Cap 39

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{Ink's p.o.v}
No intervalo eu encontro Blue no meu armário, meio nervoso e parecendo bem envergonhado.
-Oi, Blue!-o cumprimento-Algum problema?-pergunto preocupado, e me lembro do que Error disse na noite anterior.

"O Blue tá tendo um caso com o Dust."

De primeira vez, obviamente não acreditei. Principalmente por ele ter feito questão de me contar, isso não é algo que Error faria. Mas Blue anda meio estranho de qualquer maneira, e acho meio suspeito ele não ter aparecido na última reunião. Ele estava muito animado para falarmos sobre nossa festa de hallowen feita de última hora.
-Oi, Ink.-ele diz dando um sorriso-Eu queria te pedir um favor, bem minúsculo.
-Hum, e qual seria esse favor?-pergunto meio desconfiado.
-Ehr... Hum, você...-ele olha para os lados mas não consegue me olhar nos olhos-Você pode, por favor, fazer as rondas dos corredores hoje pra mim?
-O quê?-fico meio surpreso, mas não chego a gritar.
-Eu prometi que iria encontrar um amigo hoje! Até ia sair mais cedo, mas o Paps não estava em casa, só peço que fique dando uma volta na escola, por favor!-ele insiste e chega a juntar as mãos implorando para que eu fizesse o que ele pedia.
-Blue, você combinou de vigiar os corredores a meses,  quanto tempo combinou isso com seu amigo?
-Uma semana...-ele me responde baixinho.
-O que é mais importante pra você?-pergunto cruzando os braços.
Ele me olha de cima a baixo e desvia os olhos. Isso é suficiente para eu saber a resposta.
-Ele... Ele tem problemas maiores, maiores do que ficar se pegando no corredor, ou não estar de uniforme.
-Certo, Blue.-digo cedendo-Pode ir, eu dou meu jeito.
-Obrigado!-ele diz de maneira genuína e me abraça fortemente. Depois disso vai embora de minha vista.
Já fiz esse trabalho antes, e vou admitir que quero fazer ele de novo. Mesmo odiando a cidade e a escola, eu quero me lembrar desses corredores. Quero me lembrar destes rostos, quero ter certeza de que serei reconhecido por todos quando atingir meu sonho; quando eu atingir o meu ápice quero que todos saibam quem eu sou.
Não parece ter nada demais acontecendo. Os casais estão juntos, outros até demais. Alguns alunos conversam, outros leêm, outros estão sozinhos. Chego em um corredor meio vazio, apenas sinto um cheiro estranho de cigarro. Sigo o cheiro até uma garota de cabelos loiros, as pontas estavam com uma cor de rosa meio desbotada. Usava uma gargantilha com um coração no meio e uma icônica jaqueta roxa com um pluma azul. Essa era Lust, uma garota bastante conhecida pela escola por sua história. Se não me engano, todos sabem que ela é trans. Mas poucos sabem com o que ela trabalha.
-Eu sabia do seu currículo, mas não achei que se rebaixaria a isso.-digo dando uma risada fraca.
Ela me olha e o  cigarro cai no chão.
-Ink?
-Oi, quanto tempo.
Antes dessa bagunça, éramos colegas no futebol da escola. Mas acabamos desistindo. Isso foi antes de ela se descobrir trans, mas não tínhamos contato desde que saímos do futebol; então fiquei com receio de apoiar ela ou de demonstrar minha opinião no assunto. Mas no fundo, assim como qualquer fofoca da escola, eu não ligava.
-Você...-ela tenta procurar um assunto-Você tá bem?-ela pergunta parecendo não saber o que dizer.
-Não.-essa foi a primeira vez que eu disse a resposta certa pra pergunta-E você?
-Também não.-ela me olha de cima a baixo-Você não mudou nada em.
-Obrigado?-digo meio confuso e me aproximo.
-Isso foi um elogio, sempre achei você bonitinho.-ela diz dando um sorriso de canto.
-Você não está nada mal também.
-Obrigada.-ela diz e coloca as mãos em seus bolsos.
-Faz tempo que não escuto notícias suas, desistiu de ser a fofoca?
-Eles não merecem meu glamour.-ela diz em um tom brincalhão e eu dou risada-Mas eu também não escuto mais tanto de você, pelo menos não coisas ruins.
-É meio impossível não ouvir nada sobre mim, afinal eu sou o presidente do grêmio.
-E eu a trans da escola.-ela me olha e eu gostaria de engolir minhas palavras-Meio que ambos somos fofocas ambulantes, Ink.-ela dá uma risada fraca.
-É, nós somos...-digo desconfortável e bem arrependido-Lust, sei que não nos falamos faz tempo, mas... podia me dar uns conselhos?
Lust me analisa e consigo ver seus brincos de argola, mas ela também tem alguns piercings.
-Conselhos, sobre o que exatamente?-ela pergunta se demonstrando interessada.
-Eu...-olho ao redor-Promete manter em segredo?
-Quem confiaria em mim, Ink?-ela pergunta meio estressada-Sim, é nosso segredo, agora me fala.
-Eu tô gostando do Error.-dizer isso em voz alta, parece que estou confirmando alguma fofoca que falaram sobre mim.-Mas, eu não sei se eu sou gay, se eu sou bissexual ou...-bato minha mão na parede-Ou qualquer outro tipo de coisa, é que, isso é...-procuro a palavra certa para não ofender ninguém nesta conversa-É novo pra mim, e você têm mais conhececimento do que qualquer um aqui, além de quê...-olho para ela-eu confio em você. E acho que possa me ajudar nisso melhor do que qualquer outra pessoa.
Ela está emocionada, mas tenta esconder inutilmente.
-O-Obrigada, mas... Wow, isso é um pouco inesperado. Você e o bug?-dou de ombros sem saber o que responder e ela dá risada.-Por um lado, fazia sentido ele gostar de você já que quando você ficou um tempo sem acordar ele te visitava direto.
-Ele me visitou no hospital?
-Uhum, sua mãe não te contou? Ele até faltou uma semana de aulas porque queria te ver desde cedo.-ela diz como se fosse a coisa mais normal do mundo, enquanto meu coração bate um pouco mais rápido. Isso significa alguma coisa?-Pelo menos foi o que Fresh disse. Mas voltando a sua dúvida, você gosta de meninas?
Lembro do meu único relacionamento com uma; Dream era a garota perfeita, além de linda é inteligente e bondosa. Gosto muito dela, e sentia sim uma atração carnal por ela. Mas tudo mudou quando fomos evoluindo no relacionamento. Eu gostava dos beijos, adorava falar com ela, mas eu sentia que não éramos estáveis, e isso me incomodava um pouco. Sempre achei que meu primeiro relacionamento terminaria por algo bem menos pior do que traição, mas não foi bem assim. Acho que eu tinha a expectativa de que fosse algo perfeito, mas nada é perfeito. E se fosse, não teria graça.
-Gosto, além da Dream eu já fui um dos pervertidos pelas líderes de torcida, você se lembra disso.-dou risada passando uma mão na nuca.
Ela dá risada.
-Lembro, lembro que eu também forçava gostar delas.
-Bem, você era um bom ator, mas você deve ficar melhor com elas.-digo dando um sorriso para ela.
-Eu fico melhor do que elas no uniforme, já testei.-ambos damos risada-Mas enfim, gosta de meninos também?
-Hum...-fico como uma expressão como se fosse meio óbvio a resposta.
-Já beijou um?
Minha mente transborda dos momento em que isso quase aconteceu, e do momento que aconteceu. E nessa hora, eu sei que retribui, mas minha mente não me deixou continuar. Lembro de todos os detalhes do beijo, mas me forço a voltar para a realidade.
-Sim, já tive uma experiência.
-Hum...-ela me analisa-Você tem certeza?
-Sim.-digo sem hesitar.
-Olha, eu não posso responder o que você é, isso é algo pessoal, mas sei que deve procurar sobre bi e pansexualidade. 
Estranho os nomes e ela dá um sorriso de canto, provavelmente debochando da minha cara.
-Hum, ok?-dou uma risada.
-Acredite quando eu digo que as coisas vão parecer mais fáceis depois; e que você vai ficar bem.-ela coloca sua mão em meu ombro e eu a abraço.
-Obrigado a ajuda, Lust.-solto ela do abraço-E me desculpa por não estar do seu lado antes, eu só...
-Tudo bem, tive o apoio necessário. Fresh me ajudou muito...-ela dá um sorriso.
-Imagino.-olho para o cigarro no chão-Na próxima sai da escola pra fumar, e eu vou deixar essa passar.
Ela sorri meio envergonhada.
-Certo...
-Mas, esse hábito foi do nada ou...?-ela cruza os braços e olha para o lado-Tudo bem se não quiser conversar.
-Não, você me deu uma boa história, eu te devo o mesmo.-presto atenção nela-Só, vamos dizer que fui vítima de transfobia de um cara que eu gostava, ele tinha esse hábito, eu só queria entender a mente dele.
-Não tem que entender a mente desse tipo de gente.-digo e ela me encara. 
-Você é esse tipo de gente a partir do momento que não demonstra sua opinião.-ela diz de maneira fria.
Me arrepio e olho para o lado.
-Eu pelo menos não permaneci no mesmo erro, mas aposto que ele sim.-ela e eu ficamos nos encarando.
O sinal toca, e quando ela passa por mim a ouço dizer:
-Acho que entendi porquê nos afastamos.
Sinto meu coração apertar. Ela é uma boa pessoa, e me dói ver que machuquei alguém assim.

O Lado Complicado de Amar Seu inimigoOnde histórias criam vida. Descubra agora