Existiam dois ramos da família Santini: um deles era um grupo de imigrantes, que no final do século XIX atravessaram o oceano rumo ao Brasil, a fim de trabalhar nas lavouras de café no interior de São Paulo.
O outro grupo permaneceu na Itália, amealhando fortunas e se unindo aos ricos na época do império, escapando até mesmo dos destroços da I Guerra Mundial, até entrar em conflito com o ditador fascista Mussolini, tudo porque os Santini italianos costumavam empregar funcionários judeus – perseguidos pelo governo. Para evitar a própria morte, o roubo de sua fortuna e a perda do poder, o patriarca da família criminosa Santini fugiu justamente para o Brasil, onde encontrou seu primo, Paolo Santini, agora um cafeicultor.
O primo brasileiro gostava de plantar café, mas o italiano, Alfredo, era um homem mais urbano, e preferiu ficar na cidade grande. Por isso, com o dinheiro que ele conseguiu levar da Itália para o Brasil, Alfredo Santini abriu o seu primeiro hotel no Rio de Janeiro, que ele chamou simplesmente de Santini Hotel.
Seu filho, Mauro, percebeu que existia uma oportunidade para fazer o dinheiro e os recursos crescerem ainda mais naquela terra, e transformou hotéis simples e sem luxos, que funcionavam apenas como pouso de viajantes e pessoas na cidade a trabalho, em resorts confortáveis destinados aos ricos e famosos. Foi daí que surgiu o Grand Santini Hotel, que fez a fortuna da família se multiplicar.
Ao mesmo tempo, para que eles conseguissem construir os resorts ansiados, algumas ações pouco morais eram necessárias: ameaças, roubo de terras, acordos com bandidos locais – para depois eles serem subjugados pelos Santini, mais poderosos e com maior poder de fogo.
Contudo, nos anos seguintes, outras famílias criminosas – fugindo da Itália falida no pós-guerra – souberam que o velho Don Santini e seu herdeiro Mauro haviam enriquecido no Brasil; e logo todos estavam vivendo e disputando espaço e poder no mesmo lugar, o Rio de Janeiro. Foi daí que começou a primeira fase da guerra entre as máfias; no final, os Santini amealharam ainda mais fortunas, usando os hotéis como fachada para esconder as suas reais atividades criminosas: venda e tráfico de armas, jogos de azar, e apostas esportivas.
Ao contrário de outros mafiosos, Mauro Santini não queria mexer com o tráfico de drogas; era uma área muito mais complexa e perigosa. Já os Bacchi, recém-chegados da Itália, de péssima relação com os Santini, decidiram que o tráfico era uma atividade que poderia fazê-los enriquecer mais rapidamente. Uma parte dos Bacchi seguiu nessa linha, enquanto a outra preferiu ficar ao lado de Santini, que já conhecia as rotas e formas mais seguras de ganhar dinheiro sem chamar a atenção das autoridades. A partir daí, os Bacchi tiveram a primazia em terem seus filhos e filhas escolhidos para casar com os filhos e netos de Mauro Santini.
Com o passar dos anos, outras famílias, reconhecendo o poderio de Mauro, começaram a orbitar em torno dele - que logo fez moradia em Salvador, na Bahia, longe das disputas de poder contra a parte da família Bacchi ligada ao tráfico de drogas. Assim, Santini juntou-se aos Agnelli, uma família siciliana que já vivia no Brasil há muito tempo, completamente acostumada aos costumes brasileiros, e até mesmo com casamento entre italianos e brasileiros; os Bertinelli, em sua maioria advogados; além de uma união estratégica com os Aquino. Eles tinham alguma ascendência italiana, mas eram mafiosos brasileiros: o chefe deles, Ivan Aquino pai, também comandava jogos de azar e tráfico de armas, mas o foco dele era contrabando de produtos, para repassar aos mercados populares e camelôs nas capitais nordestinas.
Já os Santini eram mais fechados em seus casamentos e relações com membros da famiglia. Era muito raro alguém de fora da máfia, sem relação nem com Santini nem com os Bacchi e outras famílias importantes, entrar na organização e ser uma figura de impacto. Apenas uma vez, Vittorio Santini, já o chefe de tudo após a morte repentina de seu pai, Patricio, decidiu ignorar as ordens já ditas de maneira tácita por sua família durante tantos anos, e colocou dentro de sua empresa oficializada, além de situá-lo nas questões importantes da máfia, o contador Régis Gonçalves.
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Glacial
RomanceCAPÍTULOS TODAS AS QUARTAS Vittorio Santini é um homem frio como gelo, calculista e tão temido quanto odiado. Um mafioso violento, escondido sob a fachada de empresário de uma rede de hotéis na Bahia, acredita ser capaz de controlar tudo - até o di...