Um passado presente

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JOHN

O céu estava mudando rapidamente em frente aos meus olhos.
Aquele azul encantador, famoso por dar vida a um dia ensolarado, agora se transformava em um cinza medonho, assustador e sem alma. Minha visão foi ficando turva conforme concentrava-me em sua expansão. Logo, o silêncio do meu apartamento, muito bem mobilado, foi preenchido pelo barulho dos trovões. Senti meu coração acelerar, e minhas mãos começaram a suar. Não fui capaz de controlar as lágrimas, e nem o tremor que aquele cenário me fazia vivenciar. Era como se ela estivesse ali de novo, do meu lado, gritando e me fazendo suplicar.

" - Pede perdão! Pede perdão agora! "
Esbravejava enquanto me batia com um cinto preto.

Mesmo soluçando, devido ao choro, tentei explicar, que eu só estava com medo da chuva. Mas não parecia importar, pois os berros continuavam, assim como a surra.

"- Cala á maldita boca criança, e pede perdão de uma vez."
Eu não entendia o que tinha feito de errado, mas eu fiz o que me ordenava.

" - me ... me ... per... doa ma.. mãe. "

No momento em que sorriu, feliz por ser obedecida, um raio caiu sobre uma árvore no jardim, rachando-a no meio. O estrondo foi tão alto, que meus pequenos olhos se arregalaram, e a dor que sentia foi tomada pelo medo.
Sem aviso prévio, fui agarrado pelos braços, e arrastado até a janela. Prensado contra o vidro, fui advertido:

" - Esta vendo o que aconteceu? Da próxima vez que me irritar, peço pra Deus fazer o mesmo com você."
" - NÃO, POR FAVOR. " supliquei sem nem respirar - " NÃO FAZ ISSO MAMÃE!"
Rindo, ela me jogou no chão ,e a única coisa que disse foi:
"- Nunca conte nada ao seu pai. Só faço isso porque te amo bebê. "
Desde então, mesmo sabendo que a culpa não foi minha, e sim da maldade daquela mulher, quando começa a chover, sinto que fiz algo errado.

Hoje aos 29 anos de idade, minha única certeza na vida era que eu não gostaria, em hipótese nenhuma, de ser como a minha mãe e meu pai biológico. Embora, não tenha convivido com meu doador de esperma, o pouco que ouvi dele, me fez ver o quão igual ele e a mulher que me gerou eram. Cresci apavorado com a ideia de ter o DNA que eu tinha. Muitas vezes antes de dormir, quando criança, orava pedindo pra Deus me transformar em outra pessoa, mas todo dia quando acordava e me olhava no espelho, as esperanças morriam. Mesmo tentando não recordar, lembro-me bem da desculpa usada pelos meus progenitores, para justificar suas atitudes tóxicas, abusivas, empáticas e criminosas. Por mais impossível que fosse acreditar , decidi que para fugir do destino que os arrebatou, eu mesmo não poderia deixar que tal fato me tirasse o juízo. Definitivamente, amar, seria perigoso demais pra mim, assim como foi para eles.

Sim, convencido a não sentir, resignei meu afeto e carinho as únicas pessoas que tinha certeza que poderia amar, sem correr o risco de me envenenar : Lia, minha meia irmã e mãe, meu pai de coração Eduardo, meu meio irmão e melhor amigo Matheus, e minha sobrinha Fernanda. E mesmo seguro ao lado deles, tentava não expressar em excesso meus sentimentos.

APAIXONADO PELA MÃEOnde histórias criam vida. Descubra agora