12- Cobra

533 21 5
                                    

Capítulo 12 - Cobra


Karina deu uma última olhada para trás antes de virarmos por uma rua sem volta. Aqueles olhos azuis cheios de incertezas pediam para que eu não a deixasse sozinha. E praticamente me imploravam para confiar nela.

― Ainda dá tempo de desistir.

― Ah, Cobra. ― Ela revirou os olhos. ― Cala a boca. Você já disse isso oito vezes. Eu tô contando.

Sorri sem querer.

― E como eu também já te disse... Não posso ficar aqui um semana de recesso sem fazer nada e fingindo que essa vida é boa.

― Ok. ― Liguei o rádio, apontando para trás. ― Procura aí um pendrive nessa mochila.

― Aí depende. ― Karina arrastou a mochila. ― Se o seu gosto por música for muito excêntrico eu vou colocar o meu celular aqui... ― A voz dela foi sumindo enquanto ela pareceu indignada. ― Filho da mãe!

Gargalhei quando Karina pegou uma de minhas cuecas e atirou na minha cara.

― Onde, de verdade, está o pendrive?

― No bolso da frente. ― Ela procurou por um bolso na mochila. ― Da minha calça.

― Vai se fuder! ― Karina riu de forma tão divertida que não havia como não rir com ela. ― Você é muito sem noção. Pode bancar o tarado aí. Eu sei o que está tentando fazer. E eu não vou pedir pra voltar. Mas tem um soco aqui esperando para ser seu.

Na verdade eu queria outra coisa. Mas apertei os olhos com força quando o carro parou no semáforo para tentar afastar aquela cena bizarra de beijo. Beijo este que Karina fingia que não existia. E agia como se fosse o meu irmãozinho caçula.

Ela se cansou de esperar pelo meu pendrive e conectou o próprio celular no rádio.

― Qual a rota, capitão?

― Ilha Grande.

― Sério? Você morava em Ilha Grande? Você morava num local de férias! E simplesmente foi embora?

― Não. ― Sorri, mantendo a atenção na estrada. ― Só que as coisas deverão ser resolvidas por lá. Você acha que tenho cara pescador?

― Às vezes. ― Ela riu. ― Ok. Então escuta essa música aqui.

Achei que fosse a última novidade do verão. Ou que Karina ia colocar Pescador de Ilusões. Mas não. Ela colocou Charlie Brown Jr. E começou a cantar uma versão muito estranha de Papo Reto. Na verdade, cantar era um modo fofinho de dizer que ela estava gritando sílabas em D e B e berrando a palavra SKATE no ritmo da música.

― Você tá muito louca. Se eu não tivesse dirigindo teria que filmar.

― Então Skate! Eu vou fazer Skate que ela não vai Skate!

Tentei enfiar a mão na boca dela. De verdade. Mas Karina era insana. E divertida. Eu estava tenso, com os nós dos dedos congelados e ela estava ali usando o meu braço como microfone para seus gritos desafinados. Ela estava me ajudando. Como sempre.

O que ajudou a me distrair durante a viagem. A única parte em que Karina ficou em silêncio, achei que ela tivesse dormido. Mas a peguei fitando a estrada de forma sonhadora. Tive um sério colapso de psicopata ao ficar encarando a nuca dela. Eu quase podia ver os vasos azuis espalhando sangue por ali, deixando a pele de Karina quente, alimentando os fios dourado de seus cabelos.

Uma buzina me assustou. Puxei o volante.

― O que foi isso? ― Ela deu um salto no banco, tão alto quanto meu coração batia.

― Eu me distraí! ― Meus olhos estavam tão estáticos que eu não conseguia piscar. ― Caralho.

― Puta merda. ― Karina soltou um assovio. ― Você não quer parar um pouco no acostamento e respirar?

― Tenho que chegar. ― Balancei a cabeça.

Karina ergueu a mão. Primeiro achei que ela fosse me bater. Depois imaginei que ela estivesse pedindo para falar, mexendo os dedos. Mas por fim eu soube que ela estava na dúvida em tocar o meu ombro ou não. E quando seus dedos pousaram em minha pele, ela os apertou ali, encarando-me determinada.

― Vai fundo, Cobreloa. Vai dar certo. Se não der a gente mete a porrada em todo mundo. ― Balancei a cabeça. Ela riu tranquila. ― Eu seduzirei os bandidos.

Olhei-a rapidamente com o canto dos olhos.

― E se eu for o bandido?

Os dedos dela se esticaram lânguidos alcançando o meu pescoço, dançando pela veia até o meu maxilar. Engoli em seco, cravando as mãos com força no volante e tentando me concentrar. Seu indicador prendeu o lóbulo da minha orelha contra seu dedo médio enquanto a unha do polegar fazia desenhos singulares pela minha barba.

― Então posso começar a testar em você meu poder de sedução.

Eu respirava pela boca entreaberta, tentando não fazer o pulmão parecer afoito. Virei o queixo na direção de Karina e ela apertou os olhos enquanto uma risada invadia sua garganta. Sua mão deferiu um tapa na minha nuca, se afastando dali.

― Eu tô brincando, Cobra. ― Ela ria enquanto se virava para a janela.

Mas eu preferia que ela estivesse falando a verdade.

Naquele momento vi que aquela viagem não seria uma boa ideia. Não pelo pensamento de estar colocando Karina em perigo. Era uma má ideia porque ela me fazia querer ser perigoso. E devorá-la a qualquer momento.

Olhos de Cobra (Fanfic Cobrina)Where stories live. Discover now