14 | Abandonado, mas não sozinho

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Harry olha para a lona – entorpecido.

Ele pode ouvir a chuva batendo na tenda, pode ouvir vagamente a voz de Hermione chamando, chorando, procurando por alguém que já foi embora.

Ele não consegue ouvir o som dos seus próprios pensamentos, e isso é bom, porque ele não quer.

Lentamente, ou talvez tão rapidamente que só se passou um minuto desde que Ron saiu, Harry percebe que está com frio.

Harry se vira, pensando que vai tentar dormir, ou pegar um cobertor e enfeitiçá-lo para ficar seco durante seu turno, querendo fazer qualquer coisa além de nada - porque não fazer nada o fará sentir o ácido das palavras de Rony, corroendo seu corpo.

Mas, ao se mover, ele vê a única outra pessoa que está na tenda com ele, o que é estranho, porque Harry poderia jurar que estava sozinho, mas vê-lo, ver aquela expressão rasgada de hesitação e piedade naqueles olhos cinzentos e cautelosos, faz com que tudo desmorone em uma onda de Malfoy Malfoy Malfoy.

Se Ron estivesse certo, Draco Malfoy é tudo com que Harry se importa? Harry quer dizer não, que Malfoy é apenas uma pequena peça em um quebra-cabeça muito grande e fragmentado, mas uma parte dele teme que ele esteja mentindo, que embora a coisa mais importante agora seja uma guerra, de alguma forma Malfoy se tornou importante também.

Harry respira fundo, o olhar traçando o modo como Malfoy o observa cansado, sua mandíbula é uma estrutura rígida de ângulos, e a tensão ao redor de seus olhos está tão tensa que Harry quer suavizar as rugas.

— Então?

Harry estremece de surpresa e não tem certeza se foi ele quem falou ou Malfoy.

— Então o que?

— Você não vai me mandar embora? — A pergunta de Malfoy é tão baixa que Harry quase não percebe, e ele franze a testa de volta.

— Não. — Ele quer acrescentar: 'por que eu faria isso?' Mas ele não pode, sua voz está muito grossa agora, e ele tem a sensação de que sabe o que Malfoy dirá, de qualquer maneira.

Há um lampejo de algo esporádico, talvez de alívio, no rosto de Malfoy, e ele leva vários segundos para mascarar isso antes que Harry perceba.

Naquele momento, Hermione irrompe de volta para dentro da tenda, com o cabelo grudado no rosto e pingando jatos de água em sua jaqueta. Seu lábio inferior está mastigado de preocupação e seus olhos estão vermelhos, e ela mal consegue conter a tristeza enquanto gagueja: — Ele se foi. Desaparatou.

Ela fica ali, encharcada, como se tentasse entender sua situação. Mas Hermione Granger está perdida, sua lógica escapou e o garoto por quem Harry sabe que ela está apaixonada a abandonou. Ele quer abraçá-la, dizer que está tudo bem, que Ron vai voltar, mas não consegue. Porque se ele fizer isso, estará reconhecendo o buraco ardente cheio de culpa e traição que se forma na boca do estômago. Se ele fizer isso, Hermione poderá desmoronar e nada impedirá Harry de segui-la.

Hermione vai para a cozinha, suas ações bruscas e trêmulas enquanto ela mecanicamente prepara um bule de chá, com lágrimas brilhando em seu rosto. Dói para Harry observá-la, então, sem dizer uma palavra, ele se aproxima dela, gentilmente a afasta e prepara o chá para ela.

Ele sabe que Malfoy o está observando, mas não consegue se importar.

.

Mais tarde naquela noite, quando Harry está enrolado em sua beliche, se perguntando se é isso que ele merece por arrastar seus amigos para isso, quando a voz calma de Malfoy vem de baixo.

— A culpa não é sua.

Os olhos de Harry se abrem na escuridão, embora ele não consiga ver nada, não porque esteja surpreso com o que Malfoy disse, mas por causa do que ele não disse. Permanecendo na escuridão entre os colchões, o resto da frase de Malfoy paira como uma respiração estagnada e silenciosa; é minha.

Temptation on the Warfront | DrarryOnde histórias criam vida. Descubra agora