Tensão

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Não foi nada fácil pegar no sono naquela noite. Eiji sabia que o namorado estava acordado ao lado dele, mas não tentou puxar conversa em nenhum momento. E assim permaneceram até que o sono lhes arrebatasse do mundo dos despertos. Nenhum deles soube dizer quem dormiu primeiro.

No entanto, Eiji foi o primeiro a acordar. Já era quase meio dia quando abriu os olhos, e a primeira visão que teve cortou seu coração. No futon, observou Ash dormindo. Ele estava bastante encolhido e abraçava com firmeza uma pelúcia de lince. Suas pálpebras estavam inchadas, enquanto olheiras lhe tingiam o rosto. O fotógrafo sabia que os olhos do namorado estariam vermelhos ao acordar. Era bem claro que Ash havia chorado durante à noite.

Eiji suspirou. Pensando em retrospectiva, percebeu que foi duro demais na noite anterior. Mas no fundo ele entendia que não havia como ser diferente. Primeiro, foram seus sentimentos e desejos reprimidos, depois a indiferença do namorado diante disso, finalmente ele foi pego em flagrante, no que foi de longe a situação mais constrangedora da sua vida. E como se tudo não pudesse ser pior, Ash lhe contou mentiras.

Eiji havia chegado num ponto crítico na noite anterior, de modo que deixou emergir todas as suas frustrações de uma vez só. Ainda assim, ao ver o namorado daquela maneira frágil, ele queria dar o braço a torcer. Queria se esgueirar naquelas cobertas e substituir a pelúcia que sustentava a dura tarefa de confortar alguém que, apesar de ter vivido pouco, passou por muito.

Mas o fotógrafo teve que se conter. Se mimasse o namorado toda vez que estivesse errado, ele jamais entenderia o peso das suas ações. Numa sucessão de suspiros, levou a mão no topo da cabeça do americano e, acariciando-o, tentou acordá-lo. Eiji entendia que não precisava ser especialmente amoroso, mas também não precisava agir frio.

— Vamos comer? — disse, assim que o americano abriu os olhos.

Ash piscou algumas vezes, tentando se acostumar à luz. Depois de choramingar por horas na noite anterior, a luz do Sol que entrava pela janela lhe incomodava a vista. Ele tocou as mãos que repousaram no seu cabelo, mas como que se lembrando da noite anterior, retraiu os dedos imediatamente. Ele não sorriu para Eiji, apenas acenou com a cabeça, concordando silenciosamente.

Eiji, ao contrário, sorriu para ele, tentando amenizar o clima tenso.

O fotógrafo desceu primeiro. Depois de usar o banheiro, Ash seguiu o namorado para o desjejum.

[...]

Geralmente, as festividades de final de ano levam as pessoas a dormirem mais tarde, de modo que acordar tarde era uma consequência disso. Mas na casa dos Okumura, Kaname e Takeshi eram do tipo que não faziam essa exceção, por isso a comida foi posta no mesmo horário de sempre.

— Dormiu bem filho? — perguntou Takeshi, levando salada verde à boca. Ele se interrompeu quando deu uma melhor olhada em Eiji.

Então, o silêncio pairou no ar.

Não demorou muito para Ash juntar-se à mesa, tornando o silêncio ainda mais duradouro.

O motivo da atmosfera tensa estava gravado no corpo dos rapazes. O fotógrafo ainda não havia percebido, mas seu pescoço estava visivelmente marcado de vermelho e roxo. Já Ash, embora estivesse de cabeça abaixada, vagando nos próprios pensamentos, não escondia seus lábios tingidos de gloss. Ele mesmo não havia se dado conta disso. Sem qualquer uma dessas evidências, talvez eles ainda tivessem sido notados, porque o lábio de ambos estavam inchados e vermelhos. Diante de tais evidências, o rosto choroso de Ash não recebeu tanta atenção.

Depois de alguns instantes estranhando o silêncio, o americano levantou a cabeça. Com esforço, direcionou seu olhar ao namorado, que, nesse momento, encarava-o com os olhos injetados. Entretanto, a surpresa ainda foi maior pela parte de Ash, tão logo ele reparou nos chupões no pescoço esguio de Eiji.

One more time, One more changeOnde histórias criam vida. Descubra agora