◩ 𝐓𝐡𝐞 𝐄𝐱𝐜𝐡𝐚𝐧𝐠𝐞 ◪
𓏲໋ׅ ᴠɪɴɴɪᴇ ʜᴀᴄᴋᴇʀ ᴀᴅᴀᴘᴛᴀᴛɪᴏɴ.
A tímida e insegura Allice Smith, passou a infância e adolescência como filha única, se mudando de cidade em cidade com uma avoada mãe. Adulta, se mudou para Los Angeles para fazer faculdade...
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Allice Point Of View
Acordar sem ouvir os sons de caos característicos de Los Angeles é algo novo para mim. Ou pelo menos algo que não vivencio há muitos anos. Em vez das buzinas e carros freando, meus ouvidos são inundados pelo som do vento batendo nas folhas das árvores, pelo doce canto dos passarinhos e da quietude.
Por um momento aquela tranquilidadequase sublime, faz uma sensação de paz alastrar-se por meu coração, que estava submerso em angústia e apreensão. Entretanto, eu sabia que aquela calmaria era apenas aparente. Do outro lado da porta já podia sentir a pressão da farsa que estava vivendo.
Ali, eu não era Ali Smith. Teria que me vestir de Alinna Hacker, a esposa do homem que não estava nem um pouco contente com este fato no momento.
Com um suspiro resignado, engulo o medo que me dá vontade de me esconder o dia inteiro e saio da cama. Verifico a hora no celular e ainda é cedo, pouco mais de seis horas. Saio do quarto e rumo para o banheiro, um tanto aliviada pela casa ainda estar em silêncio. Depois de um banho, arrisco-me a ir até a sala e não há mais sinal de Vinnie por ali, a cama que deveria estar arrumada sobre o sofá não existe mais. Será que ele já havia saído para trabalhar tão cedo?
Na cozinha, tudo está também na mais completa paz. Procuro no armário e geladeira ingredientes para fazer o café da manhã e me questiono se foi Nailea quem deixou a dispensa arrumada. Provavelmente, constato, sem conseguir evitar um certo engulho. Faço a cafeteira funcionar e consigo até bater algumas panquecas. Será que devo acordar as crianças? Elisa tem escola e não sei se ela acorda sozinha.
Não sem certa apreensão depois do gelo de ontem, vou até o quarto de Elisa, a cama está vazia. Ouço o som do chuveiro ligado e compreendo que deve estar tomando banho. Sigo para o quarto das outras crianças e Stella ainda dorme, Henry já está acordado brincando com os móbiles acima de sua cabeça.
Sorrio ao pegá-lo no colo.
- Você é muito quietinho, não é? - Ele faz barulhos de bebê, as mãozinhas se embrenhando em meus cabelos. Verifico sua fralda e está limpinha. Ela foi trocada recentemente. Vinnie? Provavelmente, claro.
Volto para a cozinha e faço a mamadeira dele, ocupando-me em alimentá-lo. Desta vez não me esqueço de colocá-lo para arrotar antes de deixá-lo no carrinho para preparar o resto do café da manhã. Então escuto um barulho estranho, como madeira estalando. Aproximo-me da janela e arregalo os olhos para a cena diante de mim.
Com a ajuda de um machado, que até hoje só tinha visto nos filmes, um Vinnie sem camisa desfere pesados golpes num tronco. Suas costas largas brilham de suor, assim como os braços fortes e os cabelos claros. A força e a fúria com que golpeia a madeira é assustadora e fascinante ao mesmo tempo.
Por um momento me sinto hipnotizada por aquela cena inesperada. O verde luxuriante da mata, os primeiros raios de sol tentando se libertarem das nuvens escuras e pesadas no céu e o homem impressionante absorto naquele trabalho.
Até que, como se soubesse estar sendo observado, ele levanta a cabeça em minha direção. Dou um passo atrás, deixando a cortina cair, respirando com dificuldade por ter sido flagrada espionando.
Não demora para Vinnie irromper na cozinha. Ele sabe que estou ali, claro. Não sou transparente. Ele finge que não estou enquanto passa por mim e precipita-se até a geladeira, abrindo-a e tirando de lá a garrafa de água que leva até a boca. Não consigo impedir meus olhos de espreitá-lo furtivamente. Vinnie tem um corpo alto e magro com músculos suaves na medida certa para ser atraente sem ser exagerado.
É exatamente quando aquele pensamento descabido se forma na minha mente que duas coisas acontecem: eu me dou conta, horrorizada, de que estou secando descaradamente o marido da minha irmã.
E tenho certeza de que Vinnie se dá conta da mesma coisa quando levanta a cabeça e me olha de esguelha, com um brilho estranho de espanto no olhar.
Desvio meus olhos rapidamente, mais vermelha que um pimentão. Com vergonha não só de Vinnie, mas de mim mesma também. Achar o marido da minha irmã atraente era errado em tantos níveis que não conseguia nem classificar.
- Está tentando se redimir? - Suas palavras frias me fazem levantar a cabeça novamente.
- Fazer o café da manhã vai ser motivo para me acusar de estar fazendo algum jogo com você também? - Não consigo conter a ironia.
Lá se vai a esperança que nem tinha me dado conta de estar carregando de que Vinnie estaria mais disposto a, pelo menos, tolerar minha presença nesta manhã.
- Desde quando você se dá ao trabalho de acordar cedo Alinna? Quanto mais fazer café da manhã? - continua, no mesmo tom ríspido.
Eu devia imaginar que Alinna não era uma criatura doméstica. Ela havia me alertado sobre isto em uma das nossas conversas e, quando estava em casa comigo, não lavava um prato, quanto mais fazer comida. E ela realmente amava acordar tarde.
De alguma maneira eu imaginava que ela não devia ser tão preguiçosa em sua própria casa, sendo mãe de três crianças pequenas.
Então engulo em seco e dou de ombros.
- Talvez esteja mesmo tentando me redimir - respondo, sustentando o olhar desafiador de Vinnie que agora está meio desconcertado.
- Então é isto? Toda esta sua súbita boa vontade é alguma artimanha para me fazer perdoá-la e esquecer o que fez?
- O que eu fiz? Eu fiz uma viagem. E voltei! - Sei que estou minimizando os atos de Alinna.
Realmente imaginava que sua ida a Los Angeles não passava de uma simples viagem com data marcada de volta. E, mesmo depois de descobrir que ela tinha marido e filhos esperando-a, ainda pensava que era uma questão de tempo até retornar e tudo estaria resolvido. Que mesmo que ela e o marido estivessem com problemas, a relação dos dois teria conserto. Afinal, quantos casais não passavam por uma crise?
Agora, me deparando com a extensão da raiva que Vinnie guarda dentro de si, começo a perceber que todo aquele ressentimento é muito mais profundo e forte do que algo causado apenas por uma viagem sem aviso.
Mesmo assim, cá estou eu. Defendendo-a.
O que me resta fazer? Estou aqui em seu lugar e posso ao menos tentar reparar o estrago feito por Alinna. Sei que não sou ela. Que em dois meses estarei longe, que ela voltará para casa depois de me substituir. Como posso simplesmente passar aquele tempo, apenas substituindo-a, sem me empenhar em melhorar os ânimos naquela família?
Era o mínimo que podia fazer. Quem sabe assim, quando Alinna voltasse, Vinnie já não estivesse com tanto rancor no coração e as suas crianças estivessem mais felizes. Então, ela perceberia que seu lugar é ao lado deles?
- Eu devia esperar uma resposta assim vinda de você, sempre minimizando tudo, achando que nada do que faz é errado ou condenável - ele dardeja, descartando o resto de água na pia junto com a garrafa com tanta força que eu não sei como não quebrou.
- Eu sei que pode parecer errado, mas Alin... - Engulo em seco quando erro - Eu tinha meus motivos.
- Chega, Alinna! - ele sibila perigosamente baixo. - Estou cansado das desculpas para suas loucuras! Para seu descaso para com esta família! Você vem nos despedaçando há anos, quer saber, este seu último desvario passou de todos os limites! Estou simplesmente de saco cheio de... - Ele para, respirando fundo.
Sinto-me como se tivesse sendo esmurrada por suas palavras. Dói ouvir aquilo. Mesmo sabendo que não era de mim que ele estava falando.
Engulo o nó na minha garganta ao contemplar, na confissão de Vinnie, a extensão do estrago no casamento deles. O que Vinnie ia dizer? Que estava cansado de Alinna? Do casamento?
Será que Alinna não estava sozinha naquele abismo que ela achava que se encontrava o casamento?
- Está de saco cheio de que, Vinnie? De mim? De nós?
Antes que ele possa responder, Elisa entra na cozinha, interrompendo a discussão.
- Bom dia papai. - Não me passa despercebido que ela fala apenas com Vinnie.
- Vou tomar um banho para te levar na escola - ele diz, antes de se afastar.
Luto por um instante para me recompor e encaro Elisa com um sorriso que já sei que não será bem-vindo, mas faço mesmo assim.
- Bom dia, Elisa.
- Bom dia - ela resmunga e seu olhar recai sobre a mesa. - O que é isto?
- Oras, café da manhã. Por que não se senta, acho que ainda tem tempo, antes que Vinnie saia do banho.
- Não estou com fome. Me acostumei a não comer de manhã, já que nunca faz nada, aliás, pensei que estivesse dormindo.
Eu mantenho o sorriso.
- Ah, agora vou acordar mais cedo e também fazer o café da manhã.
- Para quê?
Paciência, Ali. Paciência. Murmuro para mim mesma.
- Olha o que eu fiz fresquinho? Suco de laranja. - Encho um copo, ignorando seu mau humor comigo. Ela permanece séria.
- Por que está fazendo isso?
- Eu falei, acostume-se, querida. Teremos novos hábitos por aqui - continuo animada.
- Me acostumar como quando você disse que não ia mais esquecer de fazer nosso jantar ou preparar meu lanche e depois nem acordava para fazer e muitas vezes nem estava em casa na hora de a gente comer à noite? Ou quando íamos fazer aula de dança juntas e desistiu um mês depois? Ou como quando eu era mais nova e você dizia que ia me buscar na escola e me esquecia lá? Ou todas as vezes que se arrependia de ter brigado comigo e vinha pedir desculpas dizendo que nunca mais ia acontecer, a culpa não era minha e sim sua, que estava muito cansada por qualquer motivo ou brava por ter brigado com o papai? - Ela engasga e para, virando o rosto e saindo da cozinha quase correndo.
Eu fico um momento ali, paralisada de terror. Chocada com a quantidade de ressentimento que ela botou para fora em meio a sua epifania.
Deus do céu, que tipo de mãe Alinna estava sendo para aquela pobre criança?
Escuto a porta da frente bater e estremeço, saindo do torpor. Enxugo minhas próprias lágrimas que nem percebi estar vertendo, rapidamente pego algumas coisas na geladeira preparando um sanduíche colocando em um saquinho. Então corro até a porta da sala e a abro, encontro Elisa encostada no carro de Vinnie. Ela não chora mais, mas seu olhar está cheio de raiva quando me vê.
Eu não me acovardo.
- Me desculpe. Eu sei que... - De novo paro ao me atrapalhar e respiro fundo. - Sei que não estou sendo uma boa mãe para você. E que também está brava porque viajei sem avisar, deixando vocês sozinhos. Mas estou aqui agora e quero realmente que tente me perdoar. Prometo que tudo vai ser diferente. - Estendo o sanduíche que tinha preparado. - Seu lanche para a escola.
Ela olha para minha mão e depois para mim. Seus olhos estão cheios de lágrimas que ela luta para não derramar, mas mantém a postura defensiva.
Bom, sabia que não ia ser fácil.
- Por favor, Elisa, pegue! - peço com firmeza. Como acho que as mães deveriam fazer quando querem que os filhos a obedeçam, mesmo quando estão fazendo birra. Não sei Alinna adotava aquela postura, mas eu precisava tentar de tudo.
Elisa finalmente pega o lanche da minha mão e coloca na bolsa, ainda com mau humor.
- Como se diz? - questiono, com vontade de sorrir, por ao menos ela ter pegado o lanche, porém permaneço séria.
Ela rola os olhos.
- Obrigada, mamãe? - insisto.
- Obrigada, mãe.- ela resmunga e entra no carro.
Abro um grande sorriso. Não era uma vitória, mas já era alguma coisa.
De repente o barulho de um carro se aproximando me faz virar. É um jipe dirigido por um homem alto e moreno que me encara com um sorriso largo, porém sarcástico.
Reconheço Hub Hacker, o irmão mais velho de Vinnie.
- Olha só, a fujona voltou!
- Oi, Hub, como vai?
Ele levanta a sobrancelha.
- Nossa, que educada! Onde esteve? Em uma escola de boas maneiras? Bem que a Nailea disse que estava esquisita.
Respiro fundo ao ouvir o nome de Nailea.
- O que mais ela disse?
- Que você a escorraçou daqui quando deveria ter agradecido por ela ter cuidado da sua casa e dos seus filhos.
- Eu não escorracei. Só disse que agora que eu tinha voltado não precisava mais dela aqui. E agradeci sim, talvez ela não tenha entendido. Talvez ela seja devagar para compreender as coisas. - Deus do céu, de onde vinha aquele sarcasmo todo? Fico surpresa comigo mesma.
Em vez de achar ruim o fato de eu ter criticado sua esposa, Hub solta uma sonora gargalhada.
- Aí está, a velha Ali! - Ele para. - Opa, desculpe-me por te chamar de Ali, esqueci que odeia, Ali. - Ri um pouco mais, piscando.
Alinna não gostava que a chamassem de Ali? Era justamente o contrário de mim.
- Ah, pode me chamar de Ali, não ligo mais.
- Não? O que fizeram com você? Lavagem cerebral?
Dou de ombros.
- Quem sabe.
- Ah, eu sempre gostei de você, Ali. Legal ter voltado! Pena que parece que nesta família só eu tenha gostado. E aí, Vinnie! - Ele olha além de mim e me viro para ver Vinnie saindo da casa, parecendo magnífico de banho recém-tomado, não dá para negar.
Ah, inferno. Eu precisava parar com aquilo.
Ele olha para mim com a mesma frieza de antes.
- Stella acordou e está te procurando - resmunga como se eu estivesse fugindo da menina.
- Já vou cuidar dela.
- É bom mesmo. Ela foi a que mais sentiu sua falta. Ainda é criança demais para perceber que a mãe não está nem aí.
- Vinnie, não fale assim.
- Só estou falando uma verdade que nós dois conhecemos.
- Eu te disse que...
- Ei, vocês dois, acho que está muito cedo para briga, não? -Hub nos interrompe e fico vermelha.
- Tem razão, Hub - digo.
- Não que eu me importe, somos família, né? Mas a filha de vocês está bem ali.
Vinnie olha pra Stella e seu rosto suaviza. Ele volta a me fitar com mais raiva ainda, como se a culpa da discussão fosse minha e não dele com sua raiva.
- Vinnie, você vai para a oficina? Vou fazer aquela prateleira dos Hossler agora de manhã.
- Sim, eu estarei lá - ele resmunga, entrando no carro sem se dar ao trabalho de me dar um "até logo".
Eu me recordo de Alinna explicando o trabalho de Vinnie. Ele e Hub tinham uma oficina de marcenaria que ficava na casa dos pais.
- Ele e o irmão faziam isso por hobby, sabe? Coisas com madeira, aparentemente não havia muita coisa para fazer na época que moravam no Alasca e eles gostavam de cortar madeira e fazer coisas. Aí quando ele não pôde mais ir para a faculdade, Hub o chamou para trabalhar com ele.
- Hub também não foi para faculdade?
- Ele é dois anos mais velho que o Vinnie. E até tentou, ele é meio burrinho, sabe? Não deu muito certo e voltou para casa.
Agora vendo-os se afastarem me pergunto se Vinnie teria preferido ir para a faculdade a ficar ali com o irmão.
Quando entro, Stella está sentada no sofá assistindo desenho animado e sorri ao me ver.
- Mamãe, você não foi embora de novo! - Ela vem em minha direção estendendo os braços, e a pego no colo.
- Eu não vou a lugar nenhum, querida.
- Você foi embora - ela reclama, chorosa, e sinto meu coração se apertar.
- Não vou mais a lugar nenhum, está bem? - prometo, rezando para que Alinna possa manter aquela promessa.
Apesar de Stella ser manhosa e estar bastante grudada em mim, não é difícil cuidar dela. A única coisa que ela quer é atenção.
Eu a alimento, depois a ajudo a trocar de roupa e ela pede que eu brinque com ela arrastando um pequeno fogão cor de rosa para o meio da sala.
- O Henry pode brincar também? - pergunto, tirando o bebê do carrinho e o colocando no carpete sobre o chão.
- Ele é muito pequeno, mamãe!
- Mas é seu irmãozinho, por que não brinca com ele também?
- Está bem - ela acaba concordando, e não demora para que comece a tentar alimentar Henry com suas comidinhas de mentira.
- Eu gosto quando brinca comigo, mamãe - Stella diz em certo momento. - Você vai brincar comigo todo dia agora?
Sorrio.
- Claro que sim!
A manhã passa rápido enquanto estou ocupada dando atenção às crianças menores e adoro cada momento. Até que Stella me encara confusa após eu lhe dar o almoço.
- Mamãe, eu não vou na escolinha hoje?
Oh, merda, Stella tinha escola?
Tento me recordar de Alinna falando alguma coisa sobre isto, porém não me lembro. E agora?
- Claro que vai. - Sorrio, tentando aparentar tranquilidade e a levo para o quarto. Ela mesma pega um uniforme dentro da gaveta.
Eu noto o nome da escola na camisa do uniforme e pego meu celular, pesquisando o endereço. Pelo menos eu sabia onde era.
Ajudo Stella a terminar de se arrumar e me recordo que Alinna disse que tem um carro.
- É um troço mais velho do que Maomé, que milagrosamente ainda anda! Eu ganhei de Arthur quando era adolescente e, como nunca parou de funcionar, ainda a usamos. Eu amaria ter um carro novo, mas não caberia em nosso orçamento.
Encontro as chaves no aparador e, com Stella e Henry, rumo até a garagem nos fundos da casa.
Nunca gostei de dirigir e depois que me mudei para Los Angeles todo mundo usava o metrô ou táxi.
- Vamos mamãe! - Stella me puxa e eu os coloco no carro. Arrumo Henry na cadeirinha de bebê e dou partida.
Graças a Deus não bato em nada ao sair da garagem e pegar a estrada. Olho para o celular onde coloquei o itinerário no GPS, rezando para não me perder, respiro aliviada quando finalmente estaciono em frente à escola.
Há uma pessoa na porta colocando as crianças para dentro e a levo até lá.
- Senhora Hacker, que surpresa - a mulher diz com um tom azedo. - Que milagre não estar atrasada.
Sorrio amarelo.
- Às vezes eu acerto.
- Andou sumida. A senhora Nailea disse que tinha viajado.
- Sim, já voltei - corto-a e beijo o rosto de Stella. - Entre querida.
- Tchau, mamãe! - Ela acena, desaparecendo porta adentro com as outras crianças.
- A propósito, esqueci, a que horas tenho que buscá-la mesmo?
A mulher me encara como se eu fosse louca.
- Quem sempre busca Stella não é o senhor Hacker?
- Ah, claro. Tinha me esquecido.
Eu me afasto e entro no carro, a mulher ainda me acompanha com o olhar.
Que fosse cuidar da vida dela.
Mesmo querendo dar um passeio pela cidade, retorno rapidamente, pois fico com medo de dirigir por mais tempo aquele carro velho sem ter muita experiência.
Quando chego em casa, coloco Henry no carrinho e termino de desfazer a mala, tomando o cuidado de esconder as coisas que não eram de Alinna e sim minhas.
Havia trazido a mala de Alinna com todas as suas coisas, mesmo perguntando se ela não queria manter nada pessoal com ela.
- Não preciso de nada disto, é melhor que leve tudo para não haver nenhuma desconfiança. - Tem certeza de que não vai querer ficar com nada? - Todas essas coisas velhas? - Ela riu. - Não esqueça de que sou você agora. - Bom, precisarei levar meu laptop e meu caderno de anotações, além da foto da mamãe que está sempre comigo. Também acho prudente levar um cartão de crédito para alguma emergência. Pelo menos isso. - Tudo bem, só tome muito cuidado e esconda tudo muito bem. Vinnie não costuma mexer nas minhas coisas, mas é melhor ser cuidadosa.
Aproveitando que estou sozinha na casa, ligo meu laptop e, sem conseguir me conter, digito meu nome no Google. Em meio a informações sobre os meus livros, encontro uma conta do twitter recém-aberta em meu nome.
- Mas que merda... - Clico na conta e há várias mensagens bem-humoradas sobre como "estou" gostando de Nova York e até uma foto "minha" com uma leitora no aeroporto.
- Alinna, o que anda aprontando? - Sinto-me esquisita ao ver aquilo. Não sei se tem um pouco de ciúmes, ou somente alívio por não ser eu que estou a caminho de uma livraria para uma sessão de autógrafos com centenas de fãs enlouquecidas.
Com uma curiosidade mórbida continuo ali, stalkeando as leitoras na "minha conta", que começam a postar fotos delas mesmas na fila de autógrafo, que está enorme. Umas usam camisetas temáticas, levam presentes e faixas. É assustador. Depois começam as fotos do bate-papo, onde vejo uma Alinna sorridente usando um chamativo vestido preto que nunca vi.
- Andou fazendo compras, Alinna? - pergunto e clico em um vídeo curto, onde Alinna discorre sobre o enredo do livro. E devo dizer que o faz tão bem que ninguém diria que não foi ela quem escreveu.
Já anoiteceu quando finalmente fecho o laptop e o evento ainda não terminou. E já tem uma centena de vídeos e muitas fotos. Todas com Alinna muito carismática e cheia de sorrisos. E os elogios a sua simpatia só aumentam.
Pelo menos ela estava se dando muito bem como minha substituta. Enquanto eu, ali em Seattle, estava sendo detonada por sua família. Com um suspiro, levanto, escondendo o laptop, e volto para a cozinha.
Bem, aquele foi praticamente o primeiro dia. Ainda tinha dois meses. E não podia desistir. Um pouco mais animada com minha resolução, abro a geladeira e escolho alguns ingredientes. Ia aproveitar que Henry ainda estava tirando a soneca da tarde para fazer o jantar.
Vinnie estava demorando a chegar com as crianças. Henry tinha acordado de sua soneca e eu brincava com ele no meu colo, adorando ouvir sua risada gostosa, enquanto aguardava, sentindo alguma apreensão com o passar das horas.
Quando a porta finalmente se abre e Elisa entra, ainda com cara de poucos amigos, com Vinnie segurando uma Stella adormecida no colo, olho o relógio e já passa das dez da noite.
Vinnie passa direto para o quarto, provavelmente para colocar Stella na cama. Encaro Elisa, que está indo em direção ao quarto também.
- Vocês chegaram tarde! - digo, com um tom meio acusatório. - Vou ter que esquentar o jantar.
- Nós jantamos na casa da tia Nailea.
- Mas eu fiz o jantar!
- Você nunca faz! E a gente sempre janta na casa da tia Nailea, afinal não podemos ficar com fome! - ela resmunga, indo para o quarto em seguida. E eu bufo, irritada.
Henry se mexe sonolento e o acalento no colo, levando-o para o quarto. Vinnie ainda está lá, colocando um pijama numa Stella adormecida.
- Por que não me avisaram que iam para a casa de Nailea? - pergunto, colocando Henry no berço. Ele já estava dormindo.
- Devia saber que iríamos.
- Não devia não. - Cruzo os braços em frente ao peito. - Vou deixar você ajeitar Stella, te espero na cozinha!
Marcho para a cozinha e começo a retirar a mesa que tinha posto com todo esmero, assim como a comida que fiz.
Tudo um desperdício.
Fico me perguntando se Vinnie ia ignorar minha intimação, quando ele entra na cozinha com uma postura defensiva.
- O que foi dessa vez?
- O que foi? Olha só para isto? Fiz comida para nada!
- Você raramente se digna a fazer o jantar, Alinna, queria que eu adivinhasse? E as crianças não podiam ficar com fome.
Respiro fundo para me acalmar.
- Tudo bem, entendo este ponto. Como eu disse as coisas vão ser diferentes agora.
- O que quer dizer? - Sua postura é debochada. Ah, ele ia ver.
- A partir de amanhã, não quero que leve as crianças para a casa de Nailea, porque vou fazer o jantar. De agora em diante todos jantam aqui. Inclusive você. E isto não está em discussão. - E, sem lhe dar tempo de resposta, saio da cozinha e rumo para o quarto, só parando quando fecho a porta atrás de mim.
✿ ✿ ✿
Um barulho diferente me acorda de repente e demoro um instante para entender que é choro de bebê.
Sem pensar muito me levanto e abro a porta do quarto, rumando até o berço de Henry. O bebê está esperneando, com o rostinho vermelho de chorar, estendo os braços embalando-o no meu peito.
- Ei, bebê, não chore, qual o problema?
Preocupada que ele acorde Stella, saio do quarto e o levo até a cozinha, me perguntando se estaria com fome, já que a fralda está limpa.
- Desde quando você acorda de madrugada ao ouvir Henry chorar? - Tomo um susto ao ouvir a voz de Vinnie e, ao me virar, o vejo parado na porta da cozinha, sem camisa, usando apenas uma calça de pijama, com os cabelos despenteados e um olhar estranho no rosto de barba por fazer.
Continua...
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