The beginning

10.4K 626 137
                                    

A vida é uma merda, qualquer sobrevivente do X-18 acha isso, mas os imbecis otimistas dizem que devemos agradecer por estarmos vivos, uma completa anesteira ao meu ver. Se os contaminados não nos matarem vamos morrer de fome ou de velhice, e adeus raça humana. Uma completa merda.

Envolvo minhas pernas com os braços, deitando a cabeça sobre os joelhos, enquanto observo a selva de pedras. A antiga e movimentada New York City agora não passa de uma grande tumba em céu aberto. Os prédios abandonados estão destruídos e escuros, suas vidraçarias quebradas e aos poucos a natureza toma conta do percurso, envolvendo as construções com cipós e mato. A cidade que nunca dorme, enfim dormiu e jamais vai acordar novamente.

A área segura é como chamamos o lugar onde estou, é a única base de pessoas não infectadas em todo o Estado, circulada por três muros e uma cerca, nós temos uma população de oitocentas mil pessoas, antes da pandemia o Estado de Nova Iorque contava com mais de oito milhões de habitantes, mas ou a maioria foi infectada, morreu nas bombas ou de fome.

Estamos a quase três anos nessa merda, vendo aos poucos as pessoas definharem. Tudo começou com um pequeno incidente na rota 66 a caminho de Los Angeles, uma frota de caminhões do exército a caminho de uma base militar bateu contra um veículo na estrada e acabou tombando, era apenas um acidente normal, até o que estava dentro do contêiner de transporte ser liberado.

Ninguém sabe se era um homem ou uma mulher, uma criança ou idoso, tudo que sabemos é que está coisa dizimou mais de sessenta militares treinados e armados até os dentes, criando os primeiros contaminados. Estes mortos vivos se espalharam e começaram a atacar em restaurantes e postos de estrada não deixando nenhum sobrevivente, e assim que chegaram até a cidade de Los Angeles eram um pequeno exército.

Ainda consigo me lembrar do desespero dos infectologistas de todo o mundo, e a tentativa do governo americano de explicar como surgiu algo assim. Tudo foi muito rápido, em duas semanas a população contaminada passava de um milhão, e estava em toda parte. Aeroportos, estações de metrô, estádios, lojas, estradas, e com a globalização mundial não demorou para que um dos infectados chegasse até a Europa, África, Ásia e os demais continentes.

Foi caótico, todos os países começaram a ruir, as pressas tentavam construir bases militares para nos protegermos. Civis começaram a morrer nos confrontos com as bombas que o governo jogava, as comunicações ficaram fracas e a escassez de recursos começou.

Quando se assiste Invasão Zumbi, The Walking Dead, Extermínio ou Guerra Mundial Z, você espera monstros filhos da puta e tiros na cabeça, mas isso que existe é bem diferente. Eles não andam lentamente, são cheios de machucados e burros. Não mesmo. As coisas se regeneram, pode atirar e cortar a pele, mas ela vai se curar, e vai parecer que nunca esteve machucado, essa foi a justificativa dos EUA, disseram que queriam estudar essa forma de regeneração para curar as pessoas. Mentirosos do caralho. Tudo que conseguiram foram criar a porra de monstros que consegue se matar estourando o cérebro.

Com uma pedra, tiro, faca, qualquer coisa mas você precisa detonar o cérebro, ou eles não param. Eles também não andam tortos, são rápidos e praticamente iguais aos humanos. As formas de diferenciar são a pele com um tom bem mais pálido que a nossa, a esclera totalmente preta, com leves cicatrizes embaixo de seus olhos, como veias ressaltadas e íris em um tom de azul brilhante, as roupas rasgadas e sujas e a boca sempre manchada de sangue.

Gostaria que fossem apenas pedaços de merda ambulantes que anseiam por carne humana, mas quando se vê um deles frente a frente, quando se vê aquele rosto tão parecido com o nosso, aqueles movimentos tão familiares, fica difícil esquecer que eles um dia foram como nós, que aquele é um pai, mãe, filho, esposa, marido. Preferiria que fossem apenas monstros, que eu pudesse esquecer aqueles rostos em que atirei, mas não posso, isso vai me seguir até o túmulo, o sangue em minhas mãos, que um dia pertenceu a um inocente.

Além de serem mais humanos que as obras cinematográficas mostram, eles são ágeis, fortes e espertos, conseguem abrir portas e subir em escadas por exemplo, e também os desgraçados são divididos em classes entre eles. Bem maluco para simples mortos. Pelo que estudamos existem três tipos, os separamos em ômega, beta e alfa como numa alcateia de lobos.

Os ômegas são os mais comuns, menos resistentes porém os mais rápidos e em maior quantidade, com cerca de dois tiros você acaba com um, e eles em maioria caçam em grupos de doze. os betas são os segundos na cadeia, são mais espertos e resistentes, e costumam ter também uma força maior que a dos ômegas e humanos, eles conseguem abrir portas e destrancar elas se verem as chaves, e alguns pesquisadores afirmam que podem assimilar algumas informações, eles são mais difíceis de se ver, e quando andam em grupos estão entre quatro ou seis.

E temos os alfas. É raridade ver um e sobreviver para contar a história, os putos são rápidos e tem reflexos que se invejam, além de força elevada e capacidades cognitivas e intelectuais elevadas. Normalmente eles ficam em trios e precisa de um pente inteiro na cabeça para os aniquilar. Assim como uma cadeia, um ômega sempre obedece o beta e o beta sempre obedece o alfa, é estranho pensar que mortos tem tanta organização.

Ninguém sabe como começou, e o que os diferencia, porque alguns viram ômegas e outros betas, o nosso pessoal ainda quer descobrir isso, mas as vezes eu duvido que vamos ter todas as nossas respostas.

Um barulho na porta da cobertura do prédio atraí minha atenção, e saco a arma do colete apontando para a nova presença. Abaixo a pistola ao ver Jay escorado no batente, de braços cruzados para mim.

- Vai se atrasar para a merda da aula. - O mesmo diz, com sua voz reverberando pelo terraço.

- Vai se foder. - Murmuro bagunçando meu cabelo e olhando uma última vez para os prédios fora dos muros, o sol nascendo atrás das construções que um dia eram tão agitadas.

Saio do parapeito guardando a minha arma, e caminho até o mesmo, batendo em seu ombro em provocação antes de descer as escadas a caminho do centro da nossa 'cidade'.

ApocalypseOnde histórias criam vida. Descubra agora