Capítulo trinta e um - Raízes e coragem.

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Catarina

— Oi, meu amor? — Escuto uma voz doce um tanto familiar. A voz de uma pessoa querida que há anos não havia visto. 

Abro meus olhos percebendo a presença da minha mãe com seus curtos cabelos negros, um sorriso caloroso que mostra todos os seus alinhados dentes brancos. De repente, vejo uma mão encostar em seu ombro, em seguida, meu pai aparece sorrindo ao seu lado. Sento percebendo que estava deitada no enorme tapete de retalhos com tiras de tecido rosa, azul, preto e branco que ficava no meio da sala de estar da casa dos meus pais. Lembro que Ricky e eu costumávamos dormir neste tapete quando assistíamos os filmes durante a tarde. Olho justamente para o lado esquerdo e o vejo deitado, ele abre seus olhos e acorda sentando-se quase de imediato. Somos dois adultos fazendo coisas que costumávamos fazer quando crianças, mas como isso aconteceu?, questiono-me mentalemente.

— A canjica de vocês está em cima da mesa. — Diz minha mãe.

— Sua mãe deixou o caldeirão no fogão para quem quisesse rapar — Meu pai levanta as sobrancelhas animado.—, mas tenham cuidado porque está quente.

— Opa!— Ricky praticamente pula do tapete ficando em pé. Lembro que ele fazia isso com frequência, ele sempre queria apostar corrida comigo quando tínhamos sete anos, mas agora somos evidentemente dois adultos.— Vou me adiantar, antes que a chata aqui decida dar uma de braba e queira comer o que é meu. —  ele se apressa até o banheiro, enquanto eu continuo no mesmo lugar tentando entender a situação.

Primeiro, minha mãe, depois  meu pai e por fim, Ricky. Como posso estar diante da minha família em um lugar que tanto me trouxe boas recordações? Olho para a janela e vejo entrar os raios alaranjados do "sol das quatro horas", era assim que eu e meu irmão costumávamos chamar quando acordavamos com a luz ofuscando nossos olhos. Tudo era tão bom e longe de todos os problemas que a vida adulta nós proporciona, apenas tranquilidade e paz. 

Fecho meus olhos ao sentir o cheiro da canjica exalar em minhas narinas, deixando-me com água na boca. Me recordo da época em que saboreávamos o doce gosto da canjica, começávamos no mês de abril até  junho, que seria o mês de comemorar o São João. Todos os dias nossa mãe fazia vários pratos dessa deliciosa comida de milho, tanto para vender, quanto para o consumo de casa. Apesar de sentir muita falta de tudo que me leva aos braços dos meus pais e as lembranças de onde vim, não me recordo de fazer isso depois de ter saído de casa aos 18 anos para estudar no Rio de Janeiro.

Abro meus olhos.

— O que está acontecendo? — Indago olhando confusa para meus pais.— Porque vocês não estão mais comigo? Porque me abandonaram? O que eu fiz foi tão ruim assim a ponto de todos vocês me deixarem?— Disparo várias perguntas ainda sem saber o que está acontecendo.

Meus pais se entreolham, meu irmão saí da cozinha com o caldeirão na mão e segurando uma colher em sua boca. As sobrancelhas de Ricky se juntam, mostrando sua raiva. Não seria preciso ser um gênio para saber que eu sou o motivo de sua fúria.

— Você não está feliz em estar em casa com sua família? Nós tiramos você das mãos daquele homem que só te faz sofrer. — Diz minha mãe com os olhos marejados.

— Pelo jeito, ela quer voltar para ele. — Ricky se aproxima mais de mim.— Você não me escutou! Você não escutou nosso pai. Não vê que você magoou várias pessoas quando decidiu escolher ele do que as pessoas que você amava? Você nem mesmo se escolheu.

Todos me olham com tristeza. Meu pai abraça minha mãe que começa a chorar. Ricky coloca a mão sobre as costas da nossa mãe no intuito de conforta-la, mas conforta-la de que?. O que eu fiz para deixa-los decepcionados a esse ponto? questiono-me confusa mentalmente. Abraço minhas pernas encolhida no tapete. Meu Deus! O que está acontecendo? Eu daria tudo para voltar ao passado e voltar a viver bem e feliz com a minha família. Certo que tínhamos pouco, mas eramos felizes.

—  SE NÃO QUER ESTAR CONOSCO, VOLTE PARA ELE. VÁ EMBORA! — Diz Ricky em voz alta. — ACORDA PARA VIDA CATARINA, ELE NUNCA TE AMOU. E AS PESSOAS QUE VOCÊ PERDEU POR CAUSA DAQUELE HOMEM, NUNCA MAIS VÃO VOLTAR.

— ACORDA PARA VIDA! ACORDA PARA VIDA! ACORDA PARA VIDA! — Repetem em couro. 

Lagrimas começam a surgir dos meus olhos. Minha cabeça dói de tanto ao escutar que eu tenho que acordar para vida. Sinto meu corpo suar e um calor tomar conta de mim, juntamente com meu coração que bate cade vez mais forte deixando minha boca cada vez mais seca. Tento respirar, mas parece que o ar me falta a cada vez que puxo para os meus pulmões.

— ACORDA PARA VIDA CATARINA! — Ricky fala mais alto.

Além da voz do meu irmão, escuto um som de uma porta se abrindo bruscamente. Todos olhamos para a porta de entrada da nossa casa assustados, e de repente, uma luz forte entra tomando de conta de tudo. 

Abro meus olhos assustada me dando de conta que tudo não passou de um sonho, me deparo com uma luz forte em um lugar escuro e desconhecido. Olho para frente e vejo Benjamin em cima de mim o que torna tudo um pesadelo ainda maior. Estamos deitados em caixas de madeira repleta de fenos. Me mexo para os lados no intuito de tirar este homem asquerosa de cima de mim, mas logo percebo que estou com os braços e pernas amordaçados apenas de lingerie.

Me viro novamente para a luz e vejo Rosa sair de dentro do carro que ilumina o ambiente. Benjamin sai de pressa de cima de mim, ficando em pé, em seguida, ele saca uma arma da cintura e aponta na direção de Rosa.

Meus olhos se abrem assustados ao presenciar novamente este homem armado, querendo machucar as pessoas somente pelo seu interesse sexual.

Rosa Levanta os braços caminhando em passos lentos na direção de Benjamin, do outro lado do carro, surgir Marcelo um pouco barbudo e com traços mais senis.

— Benjamin, eu não estou aqui para te machucar — Diz Rosa calmamente com as sobrancelhas levantadas. —, apesar de você ser um miserável, desgraçado...

— Isso não está ajudando. — Marcelo sussurra para Rosa.

E os dois continuam caminhando na direção de Benjamin calmante.

— Enfim, você não precisa sequestrar mulheres para...— Ela olha para mim com os olhos arregalados, mas em questão de segundos tenta manter novamente a normalidade e volta a olhar para Benjamin. — para ficar com elas. Você não precisa disso! Olha você, um homem gostoso que qualquer uma sentava.

Marcelo e Rosa param bem em frente a Benjamin. Rosa baixa os braços tranquilamente, enquanto Marcelo continua de mãos para cima.

— Não precisamos disso. — Rosa pega na arma me fazendo arregalar mais os olhos com sua ousadia. Ela vai morrer, esse homem não têm o mínimo de sanidade.

— Sempre admirei a sua ousadia Rosa — Benjamin sorrir de lado. —, mas há tempos que você não me serve de nada.

Benjamin puxa o cão da arma para trás. Rapidamente, Marcelo pula para cima de Benjamin e entra em uma luta corporal. Rosa também pula para cima de Benjamin no intuito de tirar a arma da mão dele.

Olho para o lado ao escutar a porta do carro abrir, logo vejo Maria Luiza saindo de dentro mais sendo puxada por Ian e Valentina. Volto a me debater e tento falar para todos entrarem, mas continuo com a boca amordaçada.

No exata momento que volto a ver a briga, Benjamin acerta o rosto de Marcelo com o cabo da arma, fazendo-o cair desacordado para o lado. Benjamin e Rosa levantam rapidamente e continuam brigando pela posse da maldita arma.

— Eu preciso ajudar Rosa! — Exclama Maria Luiza tentando escapar do carro.

— Mãe isso não para...

Um tiro ecoa pelo galpão, o silêncio toma de conta de todos, escutamos apenas sons de vários pássaros batendo as asas e voando daqui. Parece que o tempo parou. Eu, Maria Luiza, Ian e Valentina estamos vidrados em Benjamin e Rosa. A arma cai sobre o solo de barro.

Uma poça de sangue começa a se formar sobre os pés dos dois, até que ambos caem ao mesmo tempo de joelhos no chão frente-a-frente.

Um Acordo Entre Amantes (Editando)Onde histórias criam vida. Descubra agora