Capítulo 27

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Ninguém nunca vai entender o que se passa na cabeça de um viciado, uma hora ele está motivado, decidido a vencer o vício a todo custo, incentivado por ele mesmo, ou  pelas pessoas que ama.


Mas em outra, ele só paz,  só quer fugir dos seus problemas da maneira mais fácil, ele se sente um inútil, um fracassado que não serve pra nada, além de fazer os outros sofrerem.

Então ele deixa de lado muitas coisas boas para viver em função desse vício.

Hoje pela manhã eu levantei da cama, tirei o braço do Peter cuidadosamente do meu corpo. Dei um beijo doloroso em seu rosto e o fitei pela última vez.

Ele era tão lindo.


Depois disso, peguei a muleta e caminhei sorrateiramente até a porta e a fechei com cuidado para não acordá-lo.

Desci as escadas, fui até a cozinha, peguei a chave que ele havia esquecido em cima do balcão e segui até adega.

Abri e agarrei uma garrafa de whisky com convicção, depois despejei com orgulho no copo e tomei.

A sensação era deliciosa, foi um gole atrás do outro até eu está completamente satisfeita.

Em seguida,  fui até um pote onde ele guardava as suas economias e peguei uma boa quantia em dinheiro, o suficiente para o táxi, e pra suprir minhas necessidades.

Eu sei que ele vai me odiar por isso, mas eu prefiro assim.

Não quero fazer mais ninguém sofrer.

Já do lado de fora, eu chamei um táxi e entrei no mesmo, evitando olhar para trás.


Com destino a lugar nenhum.

Peter é um cara incrível que merece o mundo, e não uma pessoa que o decepcione o tempo todo, e que está fadada a errar sempre.

Eu não sou a garota que vai fazê-lo feliz, eu nem sequer consigo me livrar da droga de um vício.

Se eu me olhar no espelho nem vou me reconhecer mais. Estou acabada, seca e deprimida, e ninguém, absolutamente ninguém, pode fazer nada pra me ajudar.


Nem mesmo minha mãe se importa comigo, do contrário já teria me encontrado, colocando a minha foto  no jornal.


Assim que o táxi parou, eu paguei o motorista, depois segui pela rua de muleta sem saber pra onde eu ia. Não fazia ideia se estava perto ou longe de casa.


Senti uma imensa vontade de chorar e  uma dor me corroer por dentro.

Me arrependi de tantas coisas, de ter fugido de casa, de ter magoado uma pessoa incrível,  de tudo.

Se eu ao menos pudesse voltar atrás.

De repente vi uma garota ruiva na minha frente, virada de costas pra mim.

—– Liza?

E como um flashback, memórias começaram a surgir na minha mente.


—– Desculpe, amiga, o que estava dizendo? —  Ela virou e olhou pra mim, depois de ter ficado um tempo encarando a novata.

—– Que minha mãe proibiu a gente de se falar, e sairmos juntos, tomei uma baita de uma bronca no dia da festa, e  pra piorar eu estava vestida com a camiseta do David, agora ela está com uma má impressão de mim.


—– Então era por isso que você estava fugindo de mim o tempo todo, sempre quando eu te procurava você tava com aquele garoto cego, qual é mesmo o nome dele?

—– Simon, e sim, era por isso —  Lamentei — Desculpe

—– Nossa, eu estava quase te dando uns murro, onde já se viu ignorar Elisabeth Summer — Ela brincou — Sua mãe é muito controladora, porque ela acha que eu vou te colocar a perder, você faz isso por si só, e  mesmo se eu tivesse te influenciado ainda sim seria uma escolha sua.

—– Eu sei, mas...

O barulho do sinal da escola tocando acabou interrompendo nossa conversa.

—– Melhor a gente ir pra aula —  Ela se levantou — Depois terminamos essa conversa.

Na sala, ela ainda observava a estranha garota que também era ruiva, só que não natural.

—– O que tanto você olha nessa garota? — Perguntei impaciente, pois a sua obsessão estava me incomodando.

—– É a Débora.

—– E...

—– Eu odeio ela.

—– Mas ela acabou de chegar.

—– É mais eu conheço ela de outros carnavais, éramos melhores amigas, só que ela me traiu — Liza disse com raiva no olhar.

—– Que pena, ela parece estar arrependida — Brinquei, e ela me encarou furiosa.

—– Liza, relaxa tá, é só não olhar pra ela.

—– É, você tem razão, vou parar de olhar antes que ela perceba.

É óbvio que ela acabou batendo nessa garota que gerou suspensão de três dias.

Mas isso foi antes dela se despedir de mim no ponto de ônibus e me dar um beijo caloroso no rosto.

—– Te amo.

—– Também te amo.

...

Sem perceber meus olhos estavam devastados pelas lágrimas enquanto a garota ruiva do presente que não era a liza, tentava me consolar.

—– Tem certeza que você está bem? — Ela insistiu

—– Sim — Funguei — É  que você se parece muito com uma pessoa que eu conheço

—– Está perdida, quer ligar pra alguém? — Ela perguntou preocupada comigo.

—– Não, eu estou bem, obrigada — Sorri fraco pra ela.

Nesse dia, eu dormi em uma calçada dura e fria, embalada pelo frio da noite que enrijecia a minha pele.

DesilusãoOnde histórias criam vida. Descubra agora