Chaveiro

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Santana acordou antes de seu despertador tocar e seu subconsciente já focava aos poucos nos olhos azuis, atraindo-a para eles antes mesmo de seus olhos os focarem em sua frente. Seu coração começou a dar batidas irregulares com o pensamento e mesmo se achando uma doida, maluca, emocionada e todos os adjetivos possíveis para sua reação, sua maior vontade era subir os degraus do ônibus e olhar a garota loira que dias atrás roubou-lhe o ar por segundos.
Saiu as pressas do apartamento seguindo para o ponto de ônibus, onde o veículo não demorou nem cinco minutos para aparecer na rua e ela dar sinal. A cada passo que dava para dentro do veículo, seu coração batia mais forte, como um soco em seu peito, até seus olhos avistarem o sorriso e olhar de Brittany. Sua mais nova amiga, Britt.
Os sorrisos eram genuínos e o calor que emanava em reciprocidade, mostrou a Santana que Brittany também estava feliz ao vê-la ali, sentando ao seu lado. Nenhuma das duas desviaram o olhar nem por um segundo.
 
- Bom dia, Britt.
 
- Bom dia San...
 
- Então esse é meu apelido? San? – A morena questionou Brittany dando um sorrisinho que mal mostrava os dentes.
 
- Pra você ver o quão péssima e sem criatividade eu sou – Brittany sorriu um tanto tímida, mexendo nos cabelos, jogando para trás.
 
- Você é a única que chamou sim. – Os olhos castanhos focaram mais uma vez os azuis – Normalmente é Sant, Sannie, mas apenas San, é a primeira vez. Eu... Eu gostei. – Santana terminou de falar sorrindo com os olhos e Brittany sentiu o estômago revirar, um tanto boba por ter acertado com sua amiga.
 
- Ótimo, somos únicas então nos apelidos.
 
- Com certeza, Britt...
 
A viagem seguiu  tranquila, ambas as amigas falaram uma coisa ou outra sobre os bairros que moravam e Santana soube o nome do bairro que Brittany vivia e não gostava. Assim como também soube do amor de Santana por chaveiros e a outra soube do amor de Brittany por artigos de papelaria, dos mais variados tipos. Se despediram com olhares cúmplices e um: Te vejo mais tarde, tão genuíno que pareciam ter sentimentos uma pela outra há décadas. Brittany sentia o peito encher de alegria por estar fazendo uma amiga, principalmente uma amiga que entendia seu amor pelas coisas mais bobas, como uma caneta que ela ganhou do pai e nunca usou, pelo simples medo de acabar a tinta e ela permanecer sem utilidade. Santana entendia cada ponto que Brittany dizia, e via sua enorme vontade se ser maior do que era, porque ela era imensa, mas parecia aprisionada. Assim como entendia que assim como ela, Brittany também não era muito tagarela pela manhã, e devido a isso, não dava tantos detalhes da sua vida, falando apenas o básico e ela deveria sentir a emoção que emanava dos seus olhos e em seu tom. E isso era fácil para Santana. Santana conseguia sentir Brittany.
A tarde, após o longo e árduo dia de trabalho, elas se encontraram na volta para a casa e Brittany a olhou cheia de carinho, sorrindo em sua direção.
 
- Dia difícil San? – Brittany notou o cansaço pelo olhar que Santana lhe deu, sua estafa era nítida a loira.
 
- Exaustivo – confessou – Minha cara está tão péssima assim que já denunciou isso?
 
- Seus olhos me disseram – E Santana a olhou com mais exatidão, como se aquilo não fosse possível, e antes que abrisse a boca para questionar, lhe foi cortado as palavras – Só não pergunte como eu sei – a loira deu de ombros – Eu apenas sei. – e calou-se, como se conhecesse Santana a vida inteira.
 
- Ok, bizarro... mas, esse foi o jeito mais gentil para dizer que estou péssima- Santana sorriu - meu olhar cansado e as olheiras me entregaram.
 
- Não foi a olheira, eu não reparei nelas, foi só o seu jeito de olhar. – Brittany estava sendo sincera. Ela sequer havia olhado as olheiras que permanecia abaixo dos olhos castanhos, isso era apenas algo a mais.
 
- Tudo bem. E você, estava trabalhando também?
 
- Sim, eu dou aula de dança em uma academia no bairro ao lado do ponto em que você desce.
 
- E gosta do que faz? Gosta de ser professora de dança?
 
Brittany não esperava por aquela pergunta, ninguém nunca a havia perguntado se ela gostava do que fazia. Mesmo amando dançar e já tendo ganhado prêmios, ser professora e amar dançar, eram duas coisas bem diferentes. Você pode amar algo mas não ter paciência para fazer com que o outro aprenda seu amor por aquilo. Ensinar alguém é uma tarefa difícil, só se consegue isso com muito amor, dedicação e paciência. E Brittany tinha de sobra tudo isso pela dança, pelo ritmo e pela música que a conectava a todo o contexto. Lembrou-se do dia que contou a Mike quando havia conseguido seu emprego, o primeiro e único até o momento, e a primeira pergunta do marido foi: Quanto irão te pagar por isso?. Ao contrário de Mike, Santana lhe perguntou sobre se gostava ou não, algo sobre ela e isso explodiu seu coração em sorrisos.
 
- Eu amo ser professora de dança. Eu amo ensinar.
 
Santana sentiu nas palavras e expressão de Brittany o amor pela profissão que ela não tinha pela dela. Ela era grata por seu emprego, em meio a multidão que não tem nada, mas amor, amor não. Santana tinha o sonho de ser psicóloga, esse sim era seu amor, desde sempre. Quando Dani se formou, Santana achou que seria sua tão sonhada vez em começar a faculdade, já que ajudou a garota a se formar, mas o cenário mudou a forma e Dani exigiu ainda mais dela para pagar as contas, e sozinha, ela não conseguia pagar a faculdade, nem os gastos que aquilo iria trazer. Seu sonho foi guardado na gaveta assim que argumentou com a companheira e ela só afirmou sobre seus compromissos com o aluguel do apartamento e contas como: luz, internet, água, comida e etc, falando apenas um: Agora não dá amor, você sabe, fora que eu preciso fazer minha pós.
 
- Eu sou péssima dançarina, Britt, mas tenho vontade de aprender um dia. Gosto de como a dança torna o outro mais sensual.
 
- Posso ser sua professora quando quiser – sorriram juntas – mesmo que isso signifique você pisar no meu pé.
 
- Eu espero, do fundo do meu coração, não pisar, Britt... – Seus olhos se encaixaram, como uma peça de quebra cabeça exata, e suas pupilas dançaram em plena harmonia – Não quero te machucar.
 
- Não irá, acredite. – ambas sorriram. E Brittany olhou para a mochila de Santana após o sacolejar do ônibus balançando seus chaveiros e lembrou-se do que tinha na bolsa. Especificamente na hora do almoço, a loira havia ido a lojinha de bugigangas ao lado da academia e notou os chaveiros pendurados próximo do balcão, lembrando-se de Santana em instantâneo, comprando um para dar de presente – Tenho uma coisa para você. – Se limitou a dizer e Santana logo mudou sua expressão para curiosa, arregalando um pouquinho os olhos – é simples, nada demais, porém, me lembrou você. – E tirou um chaveiro em formato de gato, com cores mesclados que ao apertar a barriga, seus olhos acendiam, como uma lanterna.
 
- Nossa Britt... esse é o chaveiros mais perfeito que eu já ganhei – Santana estava realmente feliz com aquele chaveiro, era realmente o mais legal, nenhum dos seus acendiam luz, e nenhum foi dado por Brittany. Seu sorriso abriu como o sol em um início de manhã e suas covinhas formaram-se em seu rosto, fazendo Brittany soltar um suspiro bobo, antes de seus lábios acompanharem o mesmo sorriso da outra. Aquele sorriso lindo. – Você me deixou eufórica. – Era assim que Santana se sentia ao lado de Brittany, até mesmo sem o chaveiro, como se fogos de artifício explodissem em seu coração. – Obrigada Britt-Britt, ele é perfeito. Vou colocá-lo desse lado, nos especiais. – e ela o pendurou aonde tinha poucos chaveiros, do lado esquerdo da mochila.
 
- Fico feliz que tenha gostado San, fiquei quase a metade do meu almoço escolhendo um que combinasse com você. E esse me pareceu ideal.
 
- Pareço um gato? – Aquela dúvida surgiu a sua cabeça e ao pensar alto, acabou se expressando mais alto ainda.
 
- Sim, mas não no contexto errado da palavra, como “você é uma gatinha “ , referente a beleza. Quer dizer, você é bonita, mas eu pensei no sentido de expressão, como os gatos se expressão, e você é bem expressiva. Você pela manhã não gosta muito de conversar, apenas de ouvir música, e pela tarde, já gosta. Você é de momentos e se expressa sem precisar dizer muito. Além de ser perceptiva em tudo, e os gatos são assim. E eu amo gatos.
 
- Uau, você realmente enxergou tudo isso em mim? Simples assim?
 
- Não foi “simples assim” – a imitou, ganhando um sorriso em retorno – É só como eu consigo te enxergar através do olhar.
 
Santana não tinha nem palavras para continuar aquele assunto, pois ela sentia Brittany da mesma forma. Brittany para Santana era como as ondas do mar, fortes e precisas, e quando era necessário, normalmente durante a manhã, calma e leve. Brittany e seu olhar, era uma imensidão no qual Santana queria mergulhar o mais profundo que fosse.  O encontro no ônibus a tarde foi ao máximo proveitoso para ambas e elas se despediram com pesar, após chegar o ponto da morena.
 
- Te vejo amanhã San?
 
- Sim. Até amanhã, Britt.
 
- Até amanhã, San. – sorriram.

Destinos Cruzados [REESCREVENDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora