36 - Coração de Aço

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  - Eu vou ter que abrir ela. - Ele falou, e foi Tae quem reagiu incrédulo.
  - Você o que?!! - Tae repercutiu assustado e Levi permaneceu inalterado, virando a Alicia de barriga para cima e olhou para Tae
  - Eu já fiz isso uma vez, o coração dela parou, a gente vai ter que fazer ele voltar, e não tem nada aqui que eu possa usar como desfibrilador, então vai ter que ser da maneira antiga e manual mesmo. Eu vou abrir e bombear o coração dela com minhas mãos, enquanto isso eu preciso que você faça respiração boca a boca, mantenha os pulmões dela se mexendo, eu vou cuidar da cabeça, vou invadir a mente dela e fazer ela querer viver, antes que o cérebro comece a herniar, vocês sabem de alguma coisa que ela mais goste do que tudo, que ela é praticamente obcecada? Que a faz querer lutar pela própria vida? - Levi Indagou como se fosse um maluco e enquanto esperava nossas respostas ele abriu a mochila que estava com ele. Que aliás em momento nenhum percebemos que estava ali e começou a despejar um vidro de álcool nos antebraços e nos pulsos, até escorrer pelas mãos. E então pegou uma faca, rasgando o que sobrou da camiseta esburacada da Alícia. Mais ansiedade me atravessou, se enraizando nos meus nervos como se fosse cimento. Eu não sabia mais em que fase de horror eu me encontrava. Sangue? O que era sangue? Eu estava ocupada demais com medo daquele psicopata abrindo o peito da minha melhor amiga bem na minha frente!
  - Mallya?! - Bradou Levi e eu engasguei as palavras que ficaram presas na garganta pra fora.
  - Você! - Saiu por instinto e então tentei reformular aquela frase que não tinha nem sentido nenhum com uma palavra só - Ela está obcecada por você, faria qualquer coisa por isso, e casos, ela é obcecada por investigar tudo e todos desde que nos conhecemos. Nada é capaz de fazê-la amar mais a vida do que um caso pra solucionar! - Falei entre lágrimas, e era verdade, nada no mundo a faria acordar daquilo, a não ser um bom caso. O que agora até eu estava começando a duvidar, ela estava ficando branca como um papel. Mais branca do que já é, e seus lábios tinham começado a arroxear. Eu nunca vi a Alicia entrar numa crise tão feia desse jeito. Era como se ela estivesse...
  - Levi quanto tempo pra sabermos se ela... - Nem consegui pronunciar, a mera menção da palavra "morta" pareceu ofensivo. E o pânico começou a se alastrar mais depressa pelo meu peito. Um raio cortou o céu como uma faca, do mesmo jeito que Levi passou a sua lâmina do meio do peito da Alícia para baixo, abrindo o peito dela já esburacado.
  - Enquanto o céu estiver bravo desse jeito sabemos que ela está viva! - Levi respondeu e enquanto Tae começava a fazer a respiração boca a boca, Levi enfiou as duas mãos dentro do peito da minha melhor amiga, como se fosse um açougueiro cortando carne e divido as correias dela.
  - É ela quem está fazendo isso? - Indaguei de olhos arregalados e Levi assentiu, com o meticuloso cuidado de começar a mexer dentro do corpo da menina em sua frente, mexendo em seu coração com os dedos, até alcançar as veias e o órgão com o punho fechado, e então ele começou a mexer, incentivando o coração a bombear. Quase como se fosse uma máquina.
  - Ela controla tudo ao nosso redor, está com três costelas quebradas, o coração parado e mesmo assim, se ela quiser que um desses raios caiam na nossa cabeça, eles caem! - Levi pronunciou e mais um raio irrompeu, fazendo tanto barulho que o chão todo tremeu. Fazendo as pedrinhas rolarem no solo e Levi balançar as mãos. Isso estava ficando perigoso. Perigoso demais!

  - Alicia on-

  Havia três deles, a postos sobre aquele imenso portão, e me fitavam como se eu fosse uma intrusa, uma verdadeira estranha, mas aquela era a minha casa, aquelas eras as minhas coisas, e aqueles eram os meus cachorros! Porquê não me deixavam entrar afinal? E porque tinha tanto barulho.
  Era como se estivesse chovendo, eu podia ouvir o som da chuva, as árvores chacoalhando, estava de noite, mas não havia tempestade, nem um pingo sequer de água naquele lugar. Apenas a casa no escuro e o vazio. Eu queria saber onde estava a Mallya.
  Me virei de costas e de repente não estava mais diante dos portões, estava com a minha mãe na mesa da cozinha, me arrumando para ir pra escola, e minha mãe com aquela sua natureza protetora colocou um prato fundo diante de mim na mesa, eu já estava sentada, com o uniforme escolar passado e vestido no corpo, no prato havia um bom cereal matinal, que eu já havia acostumado com o gosto por aquelas manhãs.
  - Alícia me deixa entrar. - Minha mãe pediu e eu olhei pra ela confusa, tentando entender, já estávamos dentro da cozinha, a onde ela queria entrar? Só então que fui perceber que não estava em casa, nem em lugar nenhum, estava no meio do nada, abandonada diante de uma mesa e uma única cadeira, com uma mulher ao meu lado me falando de comer cereais, porém aquela, por mais parecida que fosse, jamais seria minha mãe, aquilo era a como se fosse a mãe da Coraline, era o corpo da minha mãe e a face dela, o carinho maternal e aquele preciso toque delicado, mas os olhos... Aqueles olhos demoníacos completamente negros e sem pupilas eram de outra pessoa.
  - Alícia, você precisa me deixar entrar! - Insistia ela e eu me debrucei sobre o prato, tentando evitar seus olhos, e o que era cereal com frutas se converteu para um prato cheio de vermes, com bigatos e baratas escapulindo pelas beiradas.
  Dei um grito e me levantei depressa, a cadeira caiu para trás e a mulher agarrou meu braço com força.
  - Alicia você vai morrer! Me deixa entrar antes que seja tarde!
  Agora a voz não era mais de uma mulher, era de um homem, e parecia até que eu conhecia aquela voz, em algum lugar da minha cabeça eu conhecia aquela voz, mas o medo falou mais alto e eu me desvencilhei da criatura e comecei a correr, assustada, a mochila do colégio nas costas. Estava pesada, eu até podia imaginar porquê. Na terceira série eu carregava tantos livros, e se eu não me engano, havia um pequeno ursinho de pelúcia no meu bolso da frente.
  Quando percebi que havia despistado a coisa e estava longe o bastante de tudo pesquei o urso de lá de dentro da mochila, e fechei o zíper, quando estava pronta para empoleirar a mochila nos ombros novamente, vi uma silhueta de uma estrutura esquelética se aproximando, ele todo encapuzado me deu a mão e começou a me puxar por um caminho de onde estavam vindo latidos. Nem perguntou para onde eu ia, apenas agarrou meus dedos em sua mão gelada e começou a me levar por aí. Jo meio daquela escuridão. E foi quando tudo se dissolveu.
  Era a minha casa outra vez, eu estava na minha casa outra vez, e tudo sumiu, a estrada, o caminho, e meus pés aterrissaram num chão de mármore branco, onde haviam manchas e mais manchas. Tudo aquilo era sangue.
  Tinha sangue no chão da minha casa.
  - Você sabe o que aconteceu Alicia? - A criatura esquelética me perguntou, os dedos ossudos tamborilando na minha cabeça como se eu fosse uma boa menina. Neguei maneando a cabeça levemente e ele sorriu pra mim, um sorriso amarelo e meio torto. O latido nos fundos pareceu aumentar. Como se tivessem feras atrás da casa e não apenas aqueles cachorros.
  - Você matou todo mundo, veja o que você fez! - E então ele apontou para a fonte do sangue, onde havia uma mulher de olhos esbugalhados, o corpo caído no chão da cozinha estava vazio de sangue e sem vida, e tinha uma calma assustadora em seu semblante. Diferente dos outros corpos, o de meu irmão que estava na sala de estar, estava esquartejado e ainda estava vivo, implorando e agonizando em mais líquido vermelho. Assim também como meu pai, no quarto, todas as portas estavam abertas naquele lugar e em cima da cama havia o homem que era para cuidar da cidade, aquele temível delegado que sempre foi meu super herói preferido, agora morto e sem cabeça, com o terror selado em seus olhos abertos enquanto bigatos saiam de suas têmporas e suas narinas.
  Tentei gritar, e a voz morreu dentro da garganta, levei as duas mãos no pescoço, aterrorizada, não saia nada, queria gritar pela mamãe, com tanto medo, mas tanto e não saia nada da garganta.
  - Não precisa ficar com medo pequena, - A criatura afagou meu rosto com as mãos ossudas - Ninguém vai te machucar, o monstro embaixo da cama sempre foi você!

  - Não precisa ficar com medo pequena, - A criatura afagou meu rosto com as mãos ossudas - Ninguém vai te machucar, o monstro embaixo da cama sempre foi você!

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