– Como você cresceu!
Miguel sorria para minha mãe que o segurava acima da cabeça como se ele fosse um mapa a ser desvendado contra a luz.
– Vai me contar toda a história ou eu devo fingir que sei de tudo e apenas seguir o roteiro que sua mãe me passou?
Olhei papai que estava sentado ao meu lado, um pouco mais afastados das mulheres que permaneciam do outro lado da sala. Ponderei minhas opções.
1. Contar toda a história para meu pai levaria bastante tempo e força de vontade.
2. Contar parte da história, a parte que eu achar relevante, vai levar um bom esforço para podar as arestas sem que deixe brechas para questionamentos futuros.
3. Deixar ele agir de acordo com o roteiro da minha mãe.
– Qual é o roteiro da mamãe? - soltou um riso divertido antes de por a mão esquerda sobre meu ombro.
– Eu ainda quero saber a verdadeira história. - passou por mim.
- E eu ainda quero saber qual foi o roteiro. - murmurei me virando a tempo de vê-lo se inclinar sobre o corpo de minha mãe para brincar com o bebê em seus braços.
Desde que eu fui para a faculdade tenho visto meu pai como alguém mais agradável. Ele gosta de estar rodeado de pessoas e, desde que Aaliyah teve o primeiro filho, passou a gostar mais de crianças do que o costume. Acho que passou a gostar mais delas quando eu cresci, na verdade.
Me aproximei deles para ouvir a conversa.
– Eu amo bolo de cenoura! - papai sorriu para Camila que o olhou com expectativa. – Adoraria provar o seu.
Um fato curioso é que minha mãe sempre teve meu pai no centro de suas mãos. Como se ele fosse um maquinario que ela — e somente ela — soubesse operar. Meu pai nunca gostou de bolo de cenoura, sempre disse que legumes, frutas e bolos não se misturam.
Camila me olhou e sorriu logo seguindo para a cozinha. Foi buscar o bolo.
– Prometi que não iria perguntar - meu pai começou. – mas eu preciso. - mamãe o repreendeu com o olhar. – Eu preciso saber de onde essa garota surgiu.
– Aparentemente, do nada. - Maia soltou olhando para o nada.
– Isso não é muito autoexplicativo, querida. - zombou e ela deu de ombros.
– Maia sabe tanto quanto você, pai.
– Pois então trate de me fazer saber mais que ela. - me olhou sério.
– O que você quer saber? - rangi.
– Amor. - mamãe tentou impedi-lo.
– Quero saber tudo. - fez uma pausa dramática que ninguém ousou interromper. Camila está demorando demais com esse bolo. – Quero saber que tipo de pessoa você colocou dentro da sua casa, quem é sua admitia e como ela conseguiu, finalmente, balançar o seu coração. - lançou um olhar em direção à minha mãe. Ele sempre acredita nela. - Acredite, filho. - sua voz ficou branda de repente e eu pude ouvir um traço de ternura. – Os Mendes não tem um histórico muito comum para romances.
– Não há romance, pai.
– Pois bem, admita quando quiser. Você é muito igual a mim, garoto!
Garoto. Ele sempre me chamou assim.
– Espero que gostem. - Camila surgiu com a bandeja nas mãos cheias de pedaços de bolo perfeitamente cortados e postos em pratos separados.
Miguel gritou em animação. Acho que ele nunca esteve triste, sempre está com seus gritinhos e ruídos contentes para espantar todo mal-humor.