Iniciação

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Saindo da igreja para a noite de neve, concluí que nem mesmo a temperatura baixa poderia interferir na bolha aquecida de comoção que nos envolvia. O ensaio fora só uma previa de todo o sentimentalismo que me atingiria, e eu não sabia como sobreviveria ao dia definitivo. Firmei meu braço ao redor do cotovelo de Justin a fim de me prender a terra. Tinha a impressão de que a qualquer momento passaria a flutuar.

— O que você acha de se juntar um pouco a Fleur? — Cochichou em meu ouvido

Olhei na direção que seu queixo apontava para identificar uma Flê chorosa fungando. É claro que ela terminou a prévia da cerimônia chorando. Aquiesci, voltando-me para seus olhos líquidos e tão cintilantes naquele momento. Ele também parecia prestes a se desprender da terra.

Ergui-me minimamente na ponta dos pés para beijar sua bochecha e me lancei para o lado de Flê em um novo patamar de felicidade. Enrosquei-me no braço dela, utilizando-a como meu novo peso terrestre.

— Por que não estou surpresa com o fato de você estar mais emotiva que Eleanor? — Brinquei.

— Ela tem outro jeito de demonstrar — retrucou, apoiando a cabeça em meus ombros — Eu já sabia que não estaria preparada quando você fosse se casar, mas ainda mais nessa situação... — suspirou — Bom, já disse que não vou falar mais nada. Mas não quer dizer que não possa me lamentar um pouquinho.

Dei uma risadinha, apertando-a mais junto de mim. Preparei-me para responder, contudo, ela ainda não tinha terminado:

— Pelo menos a família dele é adorável. Digo, essa parte da família. As crianças, os avós, a mãe... Aliás, ela me pediu para ajudar na preparação do jantar de hoje. Percebeu como me conquistar. E para uma chefe te aceitar na cozinha dela é necessária muita humildade — elogiou, arqueando os lábios com respeito.

Para mim qualquer elogio à Pattie seria pouco. No momento, ela estava abraçada a cintura de Justin, seus grandes olhos azuis voltados amavelmente para Jaxon que andava de costas na frente dos dois. Justin mantinha uma mão estendida rígida para segurá-lo se fosse cair.

— Ela até me deixa ajudar na cozinha do restaurante — acrescentei, enfeitando o tom de assombro cômico.

Flê emitiu um muxoxo.

— Não tenho dúvidas de que já poderia abrir seu próprio restaurante também.

Deitei a cabeça na dela, rindo, o coração ainda mais elevado.

— Sinto falta de você me superestimando todos os dias.

Diferenciei sua risadinha forçada.

— Bom, não fui eu quem fugiu do país. Por alguma razão meus filhos têm a tendência de se mudarem para longe de mim. Logo é o Caleb. Raul diz que eu devo ser terrível mesmo.

Grunhi em discordância da brincadeira e abri a porta traseira do carro de Justin. Estava decidido, eu os faria conviver até Fleur ver o que eu via nele. Flê tinha o dom de identificar o bem nas pessoas. Eu esperava que minha interferência não atrapalhasse muito em seu julgamento.

— Todos nós não vivemos sem você. Como prova, estarei o tempo todo grudada em seu encalço enquanto estiver aqui.

Ela estreitou os olhos entre a porta aberta e eu. Arqueei uma sobrancelha, teimosa. Em cinco segundos Flê se acomodou no banco, dando de ombros. Antes de me juntar a ela, ainda que no banco da frente, voltei-me para Ava e Lucas andando a alguns metros de mim. Eles aparentavam ter uma conversa natural, o que só podia ser bom sinal.

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