CAPÍTULO 37

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O sol já ia alto e Peter continuava dormindo. Charlotte saiu do banho, se vestiu e vendo que não parecia que ele acordaria, foi a cozinha.
A geladeira estava abarrotada de carne e ela resolveu fazer um bife. Estava se acostumando com isso, comer um bife enorme de manhã. Ela sorriu. É claro que se devia a fome que dava transar a noite toda.
"Bom dia." Vengeance disse. Ele se serviu de café e se sentou na bancada.
"Faz um pra mim também?" Ele pediu.
"Claro, Ven." Ela virou a carne, tirou da panela, pôs num prato e deu a ele.
Ele começou a comer e Charlotte colocou outro bife na frigideira.
"A senhora Melvis está muito feliz aqui. Ela está na casa de Valiant que é a casa que tem a cozinha maior. Quase toda a Reserva está indo comer lá hoje."
Charlotte nem tinha se lembrado que seu tio insistiu em trazer Mary, Amber e a senhora Melvis para a Reserva. Ela esteve tão preocupada com a indecisão de Peter que nem viu seu tio no dia anterior.
"Eu disse a Peter que talvez fosse melhor vocês todos ficarem aqui mais uns dias. Estamos com uma pista de Max Hunter, se o encontrarmos será seguro para ficarmos em Nova York. O que você acha?"
Ela se sentiu otimista, mas não podia perder muitas aulas.
"Tenho de estar na faculdade na segunda que vem. Não posso perder as aulas." E ainda havia a empresa. Seu tio podia resolver as coisas a distância, Christy estava lá por ele, mas ela, por trabalhar no setor de criação, não.
Vengeance a olhou por um tempo, até que os olhos azuis gelados dele a incomodaram e ela baixou os olhos.
"Sabe, eu nunca pensei que fosse me arrepender de ter ido atrás de você para salvar Amy. Mas ver o quanto você é egoísta, teimosa e mimada me faz me arrepender de ter dado ouvidos a minha intuição. Peter estaria melhor com alguém que não coloca uma porra de um curso que inclusive pode ser feito a distância ou um trabalho de brincadeira, pois todos dizem que se você não fosse sobrinha do dono não teria capacidade de estar na função que está, acima da vida dele. Se Max o pegar, ele o matará. Simples assim. Mas você parece achar que suas aulas são mais importantes. E..."
Um rosnado foi ouvido e ela se virou na direção do corredor que levava aos quartos. Peter, completamente nu, estava parado com os punhos cerrados.
"Não fale assim com ela!" Ele disse. Seus olhos estavam estranhos, vermelhos e suas iris estavam quase transparentes. Ele parecia...
"Filhote. Alguém tem que colocar um pouco de juízo nessa cabeça oca dela. Infelizmente eu sou o único com coragem para isso." Vengeance falou tranquilamente. Ele pôs uma garfada de carne na boca e mastigou calmamente.
"Você não tem o direito de se intrometer! Nem de falar assim com ela!" Peter deu os passos necessários para ficar diante de seu pai.
"Peter, deixa pra lá, por favor." Ela pediu. Se eles brigassem ela ficaria péssima.
"Vá se vestir, Peter. Vem comigo."
Ele parecia que não a enxergava. Seus olhos não saiam do seu pai.
"Filhote, se não descansar, sua visão demorará a voltar, acredite em mim, eu já passei por isso. Não quer ver o rosto dela? Os olhos azuis, se maravilhar com o brilho vermelho do cabelo dela?" Ele suspirou.
"Eu..."
Vengeance se levantou e o abraçou. Ele descansou a cabeça no ombro do pai, fechando os olhos com força.
"Isso. Não abra os olhos. A doutora Trisha virá daqui a pouco. Vista-se ou vai dar motivo pra Slade chutar a sua bunda."
Peter se voltou e entrou no quarto. Charlotte olhava tudo aquilo sem entender direito.
"O que aconteceu com os olhos dele?"
Ela estava tremendo. Peter estaria mesmo cego?
"Stress. Ele tomou uma surra de Pride, me viu quase matar Valiant, teve uma visão que ofuscou sua mente. Ele precisa de descanso. Trisha vai aplicar uma das drogas de Gabriel nele, pois eu nunca fiquei tanto tempo sem enxergar assim. Vamos torcer para dar certo."
Meu Deus! Ele poderia continuar cego? Charlotte começou a ver que as coisas estavam mais sérias do que ela pensava.
"Pai, estou com fome." Peter voltou a sala. Ele  tinha vestido uma calça de moletom e estava com os olhos fechados.
"Certo. Vou fazer alguma coisa." Vengeance disse abrindo a geladeira.
Ele fritou um bife e colocou num prato na bancada. Peter se sentou na banqueta e começou a comer como se estivesse tudo bem. Ele parecia enxergar tudo a sua volta.
Depois de comer, ele se levantou e saiu da cozinha. Lá fora, ela o viu se sentar na cadeira, na varanda, através da janela. Ele estava a ignorando, mas por quê?
"Dê espaço a ele. Você já está tirando-o do lugar onde ele se sente amado e querido, acho que pode deixar ele se recuperar." Vengeance disse.
Charlotte saiu da cabana. Peter continuou sentado como se não estivesse se importando se ela estava ali ou não. Ela começou a andar pela estrada. Acharia alguma casa se andasse na trilha. Aí podia pedir uma carona até a casa de Amy.
As palavras de Vengeance machucaram. Ele a chamou de egoísta, teimosa e mimada. Ela só queria viver sua vida da maneira que ela achava que devia viver, tomar suas próprias decisões. O que havia de mal nisso?
"O que faz aqui andando sozinha pela estrada, na direção da zona Selvagem? Não tem medo de os machos acharem que você está procurando companhia?"
A voz zombeteira de Torrent a alcançou, mas ela não o viu. Charlotte se virou, olhou para um lado e para o outro, mas nem sinal dele.
"Tão fácil! Vocês, humanos, não olham pra cima mesmo, né?"
Ele desceu da árvore onde estava com um pulo. Outro Nova Espécie também desceu de outra árvore e ainda havia um em outra árvore, mas ele não desceu, ao invés pulou em outro galho e daí por diante até desaparecer da vista dela.
"Charlie, como está? Esse é Leo." Ela já o tinha visto. "
Ele era tão grande e forte como Valiant, a diferença entre eles é que ele era loiro. Seus olhos eram verdes. Ele se aproximou e inspirou bem forte.
"Hunter está bem entranhado em você. Isso é bom, você pode andar sem se preocupar com os outros. Torrent, não demore."
Ele deu um salto, se pendurou num galho, girou sobre ele e se lançou em outra árvore.
"Você tem que ir?"
Ele sorriu.
"Conversar com uma fêmea bonita." Ele abriu uma mão, imitando uma balança." Ajudar Leo e Blue no parto de uma leoa arisca" Ele fez a outra mão de balança." Só se eu fosse um idiota." Dito isso ele se sentou num tronco caído.
"Pode falar, embora eu posso resolver seu problema, é só você ficar comigo, e esquecer dele."
Ela se sentou ao lado dele e pôs a cabeça em seu ombro forte.
"Eu teria que ficar aqui?" Ela perguntou.
"Ah, entendi. O bundão não quer ir pra cidade grande."
"Sabe, Vengeance disse que ia, depois resolveu ficar, aí tudo rolou ladeira abaixo. Agora, ele disse que devemos ficar por segurança. Eu tenho aulas, não posso jogar tudo o que já estudei, já me esforcei por água abaixo."
"Você não pode perder umas poucas semanas?" Ele perguntou.
"Sim, eu posso, mas e se não forem poucas semanas?"
"E se vocês forem e Max matar vocês?"
Ela fechou os olhos.
"Vengeance me chamou de egoísta, teimosa e mimada."
Ele balançou a cabeça. Parecia concordar com Vengeance.
"Você concorda com ele?"
Torrent fixou seus olhos azuis escuros nela. O centro dos olhos dele era de um azul mais claro. Charlotte se sentiu apanhada.
"Isso não chega a ser um insulto e você sabe. Somos diferentes, Charlie. Durante muito tempo, achamos que o vínculo entre companheiros era o mais forte, e até acreditávamos que era inquebrável. Mas então, nossos filhotes vieram e tiveram que ser protegidos e escondidos. E aí do nada vimos que o vínculo pai e filhote passava a léguas o vínculo de companheiros. Vengeance não demonstra, mas ele , mais ainda que Hunter, deve estar em pânico."
Charlotte juntou mais essa informação junto a tudo que sabia. Ela estava chegando a conclusão de que tudo sempre esteve às claras, todos enxergavam, menos ela. Peter estava disposto a sacrificar o mais importante na vida dele por ela, ela não queria abrir mão de umas poucas aulas.
Torrent apoiou a cabeça sobre a dela.
"Sabe, ainda há um resquício do cheiro dela em você."
Charlotte ergueu a cabeça e o olhou, ele estava triste.
"Tem certeza de que ela não estava grávida? Eu sei o que senti quando toquei a barriga dela."
Ele piscou.
"Ela estava por trás de tudo, Charlie. Eu não senti cheiro de gravidez nela, na verdade o cheiro dela..."
"Torrent, ela estava usando uma substância que alterou seus sentidos. Você não estava em seu normal, como pode dizer que ela não estava grávida?"
Ele se levantou e andou para um lado e outro.
"Você não entende. Essa merda não me deixou alterado de um jeito ruim. Ela aumentou todos os meus sentidos,  minha força, agilidade e até meu fator de cura. Se ela estivesse grávida, eu sentiria."
Charlotte abanou a cabeça, ele tinha feito coisas incríveis, se dizia que Sheyla não estava grávida, ela não estava.
"Vamos pra casa do Valiant? A senhora Melvis está cozinhando lá."
Ele sorriu.
"É longe?"
Ele se abaixou, a encaixou no ombro e começou a correr.

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