CHAPTER THIRTY FIVE, AVAR

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      — Posso saber o motivo de tanto esforço? — indago, deslizando as mãos por seus pulsos e me virando

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      — Posso saber o motivo de tanto esforço? — indago, deslizando as mãos por seus pulsos e me virando.
      O luar contorna o rosto de Edmond com nuances claros, marcando ainda mais o maxilar afiado, e fazendo seu cabelo parecer um conjunto de estrelas cintilantes. Preciso parar por um momento, dando permissão para que meus olhos afundem no vislumbre dourado sob a luz mais pálida.
      — Acredite ou não, essa foi a parte mais fácil — diz ele, acariciando minha bochecha com os dedos cálidos.
      Empurro meu rosto contra a mão quente, pele contra pele, os olhos fechados por um breve instante reconfortante.
      — Está tentando me impressionar? — ronrono.
      Edmond segura meu rosto com as duas mãos, beijando o topo de minha cabeça antes de apoiar o queixo no mesmo lugar, e começar a deslizar os dedos por entre os fios rebeldes que escapam de minha trança.
      — Talvez. Mas você sempre desvenda minhas surpresas antes do planejado, então acho que isso dificulta um pouco as coisas para mim.
      — Não é exatamente uma surpresa, quando se sabe para onde está indo — retruco, e meus dedos roçam a gola alta de seu suéter.
      Ele sorri, um sorriso malicioso que se espalha pelo rosto e reivindica os olhos verdes.
      — E para onde estamos indo, querida?
      — Para o nosso lugar — respondo, simplesmente. — Não estamos longe, e eu te conheço bem o bastante para antecipar algumas coisas.
      Edmond parece perder a resposta que tinha na ponta da língua, como se ela houvesse escorregado e sumido além dos próprios lábios.
      — Você é mais esperta do que eu pensava, e te odeio por isso.
      — Eu chutei, idiota. Você se entregou sozinho.
      Os olhos cerrados me fuzilam com uma intensidade que arranca uma risada de minha garganta, enquanto ele aperta os lábios em um biquinho irritadiço, olhando para o alto com as sobrancelhas erguidas como se estivesse sendo obrigado a admitir seu escorregão.
      — Isso só te faz ainda mais esperta.
      Não recuo quando seu braço desliza pelas minhas costas, roçando minha espinha e me levantando como se eu não pesasse nada. Apenas me ajusto a ele, enterrando meu nariz em seu peito conforme sou carregada a passos vagarosos. Minhas botas parecem ficar mais pesadas em meus pés.
      — Não vai me ouvir reclamar hoje — murmuro, os olhos semiabertos. — Estou tão cansada que poderia dormir agora mesmo.
      Ele ri, e sinto seu peito subindo e descendo sob a palma de minha mão.
      — Se isso for te deixar menos desolada, eu gostei da estátua.
      — Então ficará decepcionado, pois o coiote virou churrasco um pouco antes de minha retirada.
      Por um momento, o som da risada grave inunda meus ouvidos como um sedativo, me fazendo ficar ainda mais sonolenta. Quando fecho os olhos, não me dou ao trabalho de perceber os segundos ou minutos, mas conto os passos de Edmond conforme ele me leva para o nosso lugar na floresta, até a lembrança ressurgir em minha mente com um beliscão fantasma.
      — Você os viu? — Minha voz não passa de um sussurro pausado, mas ele sabe sobre o que estou falando, posso ver ao levantar o queixo, encontrando os olhos que agora parecem perdidos.
      — Não — admite. — Não os vi. Niore comentou sobre o que aconteceria na cerimônia, enquanto ainda estávamos na enfermaria. Foi um motivo a mais para me manter longe.
      — Pensei que tivesse saído porque não aguentava mais olhar para a minha cara — murmuro.
      — Ah, isso também.
      Sem muito esforço, dou um tapa em seu ombro, tão fraco que sequer sinto o golpe ser desferido.
      — Você deve estar cansada mesmo — Edmond debocha, rindo de minha tentativa miserável de bater nele.
      Então, repito o movimento, com mais força desta vez. Sei que o tapa não lhe causa dor, mas ele faz questão de fingir uma expressão abalada, acompanhada por um olhar cerrado que transborda ironia.
      — Talvez não esteja tão cansada para andar, afinal. — Sinto as mãos cálidas se afrouxarem sob minhas pernas, e me encolho com o braço ancorado ao redor de seu pescoço.
      — Não ouse me colocar no chão. — A frase sai mais como uma súplica que como uma ameaça.
      — Vai ter que fazer melhor do que me ameaçar.
      Ele não parece surpreso quando meus dedos se enroscam na gola do suéter verde-musgo, o puxando para mais perto e quase fazendo-o perder o equilíbrio. Mas não ouço nenhuma reclamação sair de sua boca enquanto o beijo.
      — Idiota — sussurro contra seus lábios, com um sorriso largo nos meus.
      — Juro que te deixo andar com as próprias pernas se não se comportar. — Apesar do aviso, ele não é capaz de segurar um riso rouco.
      — Você não faria isso — digo, seguindo seu olhar até alguns pontos luminosos que aguardam metros à frente.
      Edmond emite um estalo com a língua.
      — Preciso de algo para te chantagear, não?
      Quando ele me carrega através de uma cortina esguia de heras, cujos ramos de folhas pontudas despontam dos galhos de uma árvore, os pontos cintilantes na escuridão se encaixam em minha visão como um todo. Velas. Acesas, de todos os tamanhos e cores, espalhadas pelo carvalho velho como pequenas chamas vivas.
      Mas as velas não são a decoração mais drástica. Sobre os galhos mais grossos do carvalho inclinado, alguns metros acima do chão de folhas acobreadas e raízes desenterradas, me deparo com uma base de madeira com camadas de cobertores macios e travesseiros de plumas. Uma cama que, de alguma forma, ele construiu entre os galhos da árvore, e a idéia de confiar em seus dons como engenheiro me faz estremecer.
      — Pensei que você iria querer algumas horas de descanso, depois de ter dado a alma na construção daquela fogueira.
      — Sabe que ainda é apenas humano, não sabe? — pergunto, andando na direção do carvalho, para os galhos mais baixos que fazem o papel de degraus pelo tronco curvado e retorcido da árvore velha. — Quero dizer, basta um escorregão para você cair e quebrar o pescoço...
      Edmond desaba em uma risada.
      — Ninguém vai cair. Confie em mim. — O sorriso em seu rosto me diz para fazer o contrário. — Eu passei a tarde toda me certificando de que tudo seria perfeito. Podemos assistir as estrelas, ou simplesmente dormir, mas eu lhe garanto que não vamos cair.
      — Você não precisava ter feito tudo isso — murmuro, em pé sobre um dos galhos mais baixos, logo acima da entrada escura no tronco do carvalho. — Só a sua companhia já é suficiente. Além de que, provavelmente, o sono me derrubará antes que eu tenha a chance de nomear uma estrela.
      Edmond chuta uma pedra, sorrindo ao começar a escalar os galhos, desviando das velas cujas chamas dançam ao mínimo indício de vento enquanto me oferece a mão direita em um convite.
      — Venha — pede. Os olhos verdes refletem a luz dourada das velas ao nosso redor. — É seguro.
      — Promete? — hesito.
      — Juro. — Ele agarra minha mão, os dedos cálidos apertando os meus conforme Edmond me puxa para cima.
      Diante das camadas macias de cobertores que me convidam silenciosamente, hesito por um segundo, antes de Edmond me erguer com um sorriso malicioso nos lábios, me trazendo para a plataforma de madeira. Quando meus pés tocam os travesseiros e mantas espalhados pela cama ao ar livre, eu espero. Espero pelo som da madeira se quebrando, por um sinal de que a estrutura irá desabar. Mas nada acontece. Nenhum estalo.
      — Eu disse. — Ele chuta algumas plumas e tecidos para um dos cantos, se acomodando com naturalidade no meio do lugar.
      — Ainda não sei se posso confiar nessa coisa — murmuro. Contudo, me sento próxima à um dos galhos que contornam a plataforma pequena, cobrindo os joelhos com um cobertor de estrelas que conheço muito bem.
      — Eu passei o dia todo tornando isso seguro, Cisna — responde ele, dando batidinhas no chão, mas as camadas suaves de plumas e tecidos abafam o som, e impedem que sua mão toque a madeira.
      — E se o galho não aguentar? — insisto.
      — São três galhos. Cada um mais largo que nós dois juntos!
      Relutante, arrasto-me para mais perto dele, mergulhando os dedos no travesseiro em que repouso minha cabeça.
      — Se eu morrer hoje, juro que volto para te assombrar — sussurro, apertando a gola do suéter verde-musgo, que mais parece um cinza esverdeado na iluminação fraca.
      Como resposta, Edmond se aproxima ainda mais, a mão deslizando pela curva de minha cintura.
      — Se você cair, eu também caio — observa. — Acho que assombraremos um ao outro. — Ele tomba a cabeça para o lado, apontando para o céu noturno com o queixo. — Faça um pedido.
      Então sigo o olhar de jade, bem a tempo de capturar a flecha flamejante que desponta gloriosa, cortando estrelas e repartindo o céu indistinto como se fosse uma pintura sendo rasgada ao meio. A estrela cadente traça um caminho reto sobre nós, disparando para o oeste com sua cauda cintilante, e desaparecendo de minha visão ao ser encoberta pelos galhos parcialmente desnudos do carvalho acobreado.
      Sequer tenho tempo de pensar em um pedido. Mas, mesmo enxergando apenas a memória turva da cauda luminosa que seguia o ponto dourado, fecho os olhos com a primeira coisa que desperta em minha mente.
      — O que você pediu? — Sua voz é um sussurro rouco.
      Deixo o peso de minha cabeça a tombar na sua direção, encontrando refúgio nos olhos profundos. Com a iluminação fraca das velas espalhadas pelos galhos, cercando a cama na árvore apesar das camadas de tecidos que podem causar um incêndio, as orbitas de Edmond parecem vazias com as sombras que dançam sobre o rosto perfeito.
      — Eu pedi... — as palavras escapam de minha boca, se condensando em nada além de respiração e pensamentos confusos que fervilham dentro de mim. — Eu pedi...
      Há um silêncio pesado que nos consome enquanto nossos olhos se engolem. Meus pensamentos se fundem em idéias vagas, congeladas e afiadas, uma bagunça que sou incapaz de organizar. Pela primeira vez em meses, não tenho medo de machucá-lo. Não tenho medo de perdê-lo. E isso me atinge com um tremor gélido, pois finalmente estamos sozinhos. Sozinhos de verdade, sem qualquer fantasma de guerra me pressionando contra as paredes de minha própria cela.
      Meu coração parece se encolher quando Edmond pisca pesadamente, apertando os lábios em uma linha fina que faz minha boca secar.
      — Acho que você deveria descansar.
      Um trovão retumba ao longe. O som agudo de uma tempestade que está para chegar, me forçando a deixar que a euforia que cresce dentro de mim se desfaça conforme ele me cobre com o seu cobertor, tocando meus ombros como se eu fosse quebrar ao mínimo contato. Como se eu fosse de vidro, mas não soubesse cortar.

Crimson Hauntings and Oath Shadows - CHAOS (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora