Capítulo 41

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ANAHI

Américo foi compreensivo e me deu uma semana de folga para que eu pudesse ficar com minha mãe. Ele nem ia descontar nada do meu salário — o que era uma bênção, pois o plano de saúde não cobriu todos os gastos, e parecia que tudo custava uma fábula.

Ela ficou por um mês no hospital antes de ser liberada, a fim de evitar infecções e complicações. Claro que isso a desagradou profundamente, e ela só aceitou tomar o caldo de legumes que as enfermeiras trouxeram para sua primeira refeição pós-transplante depois de o dr. Victor lhe informar a data da alta, se tudo corresse bem.

Magda e Chris nos visitavam todos os dias, e, quando tive de voltar ao trabalho, foi Magda quem ficou no meu lugar. Então o dia da abençoada alta chegou, e fomos felizes para casa, mamãe usando uma máscara sobre a boca e o nariz.

Os vizinhos apareciam a toda hora, e ela os recebia com um sorriso e o cabelo cheio de laquê, mesmo que ainda estivesse frágil e cansada. Eu a ajudava com o penteado, apesar de sempre ficar meio torto, pois minhas habilidades nesse departamento eram as mesmas que no strip. Ela, no entanto, sempre elogiava e dizia que estava perfeito.

O dr. Victor foi muito gentil, nos visitando à noitinha sem cobrar nada, e eu desconfiava que sua preocupação e cuidado com minha mãe se devessem ao fato de que ele parecia reluzir quando olhava para ela.

E assim a vida foi retomando seu curso, o medo do inevitável cedendo aos poucos. Foi um tempo muito corrido, o que foi bom. Sobrara pouco tempo para pensar...

...nele.

Somente quando eu caía na cama, esgotada depois de cuidar de minha mãe, da casa, da comida, das plantas e das roupas sujas, se tornava difícil evitar pensar nele. Em tudo o que aconteceu entre nós. Também era difícil evitar pensar nele quando eu ia trabalhar com roupas velhas e desbotadas, já que todas as minhas peças boas continuavam em sua casa. Evitei o máximo que pude, improvisando com todo tipo de coisa que consegui encontrar, mas, quando tudo o que restou foi ir para o trabalho naquela manhã usando uma calça de moletom da época do colegial e uma camisa estampada da Magda — e fui chamada na sala da presidência —, resolvi botar um ponto-final naquela história de uma vez por todas.

Mandei uma mensagem para Alfonso enquanto seguia para o elevador:

Preciso pegar minhas coisas. Qdo posso passar aí?

Qdo quiser. Vou sair hj à noite. A casa vai estar livre.

Ok.

Isso me deixou aliviada. Eu não queria vê-lo.

Dei uma ajeitada no cabelo quando cheguei à antessala, onde dona Inês trabalhava. Ela deixou escapar uma risadinha ao examinar minhas roupas, enquanto se levantava e anunciava minha chegada ao seu Hector.

Seria consolador saber que ele tinha um pouco de catarata.

Não era o caso, como percebi logo que entrei em sua sala e o peguei me estudando dos pés à cabeça com a testa enrugada, de dentro de seu terno caríssimo.

— Queria me ver, seu Hector?

O presidente interino da L&L indicou a cadeira em frente a sua mesa.

— Sim, Anahi. Sente-se.

Fiz o que ele disse e evitei cruzar os braços. Sempre me sentia coagida diante dele. Não que ele tivesse feito algo para isso; era só que sua figura era sempre séria.

— Falo em nome da diretoria quando digo que apreciamos sua conduta no que se refere à sabotagem, ainda que alguns não concordem com seus meios.

Mentira Perfeita - ADPOnde histórias criam vida. Descubra agora