Duas semanas se passaram eternamente lentas depois de tudo que ocorrera em Ilha Grande. Finalmente eu tinha a sensação de que minha vida voltara ao normal. Eu estava recomeçando. Minha história com Pedro havia acabado como deveria: com honestidade. E meu recomeço era exatamente aquilo que ele dissera em nosso cativeiro. Eu queria um amor que me consumisse e só Cobra poderia me dar aquilo.
Eu o vira três vezes. E havia contado cada espaço entre uma visita e outra como se fosse um século de distância. Aquele jeito de subir um frio pelo meu estômago, meu coração batendo na ponta dos meus dedos, minhas bochechas queimando. Eu sentia aquilo tudo quando nos aproximávamos.
Na primeira vez, dois dias depois, eu levara uma sopa para ele. Estava frio depois de uma chuva intensa e ele ainda estava muito machucado. Seu rosto estava praticamente normal de novo, mas as costelas ainda estavam terrivelmente dolorosas. Eu o ajudei a trocar as ataduras. Quando meus dedos tocavam a pele de seu dorso era como se uma sinergia fizesse partes em mim formigar.
Da segunda vez, uma semana depois, ele já estava de pé, trabalhando no QG como sempre e eu estava saindo para o colégio. Nos olhamos por cinco minutos sem interrupção, eu contei. Até alguém aparecer para comprar algo e quebrar aquela ponte que fazíamos com os olhos.
E a terceira vez havia sido ontem quando Cobra aparecera na academia do meu pai. Duca e eu já havíamos conversado com Gael sobre a frieza que Lobão tratara Cobra e que a gana dele em ser um campeão quase lhe custara a vida. Eu acrescentei o que sabia: Cobra teve uma vida difícil. Ele se agarrava a esperanças imediatas.
Então Gael pediu que Cobra fosse até lá. Eles conversaram. Fiquei sentada no ringue ao lado de Duca e Bianca. Nenhum de nós dizia nada enquanto analisávamos a expressão de ambos. Queria que Bianca compartilhasse seus pensamentos comigo, mas ela fez suspense.
Quando Cobra saiu de lá, apertando a mão de Gael, meu pai sorriu e bateu em seu ombro.
― Eu sempre acreditei em você, Cobra. Você vai ser um campeão. Com força e honra.
― Força e honra, mestre. ― Cobra o saudou.
― Agora quero todo mundo se mexendo! ― Ele gritou. ― E você, Karina? Por que não tá descendo a lenha no Duca? Não quer vencer a competição do próximo mês?
Deixei um pequeno sorriso escapar e Cobra o segurou. Segui com Duca. Mas pela primeira vez na vida tive vontade de abandonar o treino e seguir com Cobra para o QG. Só que não podíamos. Não ainda.
Ainda havia Jade.
Porque simplesmente não havia mais Henrique.
Imaginei que ela fosse Duca e o soquei e chutei o quanto pude. Já estava terminando de massacrá-lo quando ela invadiu a academia. Jade entrou ali como um furacão. Achei que ela fosse subir imediatamente para a Ribalta, mas ela subiu no ringue, empurrou o embasbacado do Duca e fechou os dedos de unhas longas e pintadas nas palmas das mãos.
― Vamos lá. Vamos brigar.
― O que? ― Abaixei as mãos.
― É isso que você ouviu, sua Maria macho! ― Revirei os olhos. ― Tudo que você é eu sou um pouco mais. A única coisa que não fiz ainda foi bater em alguém. E se eu precisar apanhar para dar um pequeno soco que seja nessa sua cara, eu aceito.
― Jade. ― Cobra entrou correndo. ― Para com isso.
― Que bagunça é essa aqui? ― Gael também.
― A Jade e o seu show particular. ― Limpei o suor da testa. ― Ela quer apanhar.
― Não é você que vai fazer isso. ― Meu pai apontou para mim, depois para ela. ― Saia da minha academia, senhorita.
Jade deu um grito histérico daqueles que as crianças dão quando não ganham presentes. Achei que ela fosse sair correndo. Ela correu, mas para cima de mim. E brigou do jeito que ela sabia.
Segurou em meus cabelos e continuou gritando. No começo esperei para ver qual era o próximo golpe. Mas ela só segurava o meu cabelo e balançava minha cabeça de um lado para o outro enquanto gritava. Foi fácil empurrá-la para trás. Jade cambaleou e me soltou. Virei-me de costas para sair do ringue, mas ela me segurou novamente.
Uma raiva singular dentro de mim cresceu. Porque Jade tinha sua força. Seus músculos de dançarina e sua altura faziam com que ela conseguisse me segurar por mais tempo que eu planejara.
Levei as duas mãos à nuca dela. Apoiando meu corpo em Jade, erguei as pernas no ar e as impulsionei para baixo com força. Segurando-a pelos braços, Jade passou por cima de mim. Minhas mãos a derrubaram no chão. Caí de costas no mesmo instante em que ela caía de rosto. Mas me reergui no melhor estilo de impulso.
― Como você fez isso? ― O queixo de Duca caiu.
― Por que você fez isso? ― Gael rugiu.
― Ai.
Virei-me para Jade, caída no chão. Cobra estava imóvel. Abaixei até ela, afastando seus cabelos do rosto.
― Me desculpa. Só não toca em mim desse jeito de novo. É quase um instinto. ― Ela começou a chorar. ― Quebrei alguma coisa?
― Claro que quebrou sua machorra. O meu orgulho!
Bufei, ajudando Jade a se levantar.
― Isso não vai ficar assim, Karina. Você vai ver.
Cruzei os braços, dando as costas quando ela saiu do ringue com a ajuda de Gael.
― Alguém pode me explicar o que houve aqui? ― Duca segurou meus ombros. ― Como você fez aquilo?
― Você já ouviu falar na Iniciativa Vingadores? ― Ergui as sobrancelhas. ― Eu treino os movimentos da Viúva Negra.
― Você tá brincando! Poderia ter quebrado a garota.
― Claro que não Duca! O corpo dela também sabe cair. Ela também tem o treinamento dela lá com aquelas danças.
― Karina isso é muito sério.
― Eu achei muito maneiro. A Jade sabe se defender. ― Cobra riu. ― Quero aprender isso depois.
Ele saiu antes que eu pudesse dizer algo. Voltei meus olhos para Duca. A expressão dele indicava que viria mais bronca. A voz do meu pai voltou. Eu iria mesmo ouvir um sermão terrível.
Mas só conseguia planejar a próxima vez em que me encontraria com Cobra.
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Olhos de Cobra (Fanfic Cobrina)
FanfictionDepois de superar tantas mentiras e descobrir que o seu verdadeiro pai é realmente Gael, Karina decide voltar para casa e colocar uma pedra sobre seu recente passado. Mas perdoar, não significa confiar e tudo isso a leva para longe de um sentimento...