Uma fome sem fim

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10 de janeiro

O ano anterior havia chegado ao fim e um novo ciclo se iniciava. O grande tour do Freakshow finalmente concluía sua jornada, depois de passar por Paris, Madrid, Roma, Bélgica, Londres e terminar no Brasil. Vários países, inúmeras histórias, shows inesquecíveis e incontáveis mortes. Fora uma virada épica, memorável em todos os sentidos, tanto para os integrantes quanto para o público.

O trem do horror já estava no caminho de volta para casa, e todos, exaustos, já sentiam falta da bela recepção do Vilarejo, com todas as novidades que tinham para compartilhar.

No vagão da francesa, ela penteava os cabelos loiros após um bom banho. O relacionamento clandestino entre ela e o mágico continuava sendo um segredo bem guardado. Ela mal conseguia acreditar que ninguém suspeitava dos dois, ou talvez fingissem não saber. Ainda assim, ela estava feliz. Vivera momentos incríveis nessa viagem, junto aos participantes e, principalmente, ao líder. Sentia-se em casa e parte daquela família. Uma família de loucos, assassinos e aberrações.

Estava mais próxima de Jason do que nunca, mesmo que precisasse esconder. Apesar de seus momentos de distância, a confiança que ele demonstrara ao levá-la para visitar sua mãe era imensa, e ela era grata por isso.

Conversara quase todos os dias da viagem com Roseline. Parker estava mais distante, mas ainda assim sempre conseguia arrancar-lhe um sorriso com suas brincadeiras. Mesmo com farpas, tivera conversas com Meredith e Ryan, que, para seu gosto, estavam próximos demais um do outro. No fundo isso a preocupava muito por Anastásia. Até mesmo trocara palavras com Zachary, que sempre gostava de testar suas habilidades com facas e adagas. Ele era um homem grande e perigoso, mas tinha a alma de um menino, desejando compartilhar suas paixões com os outros. Seus encontros com Madame Truska foram mais informais, evitando aprofundar mais sobre o mistério do circo e focando-se em conversas de mulheres. E os palhaços, ela os abraçava, cantava e brincava com eles.

Tinha sido uma viagem incrível. Mas ela não podia esconder o medo de estarem voltando ao Vilarejo, questionando-se sobre ela e Jason, se tudo seria diferente ou se continuariam do mesmo modo.

Melanie afastou os pensamentos ao ouvir toques na porta do vagão. Levantou-se e a abriu, deparando-se com um dos Espadas.

— Posso te ajudar? — perguntou, embora já soubesse do que se tratava. Era algo que acontecia praticamente todas as noites da viagem.

— Poderia vir comigo, senhorita? — a voz dele saiu robótica.

— Claro! — ela pegou um casaco rapidamente e saiu do vagão.

Seguindo o Espada, ultrapassaram todos os vagões em silêncio. Ao chegarem, ele fez uma reverência rápida e desapareceu em segundos. Melanie franziu a testa e abriu a porta.

— Boa noite, ma chérie. — Jason sorriu, sentado no pequeno sofá, claramente aguardando por ela.

Ela entrou, com um sorriso tímido. Não podia negar que o momento em que ele a chamava todas as noites para conversarem ou trocarem carícias quentes em seu quarto era a melhor parte do seus dias. Por mais que se vissem durante as atividades ao longo do dia, nada era tão íntimo quanto aqueles momentos. Uma intimidade que ela nunca teve com mais ninguém em toda sua vida.

Nos últimos dias, ele a ensinara a jogar um peculiar jogo. O mesmo que ela o vira jogando com o Homem Sorridente uma vez. Até mesmo tinham recebido a companhia sombria da própria criatura para jogar com eles, o que surpreendentemente aos poucos não a assustava mais.

Era um jogo de apostas, e as apostas geralmente envolviam o tempo de vida que os perdedores seguiriam o líder. Caso o líder perdesse, ele considerava diminuir o tempo para o vencedor. O problema era que, eventualmente, o mágico sempre vencia. Afinal, ele era um mágico. Então, era evidente que Melanie, além de seus cem espetáculos, teria mais alguns para pagar. Todavia, isso não a fazia querer parar de jogar, pois acreditava que um dia poderia ganhar.

O circo do horrorOnde histórias criam vida. Descubra agora