7. places we won't walk

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Chego ao hospital desnorteado. Liam me explica durante o caminho, que Gemma havia ligado para ele, pedindo que ele me buscasse. Gemma sabe que não sei lidar com situações emergenciais, e provavelmente surtaria sozinho.

Liam me acompanha pelos corredores brancos e gelados. Sinto um arrepio no fundo da espinha. Hospitais são a cura e o fim. O acalento e o desconforto. Onde muitos nascem, e tantos outros morrem. Sinto minha respiração começar a ficar desregulada com esse pensamento e Liam ㅡ como se soubesse por telepatia ㅡ  segura a minha mão.

Encontro Gemma sentada em uma cadeira em frente ao quarto. Reparo em seu semblante e parece calmo. Respiro um pouco mais aliviado. Ela me vê e se levanta.

ㅡ Hazz! ㅡ Ela me abraça e encaixa o rosto na curva do meu pescoço. ㅡ Eu fiquei tão assustada. Foi tudo tão rápido.

ㅡ Como ela está? ㅡ Pergunto apressado e nervoso. Afastando o corpo de Gemma para a olhar.

ㅡ Ela está bem. Eu e o papai percebemos a tempo. Ela começou a falar embolado, e metade do rosto paralisou. Ligamos para a emergência e ela está bem. Só não sabemos se ficará alguma sequela.

Sinto um nó se formar em minha garganta.

ㅡ Sequela?

ㅡ Não vai ser nada, Harry. ㅡ Liam diz ao meu lado. ㅡ Anne tem uma saúde de ferro. Ela vai se recuperar perfeitamente bem.

Ele me oferece um sorriso e Gemma assente.

ㅡ Os médicos estão lá dentro com ela e com o papai. Já já liberam para você ver ela. Ela está falando normal e está lúcida.

O aperto porém, não abandona meu coração. Sinto como se algo estivesse o esmagando pouco a pouco. Me sento ao lado de Gemma e Liam se oferece para buscar uma água.

Apesar de Gemma ser uma dentista bem sucedida, ela nunca quis sair de casa. Nunca se sucumbiu a ideia de ter sua própria independência, e eu nunca estive tão grato por isso quanto hoje.

Aguardo atentamente até que Liam volta com o copo d'água e a porta se abre. Minha mãe está deitada na cama e meu pai ao lado dela. Ela sorri e eu não consigo conter as lágrimas. Me aproximo e a abraço com carinho.

ㅡ Oi mãe. ㅡ Eu digo com a voz trêmula.

ㅡ Oi filho. ㅡ Ela diz, e eu finalmente respiro aliviado.

O médico informa que os primeiros exames que foram feitos não indicam nenhum prejuízo motor, mas que devido às circunstâncias será necessário fazer fisioterapia, e estimulação cognitiva para evitar qualquer dano. Além de ter um acompanhamento de perto pelos próximos anos a fim de evitar um possível novo avc. Eles também pretendem fazer exames de vista, já que minha mãe reclamou de um mínimo borrão no olho esquerdo. Eles nos tranquilizam e eu relaxo um pouco mais.

Quando os médicos estão prestes a sair da sala, ouvimos batidas na porta, ela se abre logo em seguida revelando Ethan.

Que diabos ele está fazendo aqui? Houve um tempo que eu não poderia vê-lo, mas agora, estando de frente a ele, posso perceber que não sinto mais nada.

Ethan é apenas um estranho que eu conheço muito bem.

ㅡ O que ele está fazendo aqui? ㅡ Liam cochicha perto da minha orelha e eu dou os ombros sem saber ao certo.

ㅡ Oi minha sogra. Vim ver como você está. ㅡ Ele entra na sala sorrindo, trazendo um mini buquê de gardênias em mãos.

Sinto vontade de vomitar pelo o apelido, e deixo isso transparecer em minha face. Liam pigarreia e tosse, soltando um "ex" quase inaudível.

Ele se aproxima da minha mãe, e deposita um beijo em sua bochecha, colocando o arranjo brega na mesa de canto.

ㅡ Oi Ethan! Que bom que veio. ㅡ Ela diz soando simpática. Gostaria de ter essa habilidade.

ㅡ Anne, você nos deu um susto e tanto. Gemma me mandou mensagem e eu vim correndo vê-la.

Fuzilo Gemma com o olhar. Sinto um ódio repentino. Ethan pode ter sido um bom genro e um bom cunhado. Mas a partir do momento que o nosso casamento acaba, ele deixa de ser essas coisas e passa a ser apenas um conhecido. A família precisa aprender a cortar os laços também.

ㅡ Na verdade… ㅡ ela diz me olhando, como se tentasse se justificar. ㅡ eu apenas respondi sua mensagem, Ethan.

Ele sorri sem graça, e finalmente me olha. Ele me cede um sorriso, mas eu permaneço intacto. Me levanto e vou até a porta.

ㅡ Vou buscar algo para comer, não tive tempo de tomar café. Eu já volto, mamãe.

Vou para o corredor e começo a caminhar. Meus pensamentos voltam para Louis. Sinto uma coisa estranha. Eu imaginei que ele ao menos fosse se despedir, mesmo que não quisesse algo. Eu entendia que era apenas sexo casual, e o fato de termos dormido juntos não mudava isso. Sinto meu braço ser puxado e paro de andar.

ㅡ Harry. ㅡ Ethan diz sem fôlego. ㅡ Oi!

ㅡ Oi. ㅡ Respondo seco, olhando para a sua mão presa em meu braço. Ele percebe e me solta.

ㅡ Será que posso te acompanhar? Preciso conversar com você. ㅡ Sua voz está trêmula, diferente da voz que eu ouvi antes do divórcio.

ㅡ Não sei o que temos para conversar, Ethan. Tudo que tínhamos em pendência já foi resolvido.

ㅡ De verdade. É importante. Podemos tomar café juntos na lanchonete do hospital?

O olho buscando algo em seu olhar, e não encontro. Eu não conheço mais esse homem. Ele pisca algumas vezes e eu aceno com a cabeça.

Permanecemos em silêncio durante todo o caminho. Ele pede um expresso, e eu um café com leite. Nos sentamos de frente um para o outro e ele beberica o café antes de me olhar.

ㅡ Eu suponho que você não tenha visto o seu celular hoje. ㅡ Ele começa dizendo e eu busco o meu celular no bolso. O destravo e vejo que há uma mensagem de Liam e uma de Ethan.

Abro a de Liamam primeiro, que diz apenas:

"Estou passando na sua casa."

Em seguida abro a de Ethan:

"Estou com saudades do meu marido.
Beijos, Ethan."

ㅡ Que porra é essa? ㅡ Eu volto a fita-lo com as sobrancelhas franzidas.

ㅡ Eu acho que nós nos precipitamos com o divórcio, Harry. Eu estava uma pilha de nervos, e você não estava colaborando.

O olho em total descrença e me levanto da cadeira imediatamente. O problema do imbecil, é que ele sempre tentará colocar a culpa dos próprios erros em alguém.

ㅡ Ethan, minha mãe está internada, acabou de sofrer a porra de um AVC e você quer falar do nosso divórcio? E insinuando que eu tive culpa por você ser um completo babaca?

ㅡ Harry… ㅡ Ele tenta mas eu o interrompo.

ㅡ Não estou disposto a ter essa conversa nesse momento, Ethan. Acho melhor você ir. Prefiro ficar com a minha família agora.

O segundo problema do imbecil é que ele se faz de bom moço. Talvez se eu não o conhecesse, facilmente compraria o teatro que ele está fazendo agora, de cabeça baixa e olhos tristonhos.

ㅡ Tudo bem. ㅡ Ele diz com a voz baixa. ㅡ Você pode almoçar comigo qualquer dia desses?

ㅡ Ethan, acho melhor… ㅡ É a vez dele me interromper.

ㅡ Por favor, Harry. É importante.

Aceno com a cabeça, e dou as costas. Ethan não me deixará em paz até me ver novamente. Talvez esse seja o preço a pagar por ter aceitado tão inconsequentemente aquela merda de pedido de casamento.

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