21 - Karina

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Fogo.

Tudo queimava.

Às vezes eu tinha a sensação de não conseguir respirar. Em outros momentos abria os olhos e só via escuridão. Meus gritos não saíam. Achei que fosse morrer. Eu tinha terríveis minutos de consciência agonizante para mergulhar em uma escuridão profunda. Foram os piores momentos de toda a minha vida. Dores físicas e alucinações com pessoas conhecidas e um medo exasperado do Cobra.

Quando finalmente abri os olhos já era manhã do dia seguinte. Consegui reconhecer o teto, a janela, uma cama e, posteriormente, as costas de Cobra parado na porta, olhando para a saída. Eu quis continuar fingindo que estava dormindo, mas uma tosse repentina me fez engasgar.

Ele se voltou correndo, me ajudando a sentar.

― Respira. ― Suas mãos firmaram meu rosto. ― Isso. Devagar. Você ainda está com febre. ― A mão dele percorreu o meu rosto. ― Vou chamar a enfermeira.

― Não. ― Agarrei o pulso dele. ― Não, Cobra. Eu ainda estou confusa.

― Não. Você tá bem. Não tá mais me confundindo.

― Não entendi.

― Ka. ― Ele foi se afastando. ― Vou pedir para que olhem você. Não foi uma noite muito fácil.

Os olhos dele vacilaram. Pisquei com força porque achei que estava alucinando com um vislumbre de lágrimas rasas naquelas pálpebras.

― Cobra. ― Segurei a camisa dele antes que ele escapasse. ― Você tá chorando?

Ficamos incontáveis segundos nos encarando.

― Eu achei que você fosse morrer, Karina.

Ele estava chorando. Não soube o que fazer. Então o soltei.

Cobra se afastou bruscamente, caminhando para fora. Poucos minutos depois uma senhora de sorriso largo entrou. Ela tinha os cabelos brancos e a pele muito morena e tocou minha perna, afastando o lençol.

― Menina, esse Pedro salvou a sua vida.

― Como? ― Achei que não tivesse ouvido direito.

― Ele sugou o veneno. Geralmente isso não é indicado dependendo da picada da cobra. Mas se ele não tivesse feito isso teríamos que amputar metade da sua perna. ― Arregalei os olhos. ― Não nós, mas o hospital lá no Rio. Ele até passou mal. Por causa do veneno. Ficou um pouco na saliva dele. Mas não o afetou muito não. Ele voltou a tempo de poder segurar a sua mão. Vocês tem uma conexão incrível. Só parou de gritar pelo nome dele quando sentiu que ele estava por perto, tocando você.

Fiquei refletindo sobre aquilo. Eu não lembrava de nada. A enfermeira me recomendou repouso e então foi até a porta gritar.

― Pedro! ― Arregalei os olhos. ― Pedro! Ela está bem! Venha cá cuidar da sua princesa.

― Ela não é uma princesa. ― Cobra sorriu, agradecendo a enfermeira. ― É uma guerreira.

― Aproveita o seu Pedro.

Ela nos deixou. Cobra se aproximou, dando uma olhada na minha perna.

― Já está muito melhor!

― Cobra, me desculpa. ― Minha voz soava desesperada. ― Eu não estou entendendo nada. Essa coisa de Pedro. Eu não me lembro.

― Ka. ― Ele apertou os lábios. Havia olheiras em seus olhos. Mas ele havia parado de chorar. Seus dedos escorregaram pelos meus cabelos algumas vezes. ― Acabou. Vou levar você de volta para casa. Para o Pedro.

― Não! Cobra. Eu estava delirando.

― Justamente, Ka. ― Ele parecia tão paciente... Como se não fosse ele. ― Você não se lembra, mas o modo dramático como gritava por ele... Nós sabemos o que isso significa. ― Balancei a cabeça negativamente. Eu não queria saber. ― Você sabe sim. Você precisa voltar pra ele Karina. Porque você ainda o ama. Está reprimindo isso dentro de você. Mas o veneno da cobra ― ele sorriu ― que ironia, né? O veneno fez você finalmente despertar.

― Cobra. ― Eu não sabia o que dizer.

― Você não se viu essa noite. Sua boca ficou tão roxa e seus olhos afundaram. Seu rosto inchou e sua perna estava necrosando. Eu apaguei por meia hora por causa do veneno e quando acordei você não parava de gritar de dor e chamar por Pedro. A noite toda, Ka. Se eu soltava a sua mão você desesperadamente chamava por ele. Porque vocês não terminaram isso. Você está me acompanhando?

Fiz que sim com a cabeça.

― Precisa voltar e conversar com ele e precisa viver esse amor depois daquele obstáculo. Precisa descobrir se o seu ódio é maior do que o sentimento que está tentando esconder. ― Cobra suspirou, abaixando os olhos. ― Não podemos mais brincar de estepe um com o outro.

Pousei a mão sobre o seu braço, me arrastando na cama para ficar mais perto.

― Eu ainda sou um pedaço da sua costela?

― Para sempre. ― Cobra ergueu os olhos. ― Você já quebrou uma costela lutando? ― Fiz que não com a cabeça. ― É uma dor terrível. Não dá nem pra respirar. Foi o que eu senti quando achei que perderia você.

Abracei-o com força. Ele retribuiu o gesto. Senti algumas lágrimas atingirem meus olhos e descerem pelo meu rosto. Cobra afagou minhas costas. Não sei por quanto tempo ficamos daquele jeito. Tempo suficiente para eu perceber definitivamente que ele estava certo. Eu ainda precisava viver aquela história com Pedro.

E eu odiava meu coração por aquilo.

O que me fez chorar copiosamente por mais alguns minutos, recebendo o apoio do meu melhor amigo.

Olhos de Cobra (Fanfic Cobrina)Where stories live. Discover now