso e seus olhos brilharam. Você fez merda, pude ouvir claramente a minha consciência gritar.
– O senhor está falando sério? Eu posso cozinhar.
Me senti um estúpido por ter dado esperanças a ela. Como deixar uma estranha entrar na minha casa para fazer a minha comida? Isso não me pareceu uma coisa sensata a ser feita.
Abri a boca para dar uma desculpa qualquer quando ouvi um resmungo infantil sair da direção dela. Ela balançou um pouco o corpo e fez um chiar com os lábios. Havia um bebê em seus braços.
– Tudo bem, entre.
Minha mente me xingava de todos os nomes feios existentes no mundo mas meu coração me confortava dizendo que esse ato de bondade iria me deixar um pouco mais próximo de chegar perto de Deus. Espero não estar cometendo uma loucura muito louca.
– O que o senhor gostaria de comer? - sua voz soou baixa.
– Qualquer coisa que dê para engolir de modo prazeroso me fará feliz. - ela me encarou e tenho certeza que me achou um idiota, mas não disse nada.