2. do you wanna know?

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A noite estava fria. 

Senti a pele das minhas bochechas queimarem à medida que o vento gelado as atingia. 

Liam está parado à minha direita, olhando para cima, observando os letreiros em neon que piscam. O analiso de canto de olho.

Liam tem segurado as pontas quando as coisas parecem estarem pesadas demais para mim. Liam foi o único amigo que sobreviveu ao meu casamento. Ele sabia que eu nem sempre poderia estar presente, mas nunca questionou minha validade como amigo. 

Quando sai de casa foi para ele que liguei. Foi ele quem me acompanhou até a casa dos meus pais para contá-los. Foi a mão dele que apertou meu ombro quando recebi os papéis do divórcio. Foi ele quem me assistiu chorar até dormir. Foi no colo dele que eu desabei, na maioria dos dias.

Liam é o melhor parceiro que eu tive, desde a faculdade. Compartilhamos a sala, os trabalhos, as notas, os primeiros estágios, as primeiras decepções, e uma finitude de momentos que foram só nossos. 

Me pego em devaneio, sentindo admiração e carinho pelo meu melhor amigo que nem percebo quando seu olhar cai sobre mim. 

ㅡ Harry? ㅡ Ele me chama fazendo uma careta. Provavelmente estou o encarando a muito tempo. ㅡ Está tudo bem?

Eu pigarreio desviando o olhar e tento recuperar minha lucidez. 

ㅡ Sim. ㅡ Eu digo. ㅡ Está tudo bem. ㅡ Ajeito minha jaqueta, passando as mãos que suam por ela, apesar do frio que me atinge. 

ㅡ Tem certeza?

ㅡ Sim. ㅡ Eu o olho sorrindo. ㅡ Só sou grato por ter você, Liam. Talvez nunca tenha te dito isso, mas sinto isso todos os dias. Obrigado! 

Ele me olha estranho por minha revelação repentina em frente a um pub de muros pretos, com letreiros brilhantes que dizem "Malik's pub". Seu sorriso, porém, se abre, e ele me abraça com carinho, sem dizer absolutamente nada. 

Mas a gente sabe…

A gente sempre sabe. 

O pub é um reflexo de sua fachada. Escuro, com paredes pintadas de preto, porém lotado de luzes que cintilam por todo o ambiente. Bancos de madeiras rodeando todo o balcão que vai de fora a fora. Uma aura bem sombria e impura rodeia todo o lugar, e eu poderia dizer que já estou arrependido, se não fosse pela mão de Liam em meu ombro, dando um leve aperto, me certificando que ele está ali. 

ㅡ Acho que precisamos de uma bebida. ㅡ Ele me puxa pelo braço até o balcão. 

Luzes em tom de azul-cobalto e verdejante piscam através dos meus olhos. Me sinto um pouco zonzo. Uma música toca ao fundo.

Eu observo o ambiente, com os olhos estreitados. Ouço quando Liam pede a um dos barman que está vestido com uma camisa preta e jaqueta de couro ㅡ todos estão na verdade ㅡ duas Cubas-libre. Aceno para o rapaz e lhe entrego a comanda.

Já estamos na segunda dose quando um rapaz moreno, de olhos amendoados cor de âmbar se aproxima sorrindo.

ㅡ Payne! ㅡ Ele exclama um tanto charmoso, se aproximando perigosamente de Liam, que se vira e sorri o mais largo que já o vi sorrir em bastante tempo.

ㅡ Malik! ㅡ Liam responde, e pelo seu tom de voz percebo que ele está realmente empolgado em ver esse sujeito. ㅡ Quanto tempo!

Liam nunca havia mencionado ele para mim, apenas hoje mais cedo quando me convenceu a acompanhá-lo, e se limitou a dizer que estudaram juntos no ensino médio. Mas conhecendo Liam, e tendo em vista sua sexualidade, aposto que foram mais do que colegas de sala.

ㅡ Esse é Harry. ㅡ Diz Liam, apontando para mim. ㅡ Meu melhor amigo.

ㅡ Prazer, Harry! ㅡ Ele me estende a mão simpático e eu a aperto sorrindo. ㅡ Pode me chamar de Zayn.

ㅡ Olá, Zayn.

Percebo a troca de olhares discretas como um tsunami. Liam está batucando o indicador na calça, sinal claro da sua ansiedade, que na sua maioria ataca quando está próximo a homens bonitos ㅡ que diga-se de passagem, é o caso.

A beleza de Zayn chega a doer.

Suas sobrancelhas grossas, seus olhos redondos e grandes cobertos por uma camada grossa de cílios longos, sua boca desenhada por algum deus do Olimpo, sua postura ereta e jovial, sua pele morena lustrosa.

Entendo o fato de Liam estar batucando os dedos, eu também estaria.

ㅡ Fico feliz que tenham vindo para a inauguração. O que posso oferecer de bebida em cortesia a um velho amigo e a seu amigo? ㅡ Sua voz sai maliciosa, e eu lanço um olhar para Liam que me retribui com um olhar de: não me faça perguntas, Harry. Não agora.

ㅡ Estamos bebendo Cuba-libre. ㅡ Liam limpa a garganta. ㅡ Acho melhor não misturarmos. ㅡ Ele solta uma risada bizarramente falsa e calculada.

Definitivamente ele está flertando.

ㅡ Certo. ㅡ Zayn dá as costas apenas para se comunicar com o barman, e se virar com dois copos cheios em mão. ㅡ Por conta da casa. ㅡ Ele me entrega um dos copos, e ao entregar o de Liam, ele solta uma piscadela em direção a ele.

ㅡ Obrigado! ㅡ Liam diz corado, e eu murmuro um obrigado logo em seguida.

Sei que poderá parecer uma indelicadeza de minha parte fazer a comparação que estou prestes a fazer, mas Liam e Zayn parece dois gatos brigando no telhado, que ficam miando um para o outro por minutos e não se atacam.

Parte de mim implora para que eles se peguem logo para que eu possa parar de forçar sorrisinhos de dois em dois minutos fingindo estar interessado e enturmado na conversa. Mas parte de mim, não quer que isso aconteça, porque sei que passarei o resto da noite sozinho, olhando para a pista que está ficando cada vez mais cheia.

ㅡ Liam… ㅡ Digo, por fim. ㅡ Vou dar uma volta.

Não aguardo resposta, apenas sou sugado pela multidão que se aglomera próximo a pista. King's of Leon toca, tenho quase certeza que se trata de Sex on Fire.

Fico travado de primeira, mas me permito fechar os olhos e balançar meu corpo, e quando vejo já estou dançando, como se a maldita pista fosse minha. Tenho flashes claros piscando por detrás de minhas pálpebras, e sorrio largo. Em anos eu não me sentia assim: livre.

Quando a música termina, e eu finalmente abro meus olhos, sinto meus poros dilatando pelo calor repentino.

Meu sorriso, porém, começa a sumir aos poucos, ao observar minha figura ser analisada por olhos extremamente azuis que estão parados a poucos metros de mim.

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