Edmond está sentado com as pernas esticadas na minha direção, as costas grudadas na parede enquanto ele leva uma maçã escarlate até a boca. O som da mordida reverbera dentro de meus ouvidos ainda sonolentos.
— Ninguém te ensinou que é falta de educação zombar da altura dos outros? — Arranco a pétala com a outra mão, atirando o insulto contra o seu rosto.
Sarcasmo distorce a face serena enquanto ele engole o pedaço da maçã.
— Acho que perdemos essas aulas juntos, não?
Edmond me joga um pomo rubro como o sangue que uma vez sujou minhas mãos na floresta, e meus dedos se dobram ao redor da fruta vermelha.
— Eu só estava revidando. — Mordo a maçã com um ruído alto. — Acho que perdemos o fim da festa — acrescento.
— Veuria pode nos perdoar — ronrona ele. — Participamos da comemoração por pelo menos umas cinco horas antes de eu te atrair para a toca do lobo, ninguém vai ficar bravo com a gente.
Isso é verdade.
Nós ficamos no campo por horas, presenteando a aniversariante com buquês de flores exuberantes e jogando conversa fora, ouvindo as histórias da jornada com sorrisos abertos, já que Veuria contava cada detalhe com tanta empolgação e orgulho.
Estávamos presentes cantando e dançando e falando, ela não vai nos dar uma bronca por isso quando voltarmos.
Pluvia, por outro lado... É bom poder ficar longe das perguntas perigosas que ela faz questão de proferir. Tenho a sensação constante de que ela sequer piscou durante a noite, ponderando sobre a faca e minhas ações estranhas desde que cheguei no mundo dos refugiados.
— Quão estranho é eu estar com uma pontada de ciúmes... de um desenho meu? — Edmond pergunta.
Só então percebo o caderno aberto em seu colo.
Ele vira as páginas com seu rosto retratado, observando cada rabisco com os olhos atentos.
— Não mais estranho que isto — digo, colocando o dedo em seu peito.
Edmond cai como um pato, olhando para baixo para tentar acompanhar meu dedo. Consigo ver a ficha caindo em um olhar surpreso no momento em que ele observa minha mão subindo até seu queixo com um golpe brincalhão.
— Golpe baixo — ele reclama.
Apenas sorrio e estalo a língua no céu da boca antes de morder a maçã, saboreando a carne pálida sob a casca sangrenta.
— Quero que me ensine a nadar — digo, em alto e bom tom.
A idéia surgiu entre os delírios da madrugada, enquanto eu olhava para os cristais e me lembrava das milhares de vezes em que quase me afoguei. Fiquei remoendo a questão por horas e horas de rabiscos e, agora, finalmente tenho coragem para pedir.
A água já me ameaçou vezes demais, é a minha vez de aprender a me defender.
Se eu não o fizer, vai haver um dia em que ninguém vai estar por perto para escutar meus gritos, e me recuso a pensar nisso por muito tempo.
Edmond me encara confuso, a maçã inerte na mão direita.
— Assim? Do nada?
— Não vou ter sempre alguém para me salvar. E mesmo que tenha, odeio a idéia de depender dos outros para sobreviver.
— Você não precisa de ninguém para sobreviver, Cisna.
Reviro os olhos, mordendo minha maçã.
— Todos precisamos, ninguém sobrevive sozinho. Mas aprender a nadar é essencial, e pode me ajudar futuramente.
— Certo. — É tudo o que ele responde.
Ainda não me decidi se gosto ou não do sorriso sombrio que molda seus lábios.
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Crimson Hauntings and Oath Shadows - CHAOS (Concluído)
FantasyPLÁGIO É CRIME (ART. 184 DO CÓDIGO PENAL). CRIE SUA PRÓPRIA HISTÓRIA UTILIZANDO SUA CRIATIVIDADE. caso saiba de qualquer cópia de trechos ou mesmo da minha história completa, por favor, me avise e denuncie! Portas secretas não levam a becos se...