O amor Vem Para Todos.

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Lá estava eu, cigarro entre os dedos, a cabeça vazia, deixava que a fumaça preenchesse meu cérebro e meus pulmões, era revigorante tanto quanto era nocivo.

Wallace vinha em minha direção, ele andava de mãos dadas com um outro garoto, era generosamente mais alto, cabeça raspada, ombros largos e sorriso tímido, os dentes ligeiramente separados, mas o olhar era marcante, e tive certeza que Wall havia se apaixonado por aquele olhar, havia ignorado tudo apenas pelo olhar dele. Era típico do Wallace gostar de pessoas tão diferentes.

Olhe para mim, eu era o melhor amigo dele.

Dei uma última tragada no meu cigarro, a fumaça desceu quebrando tudo que estava preso dentro de mim, joguei o que restou fora. E substitui a melancolia de sempre por um sorriso de boas vindas.

- Cara, quanto tempo ! Você sumiu ! - Ele dizia isso com certo ressentimento e seu abraço foi mais como um advertência, mas tudo bem, era culpa minha.

- Eu sei, as coisas estão meio corridas..

Ele não podia estar mais gay naquele momento, e eu conto isso com o maior respeito possível, ele explodia e exalava uma presença gay que me fazia me sentir sugado á uma órbita gay sem precedentes. E eu me dei conta daquilo assim que vi sua blusa rosa com uma carinha feliz, e sua calça mais apertada que o normal, e de repente suas mãos estavam nos ombros do garoto alto.

Senti saudade da fumaça do cigarro me sufocando quando me vi naquela situação.

Eu juro que senti.

- Não importa agora - Ele disse isso me olhando nos olhos e passando a mensagem "quero saber o que está acontecendo "- Quero que você conheça alguém especial.

O garoto sorriu, estendeu a mão.

Apertamos nossas mãos com uma certa dignidade, como se estivéssemos dizendo que ambos nos respeitávamos, eu gostei daquele aperto de mão.

- Prazer, eu sou o Lázaro.

Me surpreendi com seu nome, era bíblico, e ele não tinha vergonha nenhuma. Já eu me contorcia por dentro toda vez que tinha que dizer ' Noah' para as pessoas, já não bastava ser estrangeiro,a sua tradução ainda era Noé.

Éramos ambos figuras bíblicas ali, avulsas e deslocadas, paradas apertando nossas mãos, se Deus estivesse nos assistindo, ou Ele certamente riria, ou jogaria raios em nossas cabeças.

- Eu sou Noah.

- Eu sei, já ouvi muito sobre você.

Ri sem graça, como faço quando não sei exatamente o que fazer.

Wall interviu em nossa pseudo conversa.

- Então, alguém aqui vai me pagar um sorvete ?

E então, saímos.

Paramos em uma sorveteria não muito longe. Estava meio vazia, apenas com uma ou duas mesas ocupadas. Lembrei de Mila, sobre como foi bom conversar com ela aquela noite, me lembrei de como ela adorava sorvete de chocolate, e me lembrei de como Wallace havia acidentalmente quase estragado tudo, mas ao invés, tudo não poderia ter sido melhor orquestrado.

Decidi então, fazer como Wall, que mesmo quando estraga tudo, ainda deixa as coisas perfeitamente equilibradas.

As pessoas nos olhavam, e eu fingia que não ligava, deixei que se beijassem e que se abraçassem, deixei que se gostassem assim como gostavam.

E mesmo assim, não me senti nada como uma vela. Éramos três amigos em uma sorveteria, dois gays e um hétero.

E no final ainda ouvi de Wall um "Muito obrigado por não ter agido como estranho, você foi ótimo"

Um abraço apertado, aqueles de irmãos.

- Ainda vamos conversar. - Wall me prometeu com um sorriso enquanto saía de mãos dadas com Lázaro.

Acendi outro cigarro, suportando tudo de ruim que entrava dentro de mim, expulsando toda fumaça pelas minhas narinas.

Eu não tinha nada a dizer.

Então voltei pra casa.

E não pude ficar mais satisfeito com o que encontrei na porta.

Cartas de um SuicidaOnde histórias criam vida. Descubra agora